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Slow Food se espalha por cidades brasileiras

OESP, Metrópole, p. C9
22 de Mar de 2009

Slow Food se espalha por cidades brasileiras
Princípios do movimento italiano já são cultivados em 19 'conviviuns'

Talita Figueiredo, Rio

Comer com prazer, defender tradições e a agricultura regional, proteger a biodiversidade. São alguns princípios de um movimento que surgiu na Itália, na década de 80, e ganha cada vez mais adeptos no Brasil: o Slow Food. Por todo o País já são 19 centros Convivium - onde se praticam seus preceitos. Três deles ficam em São Paulo - um na capital e os outros dois em Campinas e Piracicaba. No mundo todo são mais de mil.

O ponto alto da filosofia Slow Food é incutir o prazer de comer bem a todos. Mas, para isso, se faz necessário defender a cultura dos alimentos. Os conviviuns do Brasil promovem eventos ligados à gastronomia, visitas a pequenos produtores de alimentos orgânicos e regionais e degustações de alimentos em risco de extinção. Esses produtos constam de um catálogo mundial chamada A Arca do Gosto. São 750 alimentos ameaçados no mundo todo, incluindo alguns brasileiros: arroz vermelho, babaçu, bergamota montenegrina, farinha de batata-doce Krahô, marmelada de Santa Luzia, pirarucu, umbu, palmito juçara, guaraná nativo sateré-mawé, feijão canapu e castanha de baru. Nove deles fazem parte das Fortalezas, projetos feitos desde 2004 com grupos de pequenos produtores, em parceria com o Ministério do Desenvolvimento Agrário, para protegê-los.

Em alguns encontros, integrantes do Slow Food criam um menu especial a partir desses alimentos. "É uma dificuldade terrível, porque são produtos de diferentes partes do País, perecíveis e caros para transportar. Nos últimos dois anos, no entanto, conseguimos fazer a Semana Slow, onde não apenas preparamos um menu mas colocamos os produtos à venda", diz Margarida Nogueira, que faz parte da comissão da Arca e inaugurou em novembro de 2000 no Rio o primeiro Convivium brasileiro. Em 1999, três anos após descobrir o movimento na internet, ela fez uma viagem para a Itália e almoçou por acaso numa cantina ao lado de Carlo Petrini, que fundara o Slow Food em 1986.

Além do prazer de comer bem, devagar, em companhia de amigos ou parentes, saboreando alimentos e escolhendo com cuidado o que leva à boca - em oposição absoluta ao conceito do fast-food -, o grupo batalha ao redor do mundo para proteger produtos quase esquecidos. "Num dos livros, Petrini conta que gostava muito de uma salada de pimentões que comia no Piemonte quando garoto. Numa viagem por lá, pediu num restaurante. O gosto não era o mesmo. Ele descobriu que os pimentões vinham da Holanda e não eram mais produzidos ali. Ficou horrorizado."

A chef Teresa Corção usa a filosofia slow profissionalmente desde que conheceu o movimento e se tornou especialista em mandioca. Em 2002, ela participou de um festival gastronômico em Pernambuco no qual 80% da lista de produtos locais que deveriam ser usados era subproduto da mandioca. Começou a estudar o tubérculo e fundou a ONG Maniva - nome do caule da mandioca - que ensina crianças em escolas públicas a fazer tapioca.

A ONG já produziu um curta-metragem - Professor da Farinha -, em que conta como são feitas farinhas d'água e de mandioca, e um longa - Seu Bené Vai para a Itália -, que mostra a participação de um produtor de farinha de Bragança, no Pará, num evento do Slow Food na Itália e foi apresentado no Festival de Berlim do ano passado. "Slow é uma proposta de vida e eu uso muito isso no restaurante. Além da mandioca, temos outros produtos regionais do Rio, privilegiamos orgânicos, produtores regionais e os valores usados na produção. Não é um instrumento de marketing, porque o sustentável está na moda. Procuramos fazer com que a filosofia contamine nossa vida", diz Teresa.

''Vai na contramão da globalização'', diz apreciador

Talita Figueiredo

Apreciadores da boa gastronomia são os mais atraídos pelo Slow Food. "Acredito que há uma ligação direta entre o que você come e sua qualidade de vida. Isso de comer sentado, com calma, em jantares harmonizados, de conversar com os chefs e saber como escolheram aqueles ingredientes faz parte de um movimento social. O Slow é um caminho para exercer isso", diz o consultor de investimentos Ronaldo Lisboa, de 56 anos.

No caso do empresário Arnaldo Adnet, de 46, tomar consciência sobre o que põe no prato o fez adotar novos hábitos. "Minha visão de comércio limpo e justo me fez virar vegetariano. Vou à feira de orgânicos todo sábado, converso com produtores, pergunto quando teremos o inhame de novo e se teremos uma boa safra de figo. Com isso, passei a cozinhar também."

Seu encantamento com o movimento foi tão grande que abriu a Adnet Slow Travel, uma agência de viagens que pega carona no objetivo Slow para fazer o "antipacote". "Minha maneira de viver mudou e passei a usar a concepção do movimento também no meu trabalho. Até para os brindes de fim de ano de minha empresa pensei nele e comprei produtos orgânicos, como geleias e goiabadas de um sítio do interior do Estado", conta ele, que faz parte do movimento há quatro anos e gosta de levar sobrinhos pequenos à feira para que eles valorizem alimentos regionais. "O Slow Food vai na contramão da globalização, que esmaga o regional e pasteuriza tudo."

Em Minas, Slow Beer também ganha adeptos

Talita Figueiredo

No Convivium de Tiradentes (MG), começa a tomar forma o Slow Beer, movimento surgido na Alemanha para prestigiar e proteger cervejarias de pequeno porte. "Queremos fazer ações como as da Alemanha, principalmente de proteção comercial, tentando uma blindagem para que as pequenas cervejarias continuem tendo seu mercado e travando ações de comércio justo", conta Marco Falcone, vice-presidente do Instituto de Convivialidade e Cultura Alimentar, braço do Slow Food no Brasil, e dono da Falke, microcervejaria mineira.

OESP, 22/03/2009, Metrópole, p. C9

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