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Sinuca ambiental

FSP, Editoriais, p. A2
22 de Set de 2019

Sinuca ambiental
Atos minam credibilidade de eventual mostra de sensatez de Bolsonaro na ONU

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) e o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles (Novo), precisam atentar para o que se passou na sexta-feira (20). Centenas de milhares, talvez milhões de pessoas foram às ruas no mundo todo para protestar contra a crise do clima.

O movimento inspirado pela adolescente sueca Greta Thunberg se espalhou. Estudantes faltam às aulas às sextas para demandar que adultos, em especial governantes e empresários, ouçam cientistas sobre impactos do aquecimento global que serão sofridos por eles, jovens, não tanto pelos mais velhos.

O governo brasileiro flerta com teses pueris de céticos do clima e de militares que enxergam aí uma conspiração globalista contra a soberania nacional. Aumenta seu descrédito ao negar o óbvio -seja que a atmosfera se aquece com a queima de combustíveis fósseis e florestas, seja que a destruição da Amazônia recrudesceu.

Não haveria grande prejuízo se a querela ficasse restrita às guerras culturais e ideológicas. Mas, não, essa miopia ambiental tem consequências concretas: físicas, para o clima do planeta, além de econômicas e diplomáticas, para o país em isolamento crescente.

Neste fim de semana, a ONU realiza em Nova York reunião de alto nível sobre a questão climática. Salles está na cidade, mas não para reeditar nesse foro o papel de liderança que o Brasil sempre teve, pois a administração que integra foi excluída do rol de discursos por não apresentar propostas para expandir as metas do Acordo de Paris.

O ministro tenta alinhavar nos EUA, por um lado, nebuloso esquema financeiro para fomentar a exploração privada de nossa floresta equatorial. De outro, em seu país, desvirtua e ameaça de morte um recurso que já existe há uma década -o bilionário Fundo Amazônia liderado pela Noruega.

Bolsonaro deve cumprir na terça-feira (24) a praxe de presidentes brasileiros abrirem os discursos de chefes de Estado na Assembleia Geral das Nações Unidas. Desta vez, haverá interesse atípico no pronunciamento -mas nem de longe no bom sentido.

Pouco se sabe sobre que tom adotará o presidente no evento. "Ninguém vai brigar com ninguém lá", foi o máximo que adiantou. Apesar da previsão, ele retomou o argumento segundo o qual estrangeiros fazem da questão ambiental um pretexto para desgastar a imagem do Brasil e obter vantagens no comércio agrícola.

Mesmo que deixe de lado as paranoias e conspirações, Bolsonaro tem escassas chances de reverter o desgaste de sua imagem em boa parte do mundo. Suas declarações e atos pregressos minam a credibilidade de uma eventual demonstração de sensatez.

editoriais@grupofolha.com.br

FSP, 22/09/2019, Editoriais, p. A2

https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2019/09/sinuca-ambiental.shtml

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