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Sem representatividade no Congresso, eleições têm 85 candidatos indígenas

Último Segundo/ IG - http://ultimosegundo.ig.com.br
Autor: Carolina Garcia
30 de Ago de 2014

A política indigenista ganha novo fôlego nas eleições 2014. Com 85 candidatos a cargos públicos, de acordo com as estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), indígenas buscam retomar o legado de líderes do passado, fortalecer a própria cultura e mostrar o caminho das aldeias para as políticas públicas. Para sociólogos e antropólogos, o índio busca representação nas esferas federal e estadual para falar a vontade do próprio povo, sem intermediários. Atualmente, não existe candidato de origem indígena no Congresso, em Brasília.

O Censo Demográfico realizado pelo IBGE em 2010 mostrou que a comunidade indígena do Brasil é formada por 817.963 pessoas de 305 diferentes etnias, que estão presentes em todos os Estados. No dia 5 de outubro, índios disputarão cargos de vice-governador (1), senador (3), deputado federal (25), deputado estadual (52), deputado distrital (2), senador 1o suplente (1) e senador 2o suplente (1).

Pela primeira vez, o TSE realizou o mapeamento dos candidatos usando o critério "cargo/cor ou raça". Entre as cinco raças citadas no estudo, a indígena ficou em último lugar, com a menor porcentagem de representantes (0,33%). Atrás de outras minorias como negros (9,27%), com 2.420 políticos, e amarelos (0,46%), com 116.

Embora a justiça eleitoral não tenha um balanço para oficializar o grau de participação indígena em outras eleições, o antropólogo Carlos Alberto dos Santos, o Kaká Wera, de 50 anos, candidato do PV ao Senado, diz que o engajamento dos indígenas aumentou e merece atenção da sociedade não-índia.

"Nos últimos 20 anos, a combatividade das lideranças indígenas e capacidade de articulação nas relações interétnicas com a sociedade melhorou muito. Tanto que no início dos anos 90 não tínhamos organizações indígenas. Hoje somos mais de cem pelo Brasil", explicou.

A atuação de figuras como o líder xavante Mario Juruna, primeiro deputado federal indígena do Brasil, eleito em 1983, e que virou tema de filme, e João Neves Silva, que foi o primeiro prefeito indígena brasileiro, eleito na cidade de Oiapoque, no Amapá, impulsionou o engajamento dentro de aldeias pelo País. Inclusive a questão indígena foi tema de uma pergunta para a candidata Dilma Rousseff (PT) durante o debate de presidenciáveis, na última terça-feira (26).

Lutar contra o atraso político

Se de um lado aumentou a atuação política, o respeito aos direitos humanos dos índios seguiu na direção oposta. "Os direitos conquistados na própria Constituinte de 1989, como o uso da terra e de viver de acordo com as suas tradições culturais, têm sido uma pedra enorme no nosso caminho", disse o antropólogo Wera, ressaltando o atraso de 25 anos na demarcação de terras indígenas pelo País. "Menos de 10% do que já estava em estudo avançado foi homologado."

O atraso político do Brasil em relação às novas demarcações preocupa o candidato. "Com o passar dos anos os setores ruralistas e conservadores podem ser favorecidos porque tentam mudar as leis e tirar do Executivo o poder de demarcar as terras. Podem ocorrer novas invasões e conflitos", diz. Ele acredita que o atual cenário político é um retrocesso na lei que deveria preservar os direitos indígenas.

Adotado por uma aldeia guarani em São Paulo após a morte dos pais, ele recebeu o nome guarani Wera Jecupé (que significa raio sobre o chão). E conquistou a função de interlocutor dos guaranis quando a aldeia, em Parelheiros, na zona sul da capital, disputava a posse das terras. Em 1994, o candidato criou o Instituto Arapoty, que divulga o conhecimento das culturas indígenas e oferece apoio para as aldeias nas regiões Sudeste e Nordeste. Em São Paulo, por exemplo, quase 40 mil índios se distribuem em 29 terras, sendo apenas 12 demarcadas.

Para o representante do PV, é o momento da sociedade aproximar-se dos índios e conhecê-los. "Entre mais de 300 etnias, temos quase 40 que preferem o isolamento. Mas não é essa mais a realidade da maioria dos povos. Lutamos porque sabemos que [as áreas homologadas] não são nossas, mas uma floresta em pé garante a vida das futuras gerações, indígenas ou não", defendeu.

"Não queremos viver nas cidades"

A artesã Silvana Terena (PPS), de 39 anos, é candidata a deputada federal por Mato Grosso do Sul, Estado que abriga mais de 70 mil indígenas em 26 municípios. Criada na aldeia de Anastácio, cidade localizada a 141 km da capital Campo Grande, Silvana viu os pais abandonarem a vida rural para que ela e os irmãos pudessem ir à escola. Ela discorda de Wera sobre a preferência do índio ao não isolamento.

"As políticas públicas não chegam às aldeias. Se os políticos tivessem plano de governo para a comunidade indígena, jamais teríamos saído das aldeias para a capital. Não queremos viver em cidades", desabafa a candidata, que mora na primeira aldeia urbana, Marçal de Souza, na capital do Estado.

Silvana defende ainda que os indígenas devem receber o mesmo tratamento que o atual governo dá para outras etnias, como a cota racial para negros, que facilita o acesso às universidades.

O que para muitos poderia sentenciar a campanha de Silvana, para ela é indicação do futuro. Seu partido, o PPS, oficializou apoio a Reinaldo Azambuja, candidado do PSDB ao governo do Estado e ruralista, terceiro nas pesquisas de intenções de voto. A coaligação com o "maior inimigo", considerando o embate entre indígenas e ruralistas pelo poder das terras, poderia representar futuros diálogos em busca pela paz. "Sou constantemente questionada por isso. A política é assim e precisamos negociar."

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