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Sem medo do lucro

CB, Economia, p. 8
12 de Mar de 2007

Sem medo do lucro
Produtores do DF apostam na soja transgênica para reduzir custos e garantir ganhos. Pesquisas de feijão e alface geneticamente modificados estão em fase final e as sobre mamão, banana e batata bastante avançadas

Luciano Pires

O produtor Rodrigo Barzotto Werlang, dono de uma fazenda na região do PAD-DF (a caminho de Unaí-MG), olha para a plantação de soja - ainda verde - com a calculadora na mão e algumas preocupações a menos na cabeça. Este ano, além do clima favorável, a colheita tende a aliviar um pouco o bolso porque, ao contrário de outras épocas, a área plantada está quase que totalmente livre das ervas daninhas. A razão é simples. O uso de sementes transgênicas reduziu drasticamente a aplicação de herbicida, o que ajudará a engordar os lucros.

Símbolo de uma nova geração de agricultores, Werlang aposta na soja geneticamente modificada para chegar ao fim da safra um pouco mais capitalizado e menos dependente dos caros financiamentos bancários. "A transgenia não é o futuro. É o presente. A agricultura a enxerga como uma ferramenta a mais, que veio para auxiliar a produção", explica o empresário, que tem 300 hectares de soja transgênica em um total de 600 hectares em terras não contíguas. "As sementes convencionais continuarão a existir, mas a tendência é o produtor trabalhar com os dois tipos", resume. Essa é a segunda vez que o agricultor lança mão da tecnologia. E ele não se arrepende da opção que fez.

Na região onde está situada a propriedade de Rodrigo Werlang, pelos cálculos de técnicos da Emater-DF, houve um aumento de 100% na extensão plantada de soja modificada em laboratório. O avanço no DF é um dos mais expressivos - em termos proporcionais - no Brasil. Apesar das restrições físicas, a agricultura local está entre as mais avançadas. "Tem muita gente plantando. Onde não tem mato (planta daninha), pode ter certeza que é transgênico", completa o sojeiro, que também é engenheiro agrônomo.

Segundo ele, a desconfiança que pairava sobre a transgenia diminuiu bastante nos últimos anos - especialmente porque o país definiu em lei o que é permitido -, abrindo espaço para a expansão das lavouras tecnológicas. "Ainda falam muita mentira sobre transgênico, mas é pura desinformação. Às vezes, um produto convencional sofreu uma aplicação de defensivos muito maior do que um transgênico e nem por isso as pessoas deixam de comer. Não dizem que causa câncer nem nada", completa.

Pesquisas

O forte no Distrito Federal não está nos grãos, mas nos orgânicos e nos hortifrutigranjeiros. A região, no entanto, tem sido palco de todo tipo de experimentações. Pesquisadores do país inteiro interagem com produtores e especialistas do DF interessados em testar ou conhecer novas variedades de plantas, transgênicas ou não. Muitas delas estudadas na Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, com sede em Brasília.

O centro, reconhecido como referência no tema, trabalha em parceria com agricultores, cientistas e empresas privadas para agregar valor ao agronegócio por meio da transgenia. O pesquisador Francisco Aragão afirma que a soja é uma das variedades mais exaustivamente investigadas. Mas há pesquisas em outras frentes. O feijão "blindado" contra vírus e a alface imune a fungo, por exemplo, já foram descobertos. Variedades de batata, mamão e banana trangênicas estão em estudo.

Para Aragão, o interesse maior do agricultor é reduzir custos e, dentro dessa lógica, os transgênicos atendem a quase todas as expectativas. No Distrito Federal, de acordo com ele, a pesquisa tem como aliado o próprio homem do campo, que é bem informado e despido de preconceitos em relação ao novo. "Os agricultores locais são muito abertos às tecnologias recentes. Trabalhamos sempre muito próximos a eles", diz.

Na Cooperativa Agropecuária da Região do Distrito Federal (Coopa-DF), a impressão do especialista se confirma. "A turma está apostando e até agora não soube de ninguém que se arrependesse", reforça João Carlos Werlang, presidente da entidade. "Antigamente, a gente não tinha a variedade certa de soja adaptada para o nosso solo. Hoje, isso mudou. A semente é de ótima qualidade, o preço está quase igual ao da soja comum e os transgênicos têm se desenvolvido muito bem", completa.

Entre os produtores do DF, a expectativa agora é pela liberação do plantio de milho geneticamente modificado. Há cinco variedades do grão aguardando um posicionamento da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), órgão oficial que regula esse setor. Defensores do milho transgênico estimam que, caso seja aprovado, o cultivo trará um ganho de produtividade anual de 24% e uma economia de US$ 340 milhões na utilização de defensivos.

Plantações crescem no Brasil

Apesar de toda a pressão de movimentos rurais camponeses e de organizações não-governamentais, o Brasil é uma das fronteiras agrícolas mais propícias à expansão das lavouras geneticamente modificadas. De acordo com relatório do Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações em Agrobiotecnologia (ISAAA), o país liderou em 2006 o crescimento dessa atividade na América do Sul, encerrando o ano com 11,5 milhões de hectares de soja e algodão transgênicos cultivados - ganho de 2,1 milhões em relação a 2005.

Com a liberação oficial do plantio, em 2005, os agricultores brasileiros viraram alvos das grandes multinacionais instaladas no país. Para este ano, a indústria promete lançamentos que combinam eficiência e preço baixo, o que deverá aumentar ainda mais a procura por sementes tecnológicas.

Uma projeção para os próximos 10 anos feita pelo ISAAA coloca o Brasil como uma das grandes potências em transgenia. Em 2015, segundo a entidade, a soja e o milho modificados ocuparão 40 milhões de hectares, enquanto que o algodão responderá por uma área de 1 milhão de hectares. Caso as previsões se confirmem, o Brasil ultrapassará a Argentina - principal produtor entre os países vizinhos - e será o segundo maior celeiro transgênico do planeta, ficando atrás apenas dos Estados Unidos.

No mundo todo, os transgênicos ocupam 102 milhões de hectares (ha) e já mobilizam 10,3 milhões de produtores - em 2005, eram 90 milhões de ha e 8,5 milhões de produtores. Atualmente, 22 países plantam variedades de alimentos geneticamente modificados. Outros 29 aceitam a importação e comercializam variedades para o consumo humano ou o uso em rações animais. O valor de mercado das lavouras chega a US$ 6,15 bilhões. A projeção para 2007 é de US$ 6,8 bilhões. No ano de 2015, o ISAAA acredita que o planeta deverá plantar 200 milhões de hectares e que cerca de 20 milhões de agricultores apostarão nessa tecnologia. (LP)

Mais títulos serão lançados

Certo de que o agronegócio voltará a ser sinônimo de investimento lucrativo, o governo prevê para este ano um salto recorde na emissão de títulos de crédito agropecuário. O saldo acumulado até janeiro atingiu R$ 3,4 bilhões e, segundo estimativas do Ministério da Agricultura, ultrapassará a marca de R$ 8 bilhões em dezembro. Os quatro modelos mais negociados no mercado são o Certificado de Depósito Agropecuário (CDA), o Warrant Agropecuário (WA), a Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e o Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA).

Lançados em 2004, esses papéis são ferramentas de financiamento e refinanciamento de custeio ou comercialização. Os principais atrativos são as taxas - quase tão competitivas quanto os juros do crédito rural (8,75% ao ano) - e as isenções fiscais e tributárias. "A tendência de crescimento é muito positiva. A economia estável ajuda demais", diz Renato Buranello, sócio do Buranello & Passos Advogados, um escritório especializado no ramo. De acordo com Buranello, os estrangeiros têm interesse em ampliar os investimentos no país por meio desses títulos.

Os títulos criam alternativas de negócios até mesmo para quem não é produtor rural ou empresa do setor, na medida em que podem ser negociados livremente no mercado financeiro. O governo pretende incentivar cada vez mais o investidor urbano e o público estrangeiro a apoiarem o campo por meio da compra de papéis e até o fim do ano deverá anunciar a entrada do Banco do Brasil no segmento. A estratégia se justifica especialmente porque a taxa Selic está em queda. "Começa a ficar pouco atrativo colocar dinheiro na mão do governo (via títulos públicos)", explica Edílson Guimarães, secretário de Política Agrícola do Ministério da Agricultura. Sabendo calcular o risco, o especulador tem grandes chances de embolsar ganhos significativos em pouco tempo.

Com os títulos, o campo ganha alternativas de crédito mais baratas e os empresários possibilidades de captação de recursos a baixo custo. Atualmente, apenas 30% de tudo o que é desembolsado para produzir itens agropecuários conta com juros de 8,75%. Os outros 70% chegam ao bolso do produtor bem mais caros. O Brasil, entre todos os países agrícolas importantes do mundo, é o que menos utiliza as facilidades criadas pelo mercado futuro.

CB, 12/03/2007, Economia, p. 8

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