O Globo, O Pais, p.14
29 de Nov de 2003
SE TIVESSE MEDO DE GRITO, NEM TERIA NASCIDO
Lula reage com irritação a protesto contra mudanças na lei de biossegurança durante a Conferência do Meio AmbienteBRASÍLIA. Ao participar da Conferência Nacional de Meio Ambiente, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reagiu ontem com irritação a faixas levadas por manifestantes para denunciar que o projeto de biossegurança do governo, que trata da política sobre transgênicos, estaria sendo desfigurado no Congresso. A reação de Lula aconteceu mesmo depois de ele ser aplaudido ao anunciar que, no próximo dia 3 de dezembro, será votado no Congresso, por acordo de líderes, o projeto de preservação da Mata Atlântica, em discussão há 11 anos. Lula deixou de lado o discurso escrito e passou a falar de improviso. O presidente disse que não há forma mais autoritária de comportamento do que uma pessoa tentar fazer prevalecer seus interesses sobre os da maioria do povo: Nasci na política, na adversidade. Aprendi a fazer política na confrontação, e vou exercer o governo deste jeito. Se tivesse medo de grito, acho que nem teria nascido! Perdi três eleições, ganhei a quarta. Sei de cada compromisso que tenho com este país, sei dos compromissos que tinha com o nosso companheiro Chico Mendes. E, neste governo, nem direita e nem esquerda farão acontecer nada sem que haja um debate democrático, em que a vontade da maioria prevaleça.Ao lado da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, Lula falava que o projeto de biossegurança tinha sido resultado de amplo debate dentro do governo e citava as demais realizações na área do meio ambiente quando os manifestantes levantaram faixas de protestos: O projeto de biossegurança está sendo destruído. O governo não vai fazer nada?, Lula, defenda o seu projeto de biossegurança. O presidente não usou a palavra transgênico para abordar o assunto, que causou polêmica desde que o governo editou uma medida provisória permitindo o plantio de soja geneticamente modificada. A proposta encaminhada ao Legislativo foi discutida minuciosamente por todos os ministérios envolvidos. Não se trata de avalizar maniqueísmos. Trata-se de evitar fatos consumados e lançar pontes em direção a um horizonte em formação, para impedir que um fosso se alargue e novos obstáculos se interponham disse Lula.De novo, críticas aos tucanosAo falar sobre a importância do projeto da Mata Atlântica, Lula criticou o PSDB, afirmando que o partido ficou no governo oito anos e não conseguiu aprovar o projeto, de autoria de um tucano. Lula não poupou elogios ao ex-deputado Fábio Feldman, do PSDB, chamando-o de nosso companheiro. Feldman estava na platéia como convidado da Conferência Nacional do Meio Ambiente. É muito fácil as pessoas colocarem obstáculos em vez de quererem construir. O companheiro Fábio Feldman é um exemplo maior. O partido a que ele pertence governou este país durante oito anos, com maioria absoluta no Congresso, e não foi votado o projeto. Não temos mais que 200 deputados e vamos votar disse.Lula também elogiou o papel catalisador da ministra Marina Silva na discussão do projeto de biossegurança. O presidente disse que vai levar adiante o projeto de transposição das águas do Rio São Francisco, argumentando que é muito fácil as pessoas ficarem em São Paulo e Brasília fazendo críticas sem conhecer a seca no semi-árido nordestino.
O Globo, 29/11/2003, p. 14
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