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Salvar Guarapiranga

JT, Opinião, p. A2
Autor: PEDRO, Simão
27 de Ago de 2004

Salvar Guarapiranga

Simão Pedro

É estranha a lentidão com que o governo paulista encara a necessidade de recuperar e preservar a Bacia do GuarapirangaSimão PedroSão alarmantes as advertências feitas por especialistas sobre as ameaças às fontes de abastecimento de água em todo o mundo. Prevê-se para muito breve a deflagração de guerras motivadas pela disputa de rios entre países limítrofes. Hoje, calcula- se, há 1,2 bilhão de pessoas sem acesso à água, esse bem imprescindível que é tema da Campanha da Fraternidade da CNBB.
Por isso não deixa de ser estranho, muito estranho, a lentidão com que o governo paulista encara a necessidade de recuperar e preservar a Mbacia do Guarapiranga, responsável pelo abastecimento de quase 4 milhões de pessoas. Seu entorno está ocupado por aproximadamente 1 milhão de habitantes - resultado de um processo de proletarização das periferias iniciado em 1970. Nessa época cresceu o avanço sobre a área por moradias irregulares. Entre 1989 e 1996, a região perdeu 15% da sua vegetação. No período, o crescimento urbano da região chegou a 50%, segundo o Instituto Socioambiental.
Inaugurada em 1910 para gerar energia, a represa passou a ter função de abastecimento em 1928. Vinte e quatro anos depois chegaram as primeiras chácaras de lazer. Hoje, sem infra-estrutura e sem legislação específica para conter a reprodução de loteamentos, esgoto clandestino e lixo são atirados nos córregos que correm em direção à represa.
Há consenso sobre a preservação de Guarapiranga. Por que, então, o desinteresse oficial pela preservação dos 630 quilômetros quadrados da área de Guarapiranga, vitais para o armazenamento de 200 milhões de metros cúbicos de água?
Na metade da década de 70 promulgaram-se leis de proteção a mananciais que, de maneira genérica, proíbem no seu entorno a expansão de bairros populares. Tudo muito bem, tudo muito bom, não fosse a proibição imposta ao poder público de realizar obras - quaisquer que fossem - nessas regiões. Iniciativas fundamentais - como a construção de rede de esgotos - deixaram de ser tomadas. As águas da Guarapiranga e, claro, a população sentiram o baque.
Nos anos 90 vieram os movimentos de defesa da represa, propondo a fiscalização da área, o apoio a projetos de sustentabilidade e de regulamentação fundiária e a revisão das leis. Eis aí um tema sempre oportuno: as leis. Também no caso da represa é importante atualizá-las. Isso permitirá a atuação das prefeituras da região.
As diversas entidades que compõem o Conselho Estadual de Meio Ambiente discutiram à exaustão formas de salvar o complexo Guarapiranga-Billings. Apuradas, as propostas foram encaminhadas em agosto de 2002 ao governador Geraldo Alckmin. O anteprojeto, porém, hibernou durante quase dois anos nas gavetas no Palácio dos Bandeirantes. Enquanto isso, mais devastação, mais esgoto e mais agressão às encostas.
Antigos moradores de Guarapiranga, preocupados com o avanço da degradação, organizaram-se em associações. Estão radicados ali há décadas. Interessa-lhes preservar a área e ter, determinados por uma legislação inteligente, limites para a expansão urbana.
Fizeram manifestações para pressionar o governador, e só assim ele enviou, há três meses, o projeto de lei à Assembléia. Agora, porém, repete-se o drama: o texto, depois de repousar na Comissão de Constituição e Justiça, voltou a ela depois de ter seguido para o plenário. Estranho, muito estranho.
É preciso aprovar com urgência a lei específica de Guarapiranga, instrumento suficiente para garantir a cidadania da população que, por omissão do Estado, vive nas proximidades. Para preservar um elemento essencial à vida, numa época em que o Planeta, tão maltratado, literalmente pede água.

Simão Pedro é deputado estadual PT

JT, 27/08/2008, Opinião, p. A2

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