VOLTAR

Rumo ao Pico da Neblina, com os Yanomami

Instituto Socioambiental - https://medium.com/@socioambiental
Autor: Marcos Wesley
10 de Ago de 2016

Se subir o Pico da Neblina já é uma experiência emocionante, imagine fazer esta caminhada guiado por um pajé Yanomami que viveu sua infância e adolescência bem pertinho da montanha, antes mesmo da chegada dos brancos?

"Ali era a nossa casa e nós chamávamos este lugar de Irokae (choro do macaco guariba)", nos conta o pajé Carlos Yanomami em sua própria língua, apontando para a floresta que parece intacta, mas que, há 60 anos, abrigou uma casa coletiva onde aconteciam as festas e rituais de seus parentes.

Ouvindo as histórias do pajé Carlos, a expedição composta por 32 pessoas percorre a trilha até o cume do Yaripo. A viagem dura 10 dias e dá corpo ao projeto de Ecoturismo Yaripo, desenvolvido pelos Yanomami e do qual o ISA é um dos principais parceiros.

Além de seu Carlos, outros 18 Yanomami integram a equipe, sendo 16 rapazes e duas mulheres, Maria e Floriza. Eles estão se capacitando para fazer o monitoramento da trilha e trabalhar como guias, carregadores, cozinheiros, além de trabalhar na gestão do empreendimento de ecoturismo que pretendem desenvolver ali.

Também participam da viagem representantes do ICMbio, Funai, Ministério Público Federal e Exército.

Equipados com GPS, câmera de vídeo, máquina fotográfica e muito interesse, os expedicionários registram os relatos de seu Carlos ao longo do caminho de 36 quilômetros, iniciado na localidade do Igarapé Tucano, Terra Indígena Yanomami, no município de São Gabriel da Cachoeira (AM).

Enquanto superam as distâncias e terrenos bastante exigentes, os índios marcam os locais onde animais ou suas pegadas são vistos, onde há água, pontos na trilha que devem ser melhorados e locais mais adequados para a construção de abrigos para pernoitar. Também identificam as áreas mais sensíveis à degradação ambiental.

Maria Yanomami, hoje com 52, faz história ao se tornar a primeira mulher Yanomami a alcançar o cume do Yaripo-até esse momento, somente homens haviam realizado tal proeza.

Já Floriza Yanomami, sua companheira de caminhada, não pode concluir a subida por respeito e temor às suas tradições. Um dia antes de chegar ao cume ela fica menstruada e, apesar de sua grande tristeza, sabia que aquela condição desagradaria os espíritos que vivem no pico. Se prosseguisse, poderia colocar em risco não só a própria vida, mas a de todos que participam da expedição.

O ecoturismo ao Yaripo será uma alternativa de geração de renda para as comunidades yanomami, que buscam recursos para adquirir bens manufaturados atualmente imprescindíveis: ferramentas para fazer roças , utensílios para preparar alimentos, artigos para dormir e vestir e bens para transporte.

Com a implementação do projeto de ecoturismo de base comunitária, estima-se que 80 Yanomami passarão a ter renda prestando serviços regularmente, beneficiando indiretamente outras 800 pessoas, entre parentes e dependentes.

O desenvolvimento do trabalho dos guias Yanomami e do funcionamento da trilha para uso regular deve ainda gerar recursos destinados a fins comunitários, seguindo as determinações da assembleia geral da Associação Yanomami do Rio Cauburis e Afluentes (AYRCA), da qual participam todos os Yanomami da região.

O ecoturismo ao Yaripo se apresenta assim como uma alternativa ao garimpo de ouro atualmente em vigor nos arredores do pico, praticado tanto por invasores brancos quanto pelos próprios Yanomami. Jovens do sexo masculino, na maioria casados e com filhos, encontram na atividade garimpeira uma renda para manter a família. Trabalham por conta própria com garimpo manual de ouro ou como carregadores para os garimpeiros invasores.

Durante os 10 dias de caminhada na trilha, a expedição cruza com 30 jovens Yanomami indo ou vindo de garimpos. Indagados, dizem trabalhar no garimpo por necessidade e se queixam da ausência de alternativas. Eles avaliam o garimpo como prejudicial à natureza e a eles próprios por ser um trabalho duro e penoso. A expectativa de todos com os quais conversamos é que, com as atividades ligadas ao ecoturismo, será possível deixar o garimpo para se engajar numa atividade de baixo impacto ambiental, além de ser mais agradável e rentável.

O Pico da Neblina é um dos lugares mais conhecidos do mundo para os amantes do turismo de aventura. Está fechado para visitação desde 2003 por recomendação do Ministério Público Federal e determinação do Ibama. Se, por um lado, a decisão frustrou os montanhistas, por outro foi uma medida necessária para impedir a degradação ambiental e a violação dos direitos dos Yanomami.

A reabertura da trilha ao pico para o turismo, agora sob a administração dos Yanomami, está prevista apenas para 2018. Pessoas do mundo todo poderão conhecer os Yanomami e o lugar precioso onde vivem. Em número restrito e com acesso controlado, os turistas poderão aprender um pouco da cultura indígena, desfrutar de sua hospitalidade e se juntar na aliança em defesa dos direitos indígenas e da floresta amazônica.

Quando o Yaripo enfim estiver aberto aos turistas, as histórias de Seu Carlos Yanomami estarão vivas junto aos jovens que hoje recebem esse conhecimento do velho pajé-e que então poderão transmití-las e encantar aos visitantes.

https://medium.com/@socioambiental/rumo-ao-pico-da-neblina-com-os-yanom…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.