VOLTAR

Reservas privadas que preservam Mata Atlântica terão incentivo

Tribuna de Imprensa-Rio de Janeiro-RJ
04 de Fev de 2003

As propriedades privadas abrigam cerca de 50% dos remanescentes de Mata Atlântica e, por isso, são fundamentais em qualquer projeto de restauração florestal e conservação da biodiversidade. Embora as grandes manchas de floresta estejam protegidas em parques e reservas, federais ou estaduais, não há possibilidade de conectá-las e formar corredores ecológicos sem contar com os fragmentos de mata privados. E, sem conexão, a tendência é de continuidade da degradação, empobrecimento em termos de espécies e perda da diversidade genética.

Para transformar tais fragmentos em Reservas Particulares do Patrimônio Natural (RPPNs) e garantir sua manutenção, a Aliança para a Conservação da Mata Atlântica lançou ontem o Programa de Incentivo à Sustentabilidade de RPPNs, no Rio de Janeiro. A aliança é formada pelas entidades ambientalistas Fundação SOS Mata Atlântica e Conservation International.

O programa conta com US$ 1 milhão para aplicação nos próximos três anos em atividades econômicas que garantam a sustentabilidade das RPPNs, promovam a melhoria do estado de conservação das matas ou ajudem a divulgar esta modalidade de unidade de conservação administrada pelo setor privado.

"Ainda falta conhecimento, por parte do proprietário de remanescentes de Mata Atlântica, do que são RPPNs, para que servem e como funcionam", diz Maria Cecília Wey de Brito, coordenadora da Aliança. "Apenas a garantia de conservação das matas que restam não é estímulo suficiente para ele iniciar o processo de criação de uma reserva. Ele precisa saber tirar proveito da área protegida, sem prejudicar seus direitos de propriedade".

Por falta de conhecimento específico, a maioria das 324 RPPNs, que ontem protegem mais de 100 mil hectares de remanescentes de Mata Atlântica e ecossistemas associados, são mantidas apenas por estarem associadas a alguma organização não-governamental (ONG) ou por pertencerem a indivíduos pessoalmente engajados na proteção à natureza.

Ainda falta o incentivo ao proprietário comum, que o novo programa pretende indiretamente assegurar, melhorando as condições das reservas já existentes e o apoio às ONGs parceiras dos proprietários.

Prioridades - Duas regiões foram escolhidas como prioritárias e receberão os primeiros recursos de incentivo: o Sul da Bahia e Centro-Norte do Espírito Santo, onde se pretende reconstituir o Corredor de Biodiversidade Central da Mata Atlântica e do Rio de Janeiro, Nordeste de São Paulo e Serra da Mantiqueira, em Minas Gerais, constituindo o chamado Corredor de Biodiversidade da Serra do Mar.

Se houver investidores interessados em apoiar projetos específicos em outras áreas, eles também serão encaminhados pela Aliança. As RPPNs não são necessariamente criadas em área de florestas primárias. "O mais importante não é nem a qualidade da vegetação, mas o engajamento da população em atividades objetivas de conservação", continua Maria Cecília.

Em Aimorés, Minas Gerais, por exemplo, o conhecido fotógrafo brasileiro Sebastião Salgado transformou uma propriedade da família na RPPN Bulcão e lá funciona, desde 1999, o Instituto Terra. "Aqui não tinha nada, era uma área devastada, mas já plantamos 460 mil árvores (200 hectares) e até o final de 2003 serão 1 milhão", diz Aline Tristão, coordenadora da ONG.

Ela conta que "apanharam" no primeiro plantio e perderam muitas mudas, mas agora têm até um laboratório de manejo florestal e fazem a capacitação de agricultores vizinhos e integrantes do Movimento dos Sem-Terra (MST).

Exemplos - O plantio é feito na estação das águas e o trato principal é manter a área em volta das mudas limpa, com até cinco capinas por ano. "Temos mudas já bem altas, apesar de ter começado há pouco tempo", orgulha-se Aline, observando que a RPPN já é uma ilha de verde em meio a terras completamente degradadas, servindo de exemplo vivo de recuperação.

Também em Minas, a RPPN de Caratinga consta no mapa como uma ilha de mata verde em meio a pastagens. É facilmente vista em imagens de satélite, às margens do rio Manhuaçu. Com 927 hectares, a reserva abriga uma das mais importantes populações de muriquis, além de outras três espécies de primatas, entre as quais o sagüi da serra, endêmico da região.

"Enquanto meu avô era vivo, permitia apenas a pesquisa, mas não queria abrir a reserva para ninguém, acho que eram poucos os vizinhos que sabiam que ali tinha muriquis", afirma Ramiro Abdalla Passos, da ONG Preserva Muriqui, criada após a RPPN, de 2001. Segundo ele, o contato com a comunidade do entorno agora é uma das metas, com a abertura de um centro de visitantes e trilhas organizadas para escolas e educação ambiental.
(-Tribuna de Imprensa-Rio de Janeiro-RJ-05/02/03)

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.