VOLTAR

Reservas coniventes

O Globo, Opinião, p. 6
15 de Out de 2008

Reservas coniventes

Às denúncias do Ibama de que assentamentos de colonos têm parte ponderável da responsabilidade pelo desmatamento na Amazônia juntam-se agora fortes evidências de que reservas indígenas do Maranhão podem estar coniventes com a degradação ambiental da área, que já atinge proporções preocupantes.

Uma reportagem do "Fantástico" mostrou domingo passado que há extração irregular de madeira numa extensão de 16 mil quilômetros quadrados, onde vivem dez mil índios. De acordo com a reportagem, 40 madeireiras operam na região. O chefe regional do Ibama acusa a população indígena de dar apoio à extração ilegal. Por sua vez, o chefe regional da Funai, se não encampa a denúncia, não a descarta por completo: "Não posso afirmar se existe veracidade na participação desses caciques, mas é possível que sim", disse Sérgio Murilo Rego à equipe da TV Globo.

Fora a existência de um clima de terror que intimida quem tenta se opor às atividades ilegais das madeireiras, a ponto de a polícia local chamar de faroeste maranhense a região de Buriticupu, onde se concentram as empresas de extração, existe a adicional leniência dos órgãos supostamente encarregados de inibir tais ações.

Ao Incra compete evitar que supostos movimentos de reforma agrária derivem para abusos - e, como não o faz, os índices de desmatamento nos assentamentos, conforme incontáveis denúncias na imprensa, comprovadas, afinal, pelo Ibama, tornam-se alarmantes. Já a constatação de que índios também teriam sua cota de culpa nas agressões contra a floresta deixa mal a Funai, organismo que, em tese, deveria impedir que a população indígena se envolva em malfeitorias. Não por acaso, os dois órgãos são pontas de lança do aparelhamento de repartições do governo federal, e, como tal, atuam sob uma blindagem que os deixa a salvo da fiscalização da sociedade.

As denúncias de desmatamento promovido por setores abrigados nas asas companheiras do Incra e da Funai acabam de vez com o mito de que assentados e indígenas, por natureza, não agridem o meio ambiente. Permanecer com essa visão, por mais que recenda a odores ideologicamente ultrapassados, é uma opção de cada um.

Quando, no entanto, tal postulado ganha amparo em organismos obrigados a defender os interesses da sociedade, e não de grupos corporativos, se está diante de uma grave transgressão. Perdem, neste caso, a democracia e o meio ambiente.

O Globo, 15/10/2008, Opinião, p. 6

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.