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Represa atinge volume recorde

OESP, Metrópole, p. C3
28 de Jan de 2010

Represa atinge volume recorde
Nível registrado ontem é o maior em 40 anos; Sabesp garante que barragem não corre risco de romper

Diego Zanchetta
Atibaia

No dia 27 de novembro de 2003, o Sistema Cantareira atingiu o nível alarmante de 0,9% de sua capacidade de armazenamento e colocou em risco o abastecimento de 10 milhões de pessoas na Grande São Paulo e no interior. Ontem, passados mais de seis anos, a força das chuvas inverteu a situação. O Reservatório Atibainha atingiu 101% - recorde em 40 anos -, agravando as cheias que já inundam bairros em Atibaia, Piracaia, Bom Jesus dos Perdões e Bragança Paulista. Prefeitos que reclamavam da seca agora pedem o fechamento imediato dos vertedouros das barragens.

Mesmo sem chuvas, na madrugada de ontem, o Rio Atibaia subiu mais meio metro, segundo funcionários da Defesa Civil Municipal que trabalhavam no socorro às famílias ilhadas. A água segue subindo desde segunda-feira, por causa do aumento de vazão do reservatório. Do dia 17 até ontem, foram bombeados cerca de 100 milhões de metros cúbicos de água excedentes para os mananciais do interior. Como o reservatório está cheio, a água sai pela tulipa em direção aos mananciais que recortam as cidades inundadas.

A Companhia do Saneamento Básico de São Paulo (Sabesp), porém, informou que a barragem não corre o risco de romper, o que poderia alagar cidades inteiras. "Não existe trinca, não existe risco algum de a estrutura ceder. O que aconteceu é que as chuvas fortes encheram os reservatórios, que estão no limite de sua capacidade", afirmou o gerente de Recursos Hídricos, Carlos Roberto Dardes. Ele disse que o Reservatório Jaguari-Jacareí e a Represa do Rio Cachoeira também chegaram a 100%. Em janeiro do ano passado, o nível médio de armazenamento desses reservatórios era de 57,4%. O governo estadual está bombeando água desses reservatórios lotados para o Paiva Castro, em Mairiporã, cuja capacidade está em menos de 50%.

Os prefeitos da região e a Defesa Civil Estadual montaram desde segunda-feira uma força-tarefa para remover as famílias desalojadas para três abrigos na cidade de Atibaia. Mais de mil refeições são distribuídas por dia. Foram montados alojamentos em contêineres. Dois ginásios estão lotados. "Não existe caos. Só 3% ou 4% da cidade está sofrendo com as enchentes. E essa população ribeirinha vai voltar quando a água baixar. Para quem ficou sem casa estamos buscando terrenos para construir moradias populares", disse o vice-prefeito de Atibaia, Ricardo dos Santos Antonio.

O prefeito de Atibaia, José Denig (PV), passou os últimos dois dias em Itupeva e em São Paulo, onde participou de reuniões da Associação Paulista de Cidades Estâncias. Denig não participou da entrevista coletiva com coordenadores da Sabesp e da Defesa Civil Estadual. "Mas ele esteve nas áreas alagadas hoje (ontem) pela manhã", disse Antonio.

Em meio ao cenário de tragédia, pescadores de Atibaia lançavam tarrafas ontem à tarde para pegar tilápias nas ruas alagadas. "Perdi tudo, não consigo nem entrar na minha casa para ver se ninguém roubou nada", contou o pescador Mauro Soares, de 44 anos.

Piracaia

Em Piracaia, município vizinho a Atibaia, é difícil entrar na cidade, construída quase toda no leito do rio e em uma área montanhosa, com pequenas casas no pé. Condomínios de alto padrão estão inundados e funcionários tentavam recuperar móveis usando barcos de pesqueiros vizinhos. Dezenas de famílias também deixaram suas casas ontem na vizinha Bom Jesus dos Perdões.

"Por onde o rio margeia, inundou tudo", disse, desesperada, a dona de casa Maria Helena Xavier, de 44 anos, que teve de abandonar o sobrado onde mora há seis meses ontem pela manhã. Já a situação da empresária Bethania Domingos, de 40 anos, era ainda pior. Às 9h34 de ontem, ela completava dois dias de espera por socorro. "Não consigo sair da minha fábrica. No térreo a água está no pescoço", reclamou Maria Helena, que conseguiu sair da área alagada, com ajuda da Defesa Civil Municipal de Atibaia, por volta das 11h30. Para preocupação geral, a previsão, segundo o Inpe, é de que as chuvas voltem a atingir a região de Atibaia hoje.

Urbanistas criticam Sistema Cantareira

Construído durante o regime militar, na segunda metade da década de 60, o Sistema Cantareira foi a solução de engenharia mais simplista para resolver o problema da falta de fontes de abastecimento na Região Metropolitana de São Paulo, segundo avaliam hoje urbanistas e ambientalistas. Toda a barragem é formada por seis reservatórios que têm a função de transpor água de duas bacias - a do Rio Piracicaba e a do Alto Tietê - para a capital e suas cidades vizinhas. Quando passou a operar, em 1973, o conjunto de reservatórios diminuiu a vazão dos rios da Bacia do Piracicaba, o que gerou a saída de centenas de agricultores das áreas ribeirinhas dos Rios Atibaia e Jaguari.
Na década de 80, essas áreas viraram condomínios fechados, hotéis e indústrias, o que levou à perda de 72% da mata ciliar do Rio Atibaia. "O Sistema Cantareira não foi uma boa solução, mas jogar a culpa só nele pelas cheias no interior é reduzir a discussão.
A urbanização dessas áreas ribeirinhas pelos condomínios fechados tem de entrar na conta da tragédia, pois foi feita com a chancela das prefeituras da região", avalia o ambientalista Carlos Bocuhy, que integra o Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema). Segundo acordo entre prefeituras da região e a Sabesp, a empresa tem de encontrar outras formas de captação de água para não comprometer a vazão dos rios em direção ao interior. D.Z.

OESP, 28/01/2010, Metrópole, p. C3

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