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Reação tímida

Isto É, Medicina & Bem-Estar, p. 52
08 de Set de 2004

Reação tímida
Governo vacina índios, mas ainda há críticas sobre as ações de controle da hepatite

Mônica Tarantino

O Vale do Javari é uma região com oito milhões de hectares de terra na Amazônia, onde vivem cerca de três mil índios das etnias matis, marubo, kolina, kanamari, mayouruna e korubo. Infelizmente, essas populações estão ameaçadas por doenças graves que podem se espalhar entre índios que vivem isolados em áreas mais remotas. Depois de pressões de lideranças indígenas, de ONGs e de reportagem publicada por ISTOÉ na edição 1819, de 18 de agosto, a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), do Ministério da Saúde, iniciou uma vacinação na região para aumentar a imunização dos índios contra várias doenças, incluindo a hepatite B.
Exames feitos em 413 índios matis e marubos pela expedição Imagens do Javari, que percorreu a região em abril, indicaram que 8% deles já têm a forma crônica da doença. Sem tratamento, ela leva à cirrose e provoca tumores. Na região, há índios jovens com fígado danificado em consequência da falta de tratamento. Quando combinada com doenças como a malária ou a hepatite D (Delta), pode haver uma forma fulminante da enfermidade, conhecida como síndrome da febre íctero-hemorrágica aguda.
A vacinação começou no final de agosto. Numa primeira etapa, a equipe chegará de helicóptero a 12 das 37 aldeias da área. Os matis e os marubos serão visitados por barco, provavelmente ainda este mês. Porém, a ação depende da disponibilidade de barcos. Os quatro pertencentes à Funasa estão quebrados, esperando conserto. De acordo com o diretor de saúde indígena da Funasa, Alexandre Padilha, outra campanha de vacinação deverá ocorrer em novembro. Ele diz que não é possível ainda fazer uma estimativa de quantos índios serão imunizados.
Mesmo sem previsões, o certo é que o trabalho terá de ser duro. Entre os matis e os marubos, por exemplo, apenas 37% da população está defendida contra o vírus da hepatite B. "Para proteger a comunidade da doença deve-se ter uma cobertura vacinal de pelo menos 80% da população", diz o médico Marcos Boulos, da Universidade de São Paulo. E não pode haver erros, aponta o médico Oswaldo Palhares, ex-coordenador da Funasa no Amazonas. Palhares ficou 60 dias no cargo e foi demitido há três semanas. Em junho, ele organizou uma vacinação emergencial para não perder um lote de vacinas com validade naquele mês.
Quem vive no Javari acha que o trabalho da Funasa é tímido diante do tamanho
do problema. "Desde 2003, pelo menos 22 pessoas morreram com a febre
íctero-hemorrágica na região. E essas doenças continuarão se espalhando se não for feito um trabalho constante para ensinar como se evita a transmissão da doença, o que ainda não começou", diz o índio Clóvis Marubo, uma das lideranças do Conselho Indígena do Vale do Javari (Civaja), que reúne representantes dos índios da região. Na semana passada, a ONG enviou uma carta ao Ministério da Saúde, ao Ministério Público e a Alexandre Padilha criticando a falta de planejamento. "Existem muitas falhas no atendimento. Em relação à hepatite B, o controle é exercido por meio da vacinação, cuja prática vem ocorrendo sem planejamento, apenas com campanhas emergenciais de última hora, sem garantir cobertura vacinal ideal, revelando a extrema fragilidade da atenção à saúde dos índios", denuncia Clóvis. A Funasa rebate a crítica com o argumento de que este será o primeiro ano em que de fato ocorrerão as quatro campanhas de vacinação previstas na região. Espera-se que isso aconteça.

Isto É, 08/09/2004, Medicina & Bem-Estar, p. 52

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