OESP, Economia, p. B8
13 de Set de 2004
Quem compra, além de direitos, tem deveres
Denunciar empresas que não respeitam as leis e o meio ambiente é uma das obrigações
Tatiane Matheus
O empresário Carlos Bocuhy não compra produtos com embalagens que não podem ser recicladas, separa o lixo e não escuta CD pirata. Seu cartão de visitas é de papel reciclado. Até deixou de usar uma marca de tênis que adotava trabalho infantil nas fábricas. "Não sou radical, não reclamo por qualquer coisa, mas sempre vejo a procedência dos produtos que consumo", diz.
Quem reclama do desmatamento, se revolta com cambistas, sofre com enchentes e com racionamento, mas compra ingressos fora da bilheteria, joga lixo no chão e lava a calçada com mangueira não está cumprindo deveres de consumidor. "A ética no consumo deve ser preservada quando consumimos algo.
Tanto pelo consumidor quanto pelo fornecedor, observando a produção e aquisição de bens e serviços", explica Cid Alledi, pesquisador do Laboratório de Tecnologia, Gestão de Negócios e Meio Ambiente da Universidade Fluminense (Latrec). Ele afirma que o consumidor pode tirar produtos de baixa qualidade do mercado ao parar de comprá-los. "Com consumidores exigentes, as empresas terão de melhorar a qualidade para poder vendê-los."
Ele explica que tudo o que consumimos causa impacto. Uma torneira pingando gasta, em média, 150 litros de água por dia. O ser humano precisa de dois litros diários, então essa água pode mantê-lo por dois meses e meio. Um papelzinho dentro impede que uma garrafa seja reciclada. E é possível escovar os dentes com metade da pasta mostrada nos comerciais. "Para satisfazer necessidades de materiais e energia dos seis bilhões de habitantes da Terra, gastamos 20% a mais do que ela pode oferecer." Para Alledi, é preciso conhecer a procedência dos produtos, pensar no desenvolvimento sustentável e prestigiar empresas responsáveis.
A professora Helga Szmuk concorda e acrescenta que o brasileiro não gosta de reclamar. "Quem faz isso passa por chato." Ela diz que separa o lixo, mas depois o lixeiro mistura tudo. "Não sou consumista, tenho uma saia com uns 20 anos. Só compro o que preciso."
Nos anos 80, as empresas perceberam que o consumidor esclarecido e exigente poderia abalar vendas. O gerente de informações do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Marcos Pó, comenta que, para ter influência, o consumidor precisa de informação. O Idec analisa empresas em três aspectos:
comportamento em relação ao trabalho, à natureza e ao consumidor. No início do ano, sete empresas receberam a pesquisa. Apenas uma respondeu. Duas enviaram balanços sociais e as demais um projeto de responsabilidade social.
A pesquisa está no site www.idec.org.br.
Pirataria - Segundo a Associação Brasileira de Empresas de Softwares (Abes), a indústria deixou de faturar, em 2002, US$ 1,36 bilhões por causa da pirataria. E copiar software, segundo a Lei n.o 9.608/98, é crime, com pena de seis meses a quatro anos.
Em 2003, a Associação Protetora dos Direitos Fonográficos (APDIF) acompanhou as autoridades brasileiras na apreensão de 17 milhões de CDs piratas.
Segundo a APDIF, 56 mil postos de trabalho foram fechados desde 1999 por causa da pirataria, e 59% do mercado é de produtos ilegais. Isso equivale à diminuição de 30% nos empregos, 30% na contratação de artistas, fechamento de 2 mil lojas e 24% menos lançamentos.
"Quando você trabalha, quer receber salário. Ao comprar CD pirata, você tira o salário de alguém", diz Roberto Poletto, diretor-geral da Practica, empresa de duplicação de mídia. A empresa faz parte de duas associações antipirataria. Ele explica que o crime é sofisticado. Uma torre de duplicação custa de R$ 5 mil a R$ 6 mil e faz 25 CDs por hora. Marcos Pó lembra que quem compra produtos falsificados quer ter acesso ao consumo. "As empresas devem buscar a inclusão de seus produtos."
Se não for pela natureza, que seja pelo próprio bolso
Greenpeace dá dicas sobre como economizar e ainda evitar danos ao meio ambiente
Atitudes que preservam o meio ambiente ajudam a economizar. Tudo que é consumido causa algum impacto, seja na produção, seja quando se torna lixo.
A coordenadora da Campanha do Amazonas do Greenpeace, Rebeca Lerer, diz que a ONG tem um viés para os consumidores. "Quando você economiza, diminui o impacto sobre o meio ambiente", comenta. "Devemos usar os recursos pensando no coletivo. Todos querem ter tudo de última geração, mas, quanto maior a vida útil do produto, menor a necessidade de comprar coisas novas."
Ela sugere que sejam usados produtos biodegradáveis, embalagens com refis e com maiores quantidades. Quem tem chuveiro que demora para esquentar pode colocar um balde para armazenar a água fria e usá-la para regar plantas.
Encher a pia de água ao lavar a louça é outra dica. "Economizar água e luz é uma atitude sensata."
Aproveitar a moda de customização de roupas é outra maneira de economizar pensando no meio ambiente. Para produzir roupas de algodão é usada terra, água, luz e tinturas, que algumas vezes são tóxicas. Rebeca diz que roupas e móveis devem ser reciclados ou doados. "Gasta-se mais energia para fabricar uma pilha do que ela mesma gera. Uma boa opção é utilizar pilhas recarregáveis. Comprar computadores que possibilitem upgrades também é bom para o bolso e para o meio ambiente." Ela aconselha também a conhecer e votar em políticos cuja plataforma inclua o meio ambiente.
"Se as pessoas não mudarem o seu consumo, elas destruirão o espaço onde vivem. Salvando a natureza, estaremos salvando a nós mesmos", afirma a coordenadora. (T.M.)
OESP, 13/09/2004, Economia, p. B8
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