VOLTAR

Quatro bacias da Amazônia têm alto risco de contaminação por mercúrio, aponta novo estudo da WWF-Brasil

O Globo - https://oglobo.globo.com/brasil/meio-ambiente/noticia/2024/10/31/quatro-bacias-da-amazonia
31 de Out de 2024

Quatro bacias da Amazônia têm alto risco de contaminação por mercúrio, aponta novo estudo da WWF-Brasil
Trabalho publicado na revista Toxics aplicou modelagem de projeção a partir de dados de pesquisas recentes pelo Observatório do Mercúrio

Por Lucas Altino - Rio de Janeiro
31/10/2024

Pelo menos quatro bacias da Amazônia têm grande risco de contaminação por mercúrio e apresentam exposição acima dos níveis considerados seguros, aponta novo estudo da WWF-Brasil. O trabalho organizou diversas pesquisas e coletas de dados recentes sobre o tema e utilizou uma modelagem matemática para fazer projeções sobre a distribuição do mercúrio pelos rios da maior floresta tropical do mundo.

Segundo os resultados, as bacias dos Rios Tapajós, Xingu, Mucajaí e Uraricoera, que abrigam territórios indígenas sob ameaça do garimpo ilegal, apresentam um grande risco de contaminação. A concentração do metal em peixes foi analisada com base nos dados do Observatório do Mercúrio, plataforma desenvolvida pelo WWF-Brasil em parceria com outras instituições, como a Fiocruz. O resultado da análise foi publicado no revista científica Toxics, em agosto.

Porcentagem de sub-bacias acima dos limites de mercúrio
Bacia Uraricoera: 57,8%
Bacia Mucajaí: 54%
Bacia do Tapajós: 51,7%
Bacia do Xingu: 48,2%
O estudo alerta para os riscos às comunidades que dependem da pesca como fonte de subsistência, como indígenas e ribeirinhos. Utilizado pelo garimpo ilegal para processo de separação do ouro, o mercúrio acaba sendo levado pelas águas dos rios. Segundo a pesquisa, as concentrações de mercúrio seriam mais baixas nas cabeceiras e aumentariam progressivamente ao longo do curso dos rios.

- O estudo evidencia como a poluição por mercúrio está intrinsecamente ligada tanto às atividades de mineração quanto às características dos ecossistemas aquáticos. As áreas alagáveis e outros elementos desempenham papéis cruciais na ampliação dos níveis de metilmercúrio. Assim, a crescente construção de infraestruturas, como reservatórios para hidrelétricas, pode potencialmente intensificar o problema, uma vez que essas estruturas podem aumentar a área de ambientes favoráveis à metilação do mercúrio - afirma Marcelo Oliveira, especialista em Conservação do WWF-Brasil.

Nas conclusões, os pesquisadores destacam que a legislação brasileira precisaria ser reformulada, a fim de atender melhor à realidade atual de contaminação por mercúrio nos rios. "A atual regulamentação brasileira acerca das concentrações de mercúrio em peixes não é capaz de proteger adequadamente as comunidades dos efeitos nocivos do contaminante na saúde das pessoas", diz o estudo.

Das 540 sub-bacias analisadas das bacias Uraricoera e Mucajaí, 56,7% não atenderia aos padrões para mercúrio estabelecidos na legislação ambiental.

Das 3.791 sub-bacias do Tapajós, mais da metade (51,77%) não estaria em conformidade com os parâmetros de mercúrio existentes na legislação ambiental brasileira. Na Bacia do Baixo Teles Pires, onde estão os rios Apiacás e Alto e Médio Teles Pires, o resultado é ainda pior, todas com porcentagem acima de 59%.

Mesmo na baxia do Xingu, onde o garimpo é menos intenso do que nas bacias anteriores, o risco é alto. A modelagem indica que 48,2% de suas bacias teriam contaminações de mercúrio acima do limite importo na legislação atual.

Segundo o estudo, esse cenário indica 49,4% de áreas de risco para homens, por causa do consumo de peixes. O percentual é ainda maior para populações indígenas, que têm o peixe como principal fonte de alimentação: 49,6% das sub-bacias são consideradas territórios de risco muito alto para os indígenas.

No painel do Observatório do Mercúrio, é possível verificar os locais onde houve coletas de amostras de peixes ou de análises em seres humanos e os resultados das contaminações por mercúrio. O mapa mostra índices de contaminação muito alta nos rios mais importantes da Amazônia, como Amazonas, Negro, Madeira, Tapajós, Purus, Jiparaná e Tocantins.

Os dados disponíveis hoje, porém, ainda não revelam a totalidade das ameaças na Amazônia, afirma Vitor Domingues, analista ambiental e um dos pesquisadores responsáveis pelo estudo

- Um dos grandes desafios de se estudar a Amazônia é a escassez de dados amostrais. O estudo de modelagem ajuda a enfrentar esse desafio, contribuindo com o entendimento da dinâmica do mercúrio em um bioma tão complexo e sensível através de outras fontes de informação.

O estudo usou o modelo matemático SERAFM (spreadsheet-based ecological risk assessment for the fate of mercury), desenvolvido pela U.S. EPA, para avaliar o risco ecológico a partir do destino ambiental do mercúrio.

Avanço do garimpo na Amazônia
De acordo com o MapBiomas , a área de garimpo apenas em territórios indígenas cresceu 265% entre 2017 e 2022, alcançando 25,2 mil hectares, um território maior do que a cidade de Recife. As Terras Indígenas Kayapó (13,7 mil hectares), Munduruku (6,5 mil hectares) e Yanomami (3,3 mil hectares) estão entre os territórios mais afetados.

Por isso, a modelagem focou nas bacias hidrográficas dos Rios Tapajós, Xingu, Rio Mucajaí e Uraricoera, que abrigam os territórios indígenas mais afetados pelo garimpo. Na Terra Indígena Yanomami, sete rios e três afluentes estão contaminados por mercúrio e têm peixes com alto índice de contaminação: rios Parima, Uraricaá, Amajari, Apiaú, Uraricoera, Mucajaí e o Couto de Magalhães, e afluentes Auaris, Trairão e Ereu, na bacia do rio Uraricoera.

Nos últimos anos, estudos vêm apontando o perigo da exposição ao mercúrio em rios e comunidades da Amazônia. Em 2022, um estudo do Laboratório de Epidemiologia Molecular (Lepiomol) da Universidade Federal do Oeste do Pará, em parceria com a Fiocruz e o WWF-Brasil, identificou níveis de mercúrio acima do limite de segurança em 75,6% dos 462 moradores de Santarém (PA) examinados. De acordo com a OMS, o limite máximo da substância no organismo é de 10 microgramas por litro.

Já no ano passado, estudo realizado pela Fiocruz, a Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), a Greenpeace Brasil, o Iepé, o Instituto Socioambiental (ISA) e a WWF-Brasil mostrou que 21,3% dos peixes comercializados em 17 cidades de seis estados do Norte brasileiro têm níveis de mercúrio acima dos limites seguros estabelecidos pela OMS e a Anvisa.

https://oglobo.globo.com/brasil/meio-ambiente/noticia/2024/10/31/quatro…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.