Quartiero destrói a fazenda Depósito

O rizicultor Paulo César Quartiero está demolindo toda a estrutura física da fazenda Depósito, de propriedade dele, instalada na terra indígena Raposa Serra do Sol, ao norte de Roraima.

A propriedade de 5 mil hectares foi incluída na demarcação da reserva homologada em 2005 de forma contínua pelo presidente da República Lula da Silva (PT) e validada no mês passado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ele ainda é proprietário da fazenda Providência, de 4,2 mil hectares, igualmente situada na terra indígena.

A Folha registrou o momento em que funcionários da fazenda arrancavam portas e janelas e quando uma máquina derrubava as paredes das construções na propriedade. As fotografias foram feitas ontem, durante visita da comissão externa criada pela Câmara Federal para acompanhar o processo de retirada de habitantes não-índios da Raposa Serra do Sol.

Até um galpão onde eram guardados os equipamentos agrícolas, que ficava localizado bem na entrada da fazenda, não existe mais. A demolição pegou os parlamentares de surpresa. Inquieto com o que vira, o deputado federal Fernando Gabeira (PV/RJ) perguntou a Quartiero se ele não temia medidas judiciais.

Como resposta, o rizicultor se disse vítima de perseguição por parte do governo federal e citou a fiscalização recente que a propriedade passou por técnicos da Agência Nacional das Águas (ANA), Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em busca de possíveis danos ambientais causados pelo processo de desocupação.

Em maio do ano passado, Quartiero foi multado pelo Ibama em R$ 30,6 milhões por danos ambientais. A multa foi aplicada após conclusão de laudo técnico que durou quatro meses para ser concluído e apontou danos como desmatamento da mata ciliar, utilização dos lagos, desvio de água do rio Surumu para a fazenda, supressão de vegetação, entre outros crimes. Ele recorre na Justiça contra a penalidade.

Ele também informou a Gabeira que utilizará todo o material reaproveitável, como portas, telhas e janelas, na construção de uma nova fazenda assim que encontrar terras compatíveis com a produção de arroz.

INDENIZAÇÃO - Todos os habitantes não-índios que vivem na terra indígena tiveram suas posses avaliadas pela Funai, para que pudessem ser indenizados pelas benfeitorias antes da desocupação. Os valores foram depositados em nomes dessas pessoas, porém algumas se recusaram a receber por discordarem dos valores, como é o caso de Paulo Quartiero.

Como todas as questões referentes à Raposa Serra do Sol foram declinadas à Suprema Corte, o dinheiro referente às indenizações também está depositado lá. O ministro do STF Ayres Britto estuda delegar ao presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF), desembargador Jirair Meguerian, ou à Justiça Federal em Roraima a competência para liberar o pagamento referente às benfeitorias.

PF - De acordo com o superintendente regional da Polícia Federal, José Maria Fonseca, a ação de demolir a estrutura física da fazenda é ilegal. "Vamos mandar fazer levantamentos no local [fazenda Depósito] para comprovação. Ele [Quartiero] foi indenizado pelas benfeitorias, independente de ele ter recebido o pagamento ou não, está provocando um dano consciente. A partir do momento em que a União resolve indenizá-lo pelas benfeitorias, elas passam a ser da União", destacou.

Fonseca disse que ainda hoje vai notificar o Ministério Público Federal (MPF) para que tome conhecimento do fato. "O MPF deve instaurar processo por crime de dano, assim que receber a prova de que Quartiero está danificando a fazenda", enfatizou Fonseca.

A reportagem tentou saber o valor das indenizações referentes à fazenda do rizicultor bem como o valor pleiteado por ele, mas não foi possível estabelecer nenhum contato telefônico com os gestores da Funai. Os celulares deles estavam desligados ou fora da área de serviço.