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Projeto refaz floresta no vale do Paraíba

FSP, Ciência, p. A24
10 de Out de 2010

Projeto refaz floresta no vale do Paraíba
Corredor ecológico da mata atlântica pode ganhar reforço de lei que prevê pagamento por serviços ambientais
Guaratinguetá deve votar legislação que dá até R$ 5.000 anuais a pequeno proprietário "verde" ainda neste mês

Reinaldo José Lopes
Enviado a Guaratinguetá (SP)

"Plantar floresta dá trabalho, principalmente se você quiser fazer a coisa do jeito certo", brinca Paulo Valladares Soares, geólogo de formação e secretário-executivo da Associação Corredor Ecológico do Vale do Paraíba.
Diante das encostas artificialmente nuas da serra da Mantiqueira em Guaratinguetá (SP), privadas da mata atlântica que as cobria por fazendas de café há muito falidas, fica claro o quanto vai dar trabalho replantar a floresta. E ainda mais na escala desejada pelo projeto do corredor ecológico: 150 mil hectares em dez anos, uns 10% da área do vale do Paraíba.
Há, no entanto, uma ou duas razões para ser cautelosamente otimista.
A primeira tem a ver com uma lei municipal que, se tudo caminhar como Soares e seus colegas esperam, deve ser aprovada ainda neste mês pelos vereadores de Guaratinguetá. O plano: pagar até R$ 5.000 anuais a pequenos proprietários que replantarem ou conservarem a mata nativa de suas terras.

VALE QUANTO PESA
O conceito, conhecido como pagamento por serviços ambientais, parte do princípio de que terras florestadas têm um valor econômico que vai além da madeira que se pode extrair delas. A mata é um purificador e produtor de água; funciona como fiel da balança da qualidade do solo -coisas que, cada vez mais, valem um bom dinheiro.
Outra razão para achar que o plano, afinal, pode funcionar: o mapa detalhado das futuras conexões entre pedaços hoje isolados de mata atlântica, que acaba de ser traçado por pesquisadores da Faculdade de Engenharia da Unesp de Guaratinguetá.
Passando rapidamente pelas páginas da apresentação de Powerpoint, Pedro Ivo Camarinha e Carolina Cassiano Ferreira, coautores do novo estudo, mostram como buscar um caminho de menor resistência entre a paisagem já muito ocupada pelo homem.
Variáveis como estradas, qualidade do solo, relevo e até nível educacional dos municípios do vale do Paraíba ajudam a traçar a estratégia. Áreas de mata nativa nas fazendas da empresa de produtos florestais Fibria, uma das parceiras particulares do projeto, devem servir como "âncoras" para vários dos pedaços do corredor, por serem relativamente grandes.
"Parando para pensar hoje, dá para ver que o café e outros ciclos de monocultura aqui no vale foram um erro, porque a vocação econômica aqui é a florestal", explica Silvio Simões, professor da Unesp. "O solo é relativamente pobre, raso e ácido, mas as espécies florestais convivem bem com isso."
A equipe do projeto diz temer que reconstituir a floresta, por si só, não seja suficiente para que ela continue ela "nos próximos 10, 50 ou 500 anos", afirma Soares. Por isso, a ideia é combinar as reservas de mata nativa com eucalipto ou outras espécies que possam ser exploradas comercialmente.
"Temos de achar uma maneira de integrar a mata às propriedades. Se ela continuar sendo uma coisa estranha, um elemento deslocado, ela vai acabar não durando", filosofa o geólogo.

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1010201001.htm

Sitiante diz ter orgulho de mata com pau-brasil da idade de neta

Do enviado a Guaratinguetá (SP)

Ana Clara, 3, já é grandinha o suficiente para caminhar por entre as árvores. Mas prefere ficar no colo da avó, Maria Helena da Silva Assis, 57, enquanto a sitiante mostra a pequena área reflorestada em sua propriedade.
"Nada crescia aqui quando eu cheguei. Na seca, o solo rachava", conta ela. Hoje, ela chama de "meu orgulho" o pau-brasil plantado junto com as outras espécies nativas, e faz questão de lembrar que a mata-bebê tem a mesma idade de sua neta.
Coincidência ou não, a falta d'água e a pobreza acentuada do solo costumam ser o destino das áreas privadas da mata atlântica original no vale do Paraíba. Sem o efeito estabilizador das árvores, a tendência é que nascentes e riachos fiquem assoreados, e que a erosão leve embora o solo naturalmente raso.
Além de ajudar a contornar esse problema, concentrando suas ações em áreas de nascentes, topos de morros e beiras de rios, o corredor ecológico tem como objetivo principal enfrentar outro problema de fragmentos isolados de floresta: eles tendem a morrer de morte lenta.
É que pedaços isolados de mata são, para todos os efeitos, ilhas. São poucas as espécies animais e vegetais que conseguem atravessar, por exemplo, um cafezal, para alcançar uma nova mancha de floresta do outro lado.
Na prática, isso induz cruzamentos apenas entre os habitantes do mesmo fragmento de floresta -os quais, com frequência, são parentes. E, assim como entre humanos, a reprodução entre primos de primeiro grau ou até irmãos facilita o aparecimento de doenças genéticas potencialmente letais.

VERBA
Por enquanto, um dos principais desafios do projeto do corredor é o dinheiro. O principal compromisso por enquanto é o da empresa Fibria, que vai apoiar o plantio de 28 mil hectares de mata nativa, junto com uma área equivalente de eucalipto em parceria com proprietários rurais da região. O projeto busca outros apoios da iniciativa privada. (RJL)

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ciencia/fe1010201003.htm

FSP, 10/10/2010, Ciência, p. A24

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