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Projeto exclui da Amazônia Legal Mato Grosso, Tocantins e Maranhão

OESP, Nacional, p. A10
22 de Abr de 2007

Projeto exclui da Amazônia Legal Mato Grosso, Tocantins e Maranhão
Se aprovado, vai permitir ampliar derrubada da floresta e regularizar áreas com desmatamento acima do permitido

Gustavo Porto

No momento em que a Organização das Nações Unidas (ONU) deflagra e lidera um debate sobre o aquecimento global e a situação climática no mundo - e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva trata as licenças ambientais como empecilho para as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) -, um projeto de lei que tramita no Senado promete esquentar ainda mais o debate no Brasil. Ele cria, ao mesmo tempo, brechas para ampliar a derrubada da floresta amazônica e para regulamentar propriedades rurais, de produção de soja ou usadas na pecuária, com desmatamento acima dos 20% permitidos pela legislação.

Estados como Mato Grosso poderão, pelo projeto, reduzir à metade a área hoje considerada de preservação ambiental. O projeto do senador Jonas Pinheiro (DEM-MT), protocolado em fevereiro e já endossado com parecer favorável da Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo do Senado, prevê uma alteração no Código Florestal para excluir áreas de Mato Grosso, Tocantins e Maranhão da Amazônia Legal.

A situação seria mais crítica em Mato Grosso, Estado que lidera o desmatamento florestal no País e concentra a maior parte da Amazônia Legal fora da Região Norte.

A transformação do projeto em lei facilitaria o serviço de regularização das áreas desmatadas, pois significaria transferir 54% da área de Mato Grosso, hoje dentro do bioma Amazônia e Amazônia Legal, para o bioma cerrado. De acordo com o Código Florestal, dos 906 mil quilômetros quadrados do território mato-grossense, 490 mil não podem ter mais que 20% de área desmatada. Os números mostram, no entanto, que o limite não é respeitado por madeireiros, pecuaristas e agricultores.

Dos 534 mil quilômetros quadrados de florestas de Mato Grosso, 37% foram derrubadas. Até o levantamento do governo federal de 2005, restavam 339 mil quilômetros quadrados, excluindo o cerrado e o Pantanal.

Como só sobraram 63% de reserva legal amazônica em Mato Grosso, seria necessário repor 17% da vegetação original para reconstituir a área legal. Se o projeto de lei for aprovado, a área de floresta intocada nessa região poderia cair de 80% da área total para, no máximo, 35%, como é no cerrado.

LIDERANÇA

Dados do Ministério do Meio Ambiente ratificam que Mato Grosso foi líder no desmatamento florestal nos últimos quatro levantamentos produzidos.

Entre agosto de 2002 e agosto de 2003, o Estado foi responsável por 41,3% - 10,4 mil quilômetros quadrados - do desmatamento no País, que foi de 25,15 mil quilômetros quadrados no total. No mesmo período de 2004 a 2005, foram desmatados 18,8 mil quilômetros quadrados, sendo que 7,14 mil (38% do total) em Mato Grosso.

O Estado concentra 98% da soja plantada na Amazônia Legal. A área total é estimada em 7 milhões de hectares pela Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).

O senador Pinheiro admite que seu projeto é polêmico, mas diz que vai defendê-lo até o final. Contestando as informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Pinheiro sustenta que 60% de Mato Grosso não pertence ao bioma Amazônia.

'Precisamos é liberar a injustiça cometida com Mato Grosso, já que 60% de Mato Grosso já é cerrado e está engessado', afirmou Pinheiro, ao atacar a legislação atual. 'Queremos que o bioma cerrado seja considerado e Mato Grosso se enquadraria, assim como Goiás e Mato Grosso do Sul', justificou o senador, defendendo seu projeto.

Pinheiro discorda dos argumentos de que o projeto abre brechas para ampliar o desmatamento e regularizar a situação fundiária. Segundo ele, a Medida Provisória 2.166, de 2001, que ainda não foi votada, já prevê essa regularização.

'A MP vai respeitar o direito adquirido dos proprietários. Ou uma ou outra vão ter de sair. A que for primeiro vai ajudar o Brasil', concluiu Pinheiro, que considera uma injustiça o fato de Mato Grosso ter sido incluído na Amazônia Legal para que benefícios fiscais fossem concedidos após a divisão do Estado e a criação de Mato Grosso do Sul.

Iniciativa é alvo de críticas até de ruralistas
Para secretário de Biodiversidade e Florestas, mudança iria contra mapeamento dos biomas

A tramitação do projeto de autoria do senador Jonas Pinheiro (DEM-MT) começou a provocar reações contrárias no Ministério do Meio Ambiente e em outros setores políticos do País - até mesmo naqueles tradicionalmente ligados aos interesses dos ruralistas.

'Esse projeto foi mal recebido, num momento em que se estudam medidas para controlar o desmatamento e a sociedade trabalha para reduzi-lo', reagiu o secretário de Biodiversidade e Florestas, João Paulo Capobianco. 'A proposta caminha na direção oposta à do governo', acrescentou.

O secretário de Biodiversidade questionou inclusive a legalidade do projeto, argumentando que ele fere o novo mapeamento dos biomas brasileiros, de 2004, que ratifica, entre outros tópicos, a parte de Mato Grosso na Amazônia Legal inserida dentro do bioma Amazônia. 'Seria preciso um novo ajuste na legislação, já que, além do Código Florestal, o mapa oficial dos biomas determina a preservação de 80% da área. Não poderia, por exemplo, descolar Mato Grosso do Pará, pois seria inconstitucional', concluiu Capobianco.

RECUPERAÇÃO

Por meio de sua assessoria, o ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, explicou que 'a visão do ministério é de que toda a expansão da agricultura brasileira deva ser feita por aumento de produtividade ou recuperação de área degradada pelas pastagens'. Em franca discordância com o projeto do senador do DEM, Stephanes completou: 'Não há, portanto, a necessidade de se derrubar matas para a agricultura.'

Até mesmo o deputado Homero Pereira (PR-MT), que é presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso - antigo defensor da exclusão de seu Estado da Amazônia Legal - diz ter mudado sua posição sobre o tema.

'A posição do senador Jonas Pinheiro é legítima, mas nesse momento, em que se discute o aquecimento global, a situação deve ser contrária', comenta Pereira. Ele sugere que, em vez de excluir Mato Grosso da área da Amazônia Legal, se busque alguma maneira de valorizar o ativo ambiental, 'de forma a que os produtores possam receber pela preservação'.

OESP, 22/04/2007, Nacional, p. A10

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