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Projeto: desmilitarizar Alcântara

OESP, Vida, p. A19
21 de Jul de 2005

Projeto: desmilitarizar Alcântara
Presidente da Agência Espacial Brasileira anuncia que quer mudar o nome da base e, sobretudo, abri-la aos civis

Cristina Amorim

A Base de Lançamento de Alcântara pode ter o perfil militar que a caracteriza amenizado hoje e abrir caminho para uma presença civil maciça se os planos do presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Sérgio Gaudenzi, se concretizarem. Ele deseja reformar a base, hoje isolada no interior do Maranhão, para levar funcionários, acadêmicos, empresários e - por que não? - turistas até lá.
O projeto é orçado em R$ 600 milhões divididos em cinco anos. Uma licitação deve ser lançada em agosto, com o aval do Tribunal de Contas da União, para que os primeiros canteiros de obras sejam montados no fim do ano. "É preciso dar um caráter civil à base, que vai se chamar Centro Espacial de Alcântara, para estimular a entrada de qualquer pessoa, e separar as duas áreas, a civil da militar", disse Gaudenzi ontem, na 57ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), em Fortaleza.
O plano prevê a construção de casas, hospital, escola, bancos, uma barragem, um sistema de tratamento de resíduos sólidos e estradas - o necessário para fornecer uma estrutura básica para os moradores, que Gaudenzi espera chegar a 15 mil. Também deseja instalar campus avançados de universidades e órgãos como o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) em Alcântara. O modelo é o centro espacial de Kourou, na Guiana Francesa, que tem receita de US$ 600 milhões por ano, após 20 anos de investimento na construção civil.
Hoje, os funcionários da base se deslocam diariamente da capital, São Luís, de barco até Alcântara - variações na maré podem fazer que o local seja aberto por apenas uma hora e meia num dia. "Hoje em dia quem vai para Alcântara vê isso como castigo. A mulher do funcionário não quer ir. O filho, então, acha um horror", disse.
Até o acidente em 2003, quando 21 técnicos morreram durante a preparação para lançamento do foguete VLS-1, a Aeronáutica era responsável pela administração da base. A transformação do nome de "base de lançamento" para "centro espacial" é parte da tentativa de mudar o foco de Alcântara.
Hoje, a área total destinada à base é de 620 quilômetros quadrados. A idéia é retornar mais da metade deste terreno à população de Alcântara - que foi afastada do campo de lançamento -, mantendo o corpo militar dentro apenas do trecho onde realmente ele atua - cerca de 10% do terreno total. "Sair da idéia de base militar é também garantir o direito constitucional da população", afirmou Gaudenzi.
FÔLEGO
Gaudenzi também divulgou algumas das mudanças previstas no novo Programa Nacional de Atividades Espaciais (Pnae), aprovado em fevereiro pelo conselho da AEB. A proposta orçamentária para 2006 é de US$ 200 milhões, o dobro do orçamento de 2005. Ele disse que, por mais que exista pressão por cortes por parte do Ministério do Planejamento, o valor será mantido. "Se resolverem cortar (o orçamento), a responsabilidade será deles."
Tal responsabilidade pode custar mais do que o valor de investimento. A redução do orçamento espacial desde o fim da década de 90 é apontado por especialistas como um dos facilitadores do acidente. Órgãos diretamente envolvidos no programa, Inpe e Centro Técnico Aeroespacial (CTA), têm visto seu quadro pessoal se esvaziando nos últimos anos com o deslocamento de profissionais especializados para outras empresas, que pagam salários maiores.
"Todas as ações não serão tocadas para a frente, de jeito nenhum, se a questão de recursos humanos não for resolvida", alertou José Raimundo Braga Coelho, da SBPC. "A própria agência espacial precisa ter um corpo técnico para não perder terreno em negociações."
NOVO QUADRO
A SBPC divulgou ontem a nova diretoria para o biênio 2005-2007, com a reeleição do físico Ennio Candotti para a presidência. Segundo ele, é preciso pressionar o governo para que todo o orçamento destinado à ciência e tecnologia seja aplicado na totalidade e não tenha parte devolvida no fim do ano para a União. "Até agora, apenas um terço foi liquidado", afirmou.

Vôo de astronauta pode custar US$ 15 mi
Passagem Espacial: Mandar o astronauta brasileiro, o tenente-coronel Marcos Pontes, para o espaço pode custar de US$ 12 milhões a US$ 15 milhões ao governo, disse ontem o presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB), Sérgio Gaudenzi, na reunião da SBPC.
Segundo ele, o valor foi obtido após negociações com a agência russa - que normalmente cobra US$ 20 milhões para turistas espaciais que desejem ir à Estação Espacial Internacional (ISS) - e espera que empresas, como a Petrobrás, possam ajudar no patrocínio da viagem. "Um dos experimentos que Pontes levará para o espaço é da empresa. Ele pode ser um ótimo garoto-propaganda com o logotipo no macacão." O astronauta poderá levar consigo até 15 quilos de experimentos e trazer outros 5 quilos de volta à Terra.
Pontes mora hoje nos Estados Unidos e espera por uma oportunidade de ir ao espaço. Sua viagem faria parte do acordo fechado em 1997 entre Brasil e a agência espacial americana (Nasa) de US$ 120 milhões, que previa o fornecimento pelo País de seis peças e componentes para a ISS. Após diversas negociações, a participação brasileira caiu para US$ 8 milhões e a entrega de apenas um tipo de componente, cujo protótipo é hoje desenvolvido pelo Senai. A degradação do acordo entre os dois países comprometeu o envio de Pontes ao espaço.
Gaudenzi espera que o problema seja resolvido em breve, com a ida do astronauta para a ISS entre abril e maio de 2006, quando acontece a comemoração do centenário do vôo de Santos Dumont com o 14-Bis, em Paris.

OESP, 21/07/2005, Vida, p. A19

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