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Professor Kaxinawá lança livro na Feira Internacional de Genebra

Página 20-Rio Branco-AC
Autor: Rose Farias
08 de Mai de 2002

História do povo verdadeiro - professor indígena Kaxinawá lança livro sobre a história dos antepassados na Feira Internacional de Genebra
Eles habitam a região entre o Brasil e o Peru, desde do leste peruano até o Acre, vivendo em 12 terras indígenas localizadas no rio Purus e afluentes do rio Juruá, formando uma população de 4 mil índios.
Os Kaxinawá, Huni Kuî, que significa "gente verdadeira", ao longo dos anos estão mergulhados num rico projeto que envolve o resgate de sua tradição cultural.
Os Huni Kuî abraçam esse projeto, em que um dos motes principais está calcado na educação indígena. Segundo dados da Comissão Pró-Índio, que desde 1983 vem realizando projetos na área com os Kaxinawá, nas 12 terras indígenas existe uma escola em funcionamento, tendo à frente um ou mais professores indígenas, agentes de saúde e agroflorestais. Outro dado importante é que hoje, somente entre os Huni Kuî, existem 66 professores, 46 agentes agroflorestais e mais de 50 agentes de saúde.
Todo o trabalho que vem sendo desenvolvido pelos kaxinawá tem como propósito reunir conhecimentos sobre educação, saúde, meio ambiente e outros, para o enriquecimento das tradições já existentes.
O trabalho desenvolvido junto aos Kaxinawá tem à frente a Comissão Pró-Índio, que desde da década de 70, vem atuando na área, como articuladora dos projetos. A coordenadora da organização Nietta Lindenberg diz que todo o trabalho desenvolvido junto aos Kaxinawá, está relacionado aos aspectos políticos-educacionais e ambientais, que tem como grandes parceiros a Secretaria de Educação do Acre, Ministério do Meio Ambiente, Ministério de Educação, Fundação Nacional do Índio, Funasa e outros.
Experiência que deu certo
Foi em 1983 que a Comissão Pró-Índio deu o pontapé inicial no projeto educacional, batizado como 'Uma Experiência de Autoria' que, segundo a organização, culminou com a formação profissional para o magistério bilíngue de jovens índios. Esse grande início veio abrir caminhos para a implantação de uma política educacional indígena.
Hoje, quase 20 anos depois, o resultado desse ousado projeto ganha o mundo, em livro. A publicação intitulada Huni Kuînê Miyui representou os povos indígenas do Acre na Feira Internacional do Livro em Genebra, do último dia 1 a 6.
O livro, com tiragem de 5.000 exemplares, tem ilustrações de desenhos criados pelos Huni Kunî e edição trilingue: francês, português e kaxinawá; traz a pesquisa sobre a história dos antepassados, realizada há dozes anos por um grupo de professores kaxinawá, coordenados por Joaquim Paula Mana Kaxinawá, professor indígena há 19 anos. Todo o material contido na publicação, em sua primeira etapa, faz parte de gravações feitas com os velhos em Terras Indígenas Kaxinawá do Brasil e Peru.
Trabalho reconhecido
Essa não é a primeira publicação coordenada pelo professor indígena Joaquim Mana; existem outras publicações, como as cartilhas, que circulam nas escolas indígenas, ligadas a alfabetização, geografia e outros assuntos.
Como professor, Joaquim Mana analisa sua trajetória frente à educação indígena como uma conquista, culminando com a participação de todo o trabalho elaborado pela sua etnia, com o apoio da Comissão Pró-Índio, Ministério, Organização dos Professores Indígenas do Acre e Ministério da Educação na Feira Internacional do Livro. "Acredito que é um trabalho que está sendo feito e reconhecido. Esse é um dos livros que foi editado pelo Ministério da Educação; antes, foram feitos por meio de projetos elaborados pela CPI. E agora, todo esse trabalho ganhou o reconhecimento. Vejo que um bom trabalho, que está sendo feito pela gente está representando o Brasil, através um projeto que vem sendo elaborado desde 83, que vai servir de exemplo para que outros povos indígenas desenvolvam os seus, suas pesquisas", discorre o professor.
Além do livro Huni Kuînê Miyui, Joaquim Mana participou da feira com outras publicações e com pequena mostra do artesanato indígena Kaxinawá, feito de algodão confeccionados pelas mãos hábeis das mulheres Kaxinawá.
Histórias dos antepassados
A primeira versão com as histórias dos antepassados foi publicada em 1995 nas escolas indígenas Kaxinawá, com o apoio da CPI, Unicef e o Ministério da Educação. Em 2000, a Universidade Federal de Minas Gerais, com o objetivo de difundir o trabalho dos Huni Kunî, ampliando o acesso a um público maior, publicou a segunda edição.
Mana Kaxinawá conta como se deu o desenvolvimento desse trabalho até chegar ao produto final que é o livro. "Essas histórias foram tiradas da gravação em língua Hãtxa Kuî, uma das nove línguas da família Pano, que tem no Acre. Esse é um material que vem sendo feito não apenas pelos kaxinawá, mas várias etnias do Acre, com o propósito dos povos indígenas manterem a sua língua e valorizar a sua cultura tradicional, a história oral. Também valorizando os velhos, porque os velhos que sabem contar as histórias dois antepassados", comenta o professor Joaquim.
Ele relata que quando os primeiros professores tiveram o aprendizado da escrita é que foi feito o primeiro material centrado na alfabetização indígena; em seguida, foi realizada uma pesquisa envolvendo todos os professores, que resultou na primeira versão de Histórias dos Antepassados, intitulada Shenipabu Miyui.
Huni Kuîne Miyui, além das tradicionais histórias, lendas e mitos indígenas, servirá, segundo conta Joaquim Kaxinawá, como um registro da história oral. "Pensamos que o livro servirá para manter a história oral em termos de registro escrito. É uma história do nosso povo, que fala muito da situação dos animais, das plantas, como era que o nosso povo sobrevivia, a relação dos animais entre nosso povo. A gente percebe que quando os velhos vão morrendo a nossa história vai se acabando", diz Joaquim Kaxinawá.
A idéia, como relata Joaquim Mana, era de que os próprios professores e pesquisadores fizessem as suas pesquisas, do seu povo, aldeia, música, planta e sua convivência. A pesquisa contou com a colaboração de alunos da escola Kaxinawá da T.I Carapanã, onde os jovens se envolveram na escuta das narrativas e na criação dos desenhos.
"Esses são um dos trabalhos que fiz com meus alunos, envolvendo as histórias contadas por um dos mais antigos narradores, Hermidio Peres Kaxinawá. Ele passou a contar as histórias para mim, gravei tudo e depois fiz a transcrição envolvendo os alunos na elaboração dos desenhos, das histórias, como é que conta. Foi uma tarefa nossa", relata Mana.

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