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Produtos 'verdes' esbarram no preço

OESP, Economia, p. B9
02 de Ago de 2015

Produtos 'verdes' esbarram no preço
Apesar de maioria dos brasileiros estar disposta a pagar mais por esses produtos, mercado de itens certificados no País ainda é restrito

Natália Cacioli - O Estado de S. Paulo

Da madeira que reveste o piso e estrutura o telhado à embalagem do leite servido quente com café: a responsabilidade do consumidor em proteger o meio ambiente está presente em pequenas decisões do dia a dia, mas faltam engajamento e informação para transformar o discurso ambiental em uma prática, de fato, sustentável.
A parcela da população afinada com o discurso do consumo consciente diz estar disposta a dar sua contribuição para salvar o planeta. Entre os brasileiros, 59% se dizem dispostos a pagar mais por um produto verde, mas na hora de investir tempo ou dinheiro, esse número cai para 22%. Na média de 11 países, esse engajamento é de 52%, segundo estudo da FSC.
A FSC é uma organização não-governamental presente em mais de 70 países. Com mais de uma centena de critérios ambientais e sociais, certifica boas práticas na produção de madeira e extrativismo em florestas plantadas e nativas.
"Estar disposto é um passo importante, mas o Brasil ainda não é um mercado pronto para pagar o custo social e ambiental que as cadeias verdes internalizam", diz a diretora executiva do FSC Brasil, Fabíola Zerbini.
Ter a certeza de que um produto comprado não é fruto de desmatamento e que a empresa cumpriu a legislação trabalhista tem seu custo, por mais básicos que sejam esses preceitos. Só a maior oferta e concorrência são capazes de ajustar os preços. É o caso do setor de papel e celulose no Brasil, que tem aproximadamente 65% das florestas certificadas pela FSC.
Segundo Fabiola, como a certificação na cadeia de produção de papel e celulose é ampla, os produtos são oferecidos em larga escala por várias empresas, o que torna o custo imperceptível para os consumidores.
Líder na fabricação de papéis e embalagens no Brasil, a Klabin foi a primeira empresa da América Latina a receber o selo FSC, em 1998. Com forte presença no mercado, passou a apoiar a certificação de seus fornecedores. Em um dos projetos voltados para conscientização ambiental, a empresa apoiou a certificação de 42 pequenos produtores rurais no Paraná - e quer expandir essa prática.
"Trabalhamos para que os pequenos proprietários percebam a importância das áreas de preservação permanente", diz Ivone Satsuki Namikawa, coordenadora de sustentabilidade da Klabin.
Embora grandes empresas sejam capazes de influenciar as cadeias produtivas no Brasil, elas também sofrem pressão de outros países ao exportar seus produtos. A indústria do café, por exemplo, enfrenta este problema.
O volume de café arábica certificado no Brasil pelo selo Rainforest Alliance chegou a 8% do total produzido em 2014 e, em cinco anos, a área plantada de café certificado cresceu 2,5 vezes.
Segundo Maurício Voivodic, secretário executivo do Imaflora, instituto brasileiro de certificação florestal e agrícola, a demanda no Brasil também é crescente. "O consumidor está mais atento e as empresas querem associar suas marcas a práticas ambientalmente corretas". Segundo a Imaflora, McDonald's, Três Corações, Nespresso e Café do Centro são marcas que estão expandindo a demanda por café certificado no País.
A reclamação mais recorrente dos produtores certificados é que os consumidores não conhecem os benefícios do selo e, por isso, não se mostram dispostos a pagar por ele. O diretor de sustentabilidade do Carrefour, Paulo Pianez, diz que os grandes varejistas têm um papel a cumprir na mudança deste quadro: "Uma grande rede funciona como ponte entre o produtor e o consumidor."
Preço justo. Segundo Pianez, o consumidor busca qualidade, segurança e preço justo. "Agora, além disso, vou informá-lo que aquele produto não fez mal ao planeta", explica.
Em 2012, o Carrefour iniciou no Brasil a venda inédita de cortes de carne certificada pela Rainforest Alliance, em uma iniciativa única no mundo. São 136 critérios que, além de garantir a procedência da carne, impedem o desmatamento ilegal e controlam as emissões de gás carbônico. Mesmo com um preço maior - a carne está classificada no segmento premium -, as vendas são um sucesso. Inicialmente oferecidas em 13 lojas, os cortes estão atualmente disponíveis em todo o País.
Essa certificação foi concedida para apenas cinco fazendas de um produtor no Mato Grosso. No entanto, o Carrefour incentiva boas práticas ambientais e sociais com o selo "Garantia de Origem".
"É importante que o consumidor nos pressione, pois isso faz com que toda a cadeia se movimente", diz Pianez. "Suponho que muito em breve não haverá mais espaço para produtos que não preservem o meio ambiente e não proporcionem condições sociais decentes".

Desmate ilegal impede avanço da certificação
Área certificada da Amazônia não cresce desde 2007; cobrança de selo de origem deve partir do consumidor

Natália Cacioli - O Estado de S. Paulo

Cristiano Valle é um empresário paulista que cresceu numa época em que o progresso da Amazônia era associado ao desmate para plantar ou criar gado - floresta em pé não podia dar dinheiro. Mais velho e cansado de ver a floresta cair, ele criou, em 2003, a Tora Brasil, uma loja de móveis que usa madeira legal retirada da Amazônia.
O objetivo principal é explorar os recursos da floresta para preservá-la. Com uma técnica chamada manejo florestal, é feito um corte seletivo que respeita o ciclo de vida da floresta, que leva pode levar mais de 30 anos.
Cristiano compra madeira de produtores que fazem o manejo e também aproveita árvores ocas, que seriam desprezadas nas serrarias.
O manejo florestal poderia ser utilizado para aproveitar todo o potencial econômico da Amazônia, mas a concorrência desleal com madeireiros ilegais e burocracia excessiva afastam empresários.
Proprietário da Ecolog, empresa que fabrica madeira para móveis e construção civil, Fabio de Albuquerque faz manejo florestal em uma área de 30 mil hectares em Rondônia. Há dois eles, ele está com a produção parada e o estoque, cheio. "Meu preço pode ser 10% ou 20% maior porque eu preservei a mata, os rios, paguei todos os impostos", diz. "Não consigo competir com o ilegal que não faz nada disso".
Com tantos problemas, a certificação de manejo florestal da FSC está praticamente estagnada desde 2007, atualmente com uma área de 1,4 milhão de hectares. E, somente no ano passado, o desmatamento na Amazônia Legal foi equivalente a um terço dessa área.
Mas esses produtores são movidos por ideologia. Segundo a FSC, o principal motivo que leva à certificação dessas empresas são os princípios pessoais (56%). E o que eles mais pedem é o reconhecimento pelo trabalho que fazem: para 67%, a maior desvantagem é o desconhecimento das pessoas sobre o valor social e ambiental da certificação, e não a concorrência desleal e a falta de fiscalização.
Para Albuquerque, conter o desmatamento depende mais da cobrança dos consumidores do que de políticas públicas. Valle concorda: "Faço esse trabalho porque quero deitar minha cabeça no travesseiro sem culpa." Segundo ele, isso só irá acontecer no dia em que não aparecerem clientes pedindo para comprar móvel sem nota fiscal.

OESP, 02/08/2015, Economia, p. B9

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