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Produtor de soja adere à pecuária em MT

FSP, Agrofolha, p. B6
01 de Jan de 2008

Produtor de soja adere à pecuária em MT
Em busca da industrialização da matéria-prima na própria região, sojicultor adere a biodiesel e a confinamento de gado
Adoção da integração lavoura-pecuária aumenta rentabilidade do agricultor e do pecuarista e pode elevar a produção de carne em 40%

Mauro Zafalon
Enviado especial a Nova Mutum (MT)

Se irlandeses já estão preocupados com a força do Brasil na produção de carnes, devem se preocupar ainda mais daqui para a frente. O perfil dos produtores brasileiros começa a mudar rapidamente nas principais áreas de produção. Pecuaristas estão descobrindo a produção de grãos, e os produtores de grãos estão adotando a pecuária. Em alguns casos, além da certificação do gado, os produtores chegam ao requinte de certificar a soja, o milho e o algodão que vão ser usados na ração dos animais. E essa certificação é dada pelos próprios organismos europeus.
Para economizar nos combustíveis, que têm grande peso na composição anual de gastos, os agricultores estão partindo para a produção de biodiesel. Essa produção gera uma série de subprodutos, utilizados na produção de alimentos para animais. Com isso, os produtores agregam a produção de biodiesel às suas propriedades para diminuir os custos e, ao mesmo tempo, começam a verticalizar a produção da fazenda. O agricultor Cirilo Ferst é o mais recente adepto dessa mudança. Produtor de soja em uma área de 6.000 hectares em Nova Mutum (MT), Ferst já tem financiamento bancário para iniciar seu projeto de confinamento de gado. Em um segundo estágio, parte para a produção de suínos.
O agricultor vai aproveitar as sobras de uma fábrica de biodiesel, capaz de abastecer 10% de seus gastos anuais de 400 mil litros de diesel, além dos subprodutos gerados pelo secador que tem na propriedade. Um projeto mais ousado é o da Vanguarda do Brasil, também de Nova Mutum. Com 200 mil hectares plantados anualmente com soja, milho, algodão e arroz, a empresa deve confinar 180 mil animais em dois ciclos no próximo ano. A Vanguarda já está na produção de suínos na região.
A empresa, que já tem contratos especiais de venda, tanto para os grãos como para as carnes, o que lhe rende um preço acima do de mercado, parte para a rastreabilidade total. Marlon Buss, vice-presidente da Vanguarda, diz que "a empresa tem um projeto pé no chão". Terá 20 mil vacas para gerar os bezerros e, além da rastreabilidade dos animais, contará também com soja, milho e algodão certificados -produtos básicos na alimentação do gado. A empresa só produz grãos convencionais.
"A pecuária só se viabilizará com o confinamento", diz Armindo Kichel, da Embrapa Gado de Corte. Segundo ele, vários projetos estão se consolidando nas novas áreas de produção de grãos, como Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A integração lavoura-pecuária é essencial para o ganho de produtividade de ambos, pecuaristas e produtores agrícolas, na avaliação de Kichel.
"Todo sojicultor tem terras adequadas para a produção de gado de corte e de leite, mas nem todos os pecuaristas têm terras ideais para a produção de grãos." Mesmo assim, o pecuarista deve fazer uma integração pasto-lavoura nas áreas de melhor qualidade, segundo o pesquisador da Embrapa.

Alta lucratividade
Os resultados são evidentes, segundo Kichel. Os pecuaristas que fazem a integração podem ter lucratividade de até 300%. Já os produtores de grãos que incorporam a pecuária têm ganhos de 100%.
Agricultores e pecuaristas que ainda não optaram por esse sistema desconhecem a tecnologia ou não sabem quanto estão perdendo. Se os agricultores vêem na pecuária uma saída, entre os pecuaristas apenas os mais profissionais estão descobrindo a lavoura, segundo Kichel. Ele avalia que essa integração deverá elevar em 40% a produção de carne no Brasil nos próximos anos. O avanço da produção de carne em Mato Grosso fica evidente com o interesse das grandes empresas em se instalar na região. A grande escala na produção de alimentos atrai a atenção de Perdigão, Sadia, Bertin e JBS-Friboi, diz Buss.
Juscelino Jankoski, da Rural Consultoria, de Nova Mutum, diz que o confinamento e o semiconfinamento devem crescer, mas por ora se limitam aos produtores que têm infra-estrutura nas fazendas e que processam soja, milho e algodão. A Mutum Agropecuária também acredita na eficiência da integração lavoura e pecuária. Para aproveitar melhor o rendimento dos dois setores, Locenil Aparecido da Silva diz que a empresa está iniciando um novo projeto de integração.
José Ferreira de Andrade, do departamento comercial da Fazenda Tauá, afirma que a verticalização é fundamental hoje e que as empresas devem aproveitar a matéria-prima para uma industrialização na região. A Tauá está iniciando um projeto de produção de farinha de soja e de óleo de soja para consumo humano, além de destinar parte desses produtos também para ração animal. A empresa está industrializando também o milho, produzindo amido para exportações para a Europa e a África. "As exportações são possíveis porque estamos produzindo tudo plenamente adequado às normas internacionais", diz Andrade. Os subprodutos vão atualmente para rações destinadas a suínos e avicultura. Quanto ao confinamento, está no projeto da empresa, mas em dois anos.
Os jornalistas Mauro Zafalon e Luiz Carlos Murauskas viajaram a convite da Case (máquinas agrícolas).

Boa safra e preço elevado ainda não tranqüilizam sojicultor

Do enviado especial à Nova Mutum

O carro roda por horas e a paisagem não muda: soja nos dois lados da estrada. É o cenário do chamado médio norte de Mato Grosso. Apesar do atraso no período de plantio, o ânimo dos produtores é bom com a possível produção deste ano.
As notícias que vêm de fora também são boas. Chicago, a meca formadora de preços, indica os maiores valores praticados em três décadas.
Tudo parece perfeito. Mas há apreensão no campo. A safra é boa, os preços também, mas a rentabilidade pode não ser.
"A soja está sendo paga por um dólar fraco e estamos pagando os custos internos por um real valorizado", diz Cirilo Ferst, que planta 6.000 hectares em Nova Mutum (MT).
Enquanto toma o café da manhã, Ferst interrompe a conversa para buscar uma calculadora e rapidamente começa a mostrar os perigos para os que não se cuidarem.
A soja está a US$ 17 a saca, um preço bom, diz ele, mas a maioria dos contratos foram feitos a US$ 11 a US$ 12.
A soja a esse preço puxa todos os custos para cima. A tonelada de adubo saiu de US$ 287, foi a US$ 380 e já há negócios a US$ 480. O frete para Paranaguá (PR), de US$ 70 por tonelada em 2006, está em US$ 110.
Com produção de 50 a 55 sacas por hectare, o produtor pode ter um lucro de 10 a 15 sacas, já que os custos ficam em 40 sacas, mas tem de aprender a fazer muitas contas, segundo ele.
Sobre dívidas passadas, Ferst diz: "Me cuidei nas compras e as dívidas não são comprometedoras". Mesmo assim, conta que comprou uma colheitadeira por R$ 700 mil em 2003, pagou metade e ainda deve R$ 800 mil. O pior é que a máquina vale apenas R$ 350 mil.
Assim como Ferst, Marlon Buss, da Vanguarda do Brasil, também está atento aos números. "Sou viciado em números e custos", diz. Para reduzir custos, trocou as camionetas do grupo por carros populares, não comprou máquinas em 2005 e 2006, apenas arrendou, assim como faz com a terra.
Dos 200 mil hectares plantados, só 40% são do grupo, que faz duas safras em 80% da área.
Para ele, a informação é o ponto forte. O grupo levanta custos de tudo: de gastos de tratores a diferenças de retornos entre a utilização de terra arrendada ou própria -esta demora 18 anos para ser paga com a renda da produção. "O que interessa é resultado financeiro, e não faturamento", diz
Em uma coisa Buss diz não economizar: na qualidade dos produtos. Com isso, consegue contratos especiais, como o da soja convencional, que rende até US$ 1,4 a mais por saca.
O engenheiro agrônomo Juscelino Jankoski, da Rural Consultoria, também de Nova Mutum, diz que as perspectivas para 2007/8 são boas, mas, se o produtor fizer todas as contas, desiste de plantar soja.
Nelson Vacari, da Araguaia Agrícola, confirma a situação difícil. Parte dos produtores -os que têm dívidas a saldar- não consegue crédito.

FSP, 01/01/2008, Agrofolha, p. B6

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