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Procurador quer anular doações de terra no Amazonas

A Crítica-Manaus-AM
26 de Nov de 2002

O procurador da República do Ministério Público Federal (MPF), Franklin Rodrigues, chegou ontem a Manaus com o objetivo de pressionar o Governo do Estado a rescindir um contrato de doação de terras a 27 empresários paulistas, sob pena de o governador do Estado, Amazonino Mendes, sofrer processo de improbidade administrativa. Entre as penalidades previstas, o governador poderá ser proibido de assumir qualquer cargo público no período de cinco a oito anos, assim como suas empresas também ficam impossibilitadas de prestar serviço para o Estado. O prazo para anulação dos contratos vence no dia 30 de dezembro próximo.

Nomes como o de Chiquinho Scarpa, dos advogados Fernando e Sérgio Vergueiro e da família de Antônio Fleury de Camargo constam na lista de empresários beneficiados. Ao todo, 150 lotes, medindo três mil hectares cada, foram doados entre 1969 e 1971. Hoje, a maioria das terras estão submersas, na área onde funciona a usina de Balbina e por isso, os empresários exigem uma indenização do Estado no valor de R$ 450 milhões.

Para o procurador da República, nem tudo é lícito nessa transação, já que as doações se concretizaram seis meses antes do surgimento da usina elétrica, o que sugere uma trama. "É contra essa falcatrua que o Ministério Público Federal está aqui", afirma Rodrigues. Entre os agravantes apresentados, o procurador lembra que os empresários nunca realizaram as benfeitorias na área, exigidas em cláusula no contrato, fato que anularia a indenização. Outro fato é a suspeita das terras serem reserva indígena, acrescenta.

O procurador explica que veio pessoalmente acompanhar em que fase está o procedimento aberto pelo Estado do Amazonas por recomendação do próprio MPF, cobrando a rescisão. Rodrigues informa que a Procuradoria Regional da República da 1ª região tem trabalhado em parceria com o procurador da República do Amazonas, Sérgio Lauria.

O Estado só tem a ganhar com a rescisão, esclarece Rodrigues, dizendo que para o MPF seria aceitável que cerca de meio milhão de reais fossem aplicados no Amazonas. "O MPF não se opõe a que esse dinheiro venha para o Amazonas, mas se o Estado não levar esses processos a termo, pelo menos até 30 de dezembro, o governador Amazonino Mendes deve sofrer uma ação de improbidade administrativa." Em último caso, Rodrigues avisa que até mesmo o Estado pode deixar de usufruir desse dinheiro se for comprovado que a área doada realmente pertencia a reserva indígena. "Nessa situação, o Estado não poderia lotear e doar em hipótese alguma para terceiros."

Inicialmente, Rodrigues revela que o MPF tem noção de que a negociação foi fraudulenta, depois ele menciona sobre favorecimento. "Temos uma planta feita pelo Incra em 1986. Os 150 lotes eram cortados tanto pelo rio Uatumã quanto o Pitinga."

Governo afirma que está investigando

As providências para resolver a questão da indenização requerida por empresários paulistas sobre as terras que foram alagadas com a construção de hidrelétrica de Balbina, pela Eletronorte, no início da década de 70, foram adotadas pelo Governo do Estado tão logo ele tomou conhecimento das recomendações da Procuradoria da República, segundo provou ontem, com documentos, o procurador geral do Estado, Jorge Henrique Pinho. Em 2 de janeiro deste ano, o governador criou, por meio do decreto 22.499, uma comissão especial para apurar os fatos e subsidiar as ações da Procuradoria Geral do Estado (PGE).

A comissão, presidida pelo diretor-presidente da Superintendência de Habitação do Estado (Suhab), Paulo Fiúza, é formada também pelo engenheiro Rozemar Tavares da Silva e pelo topógrafo Pedro Moura dos Santos, sob a fiscalização da PGE. O prazo para o final dos trabalhos era de seis meses, mas como não foi possível concluir o levantamento, foi feito novo decreto, em 5 de agosto, com data retroativa a 2 de julho, prorrogando o prazo para 2 de janeiro de 2003.

O não-cumprimento do prazo inicial deveu-se à complexidade da matéria, explicou Jorge Pinho. Foi preciso reconstituir os fatos ocorridos há três décadas, em região extensa, envolvendo 69 imóveis, com inúmeros proprietários interessados, além da necessidade de conceder o direito de defesa, conforme a recomendação do Ministério Público Federal, argumentou o procurador geral do Estado.

Segundo Jorge Pinho, a questão da indenização de Balbina é bastante complexa e começou com a proposta de ações expropriatórias, em que a própria Eletronorte indicava como proprietários os empresários paulistas que haviam comprado lotes de terra do Estado do Amazonas para exploração agropecuária, na década de 70, mais de dez anos antes da inundação do lago da hidrelétrica.

As expropriações foram julgadas pela Justiça Federal da 1ª Região, chegando aos valores astronômicos anunciados pela Eletronorte nos jornais de grande circulação, relembrou o procurador. "Julgadas as decisões e chegada a fase de pagamento, a Eletronorte acredita que as indenizações sejam devidas ao Estado do Amazonas e não aos empresários paulistas", relatou Pinho.

Todavia, ele acrescentou que o Estado precisa do resultado dos trabalhos da comissão especial instituída pelo governador Amazonino Mendes, para poder avaliar as providências necessárias ao recebimento das indenizações. Ontem, com a chegada a Manaus do procurador geral da República, Franklin da Costa, para se inteirar dos procedimentos que estão sendo adotados pelo Governo do Estado, a comissão foi reforçada com a presença de técnicos da Eletronorte e do Ministério Público.

Franklin da Costa disse, ontem, que a concessão do território aos empresários foi ilegal, pois o local era uma reserva ambiental e indígena, habitada pelos Waimiri/Atroari e protegida por lei federal. "Por outro lado, os empresários tinham o compromisso de promover melhorias econômicas e sociais na região, o que não fizeram", atestou.

Na opinião do diretor-presidente da Suhab, Paulo Fiúza, as terras cedidas aos empresários paulistas devem voltar ao controle do Governo do Amazonas. "Existe uma lei estadual que prevê a desapropriação de terrenos doados de modo duvidoso, ou cujos proprietários não tenham feito as benfeitorias contratadas", frisou.

Segundo Fiúza, o Governo do Amazonas já realizou um estudo que comprovou o abandono das terras, por isso está chamando os empresários para fazer a rescisão dos contratos de concessão dos terrenos. "Os empresários não cumpriram a lei estadual e o Governo do Amazonas, com apoio do Ministério Público, vai pedir a reintegração de posse da área", concluiu o diretor da Suhab.

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