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Procurador contra lei gaúcha

CB, Política, p. 8
10 de Mai de 2008

Procurador contra lei gaúcha
Ministério Público aponta que autoridades do Rio Grande do Sul têm se utilizado apenas de "autorização" para implantar projetos sem licenciamento ambiental regular

Lúcio Vaz
Da equipe do Correio

O procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, entrou com ação direta de inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra uma lei do Rio Grande do Sul que permite a implantação de projetos com impacto ambiental significativo baseado apenas numa "autorização". O procurador-geral sustenta que as autoridades públicas gaúchas têm interpretado que a inclusão do termo "autorização" entre os instrumentos de política estadual do meio ambiente permite a implantação de projetos sem licenciamento ambiental regular.
Uma séria de reportagens publicadas pelo Correio nesta semana mostrou a expansão de florestas de eucaliptos na metade sul do Rio Grande do Sul, com atropelo das leis ambientais do país. O governo de Yeda Crusius (PSDB) acelerou os processos de licenciamento e aprovou um zoneamento ambiental que não impõe restrições às indústrias produtoras de celulose (Aracruz, Votorantim e Stora Enso), segundo interpretação do Ministério Público Federal e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama).
Segundo análise de Antonio Fernando, "a política estritamente empresarial, que, traçada na aquisição de volumosa porção de terras do estado do Rio Grande do Sul por empresas dedicadas à comercialização de madeira e seus produtos (papel e celulose), dá-se ao largo do devido controle público, passando longe de se harmonizar com as exigências constitucionais de proteção ao meio ambiente. À revelia de qualquer deliberação em que se ordenasse os quadrantes para cada espécie de exploração, áreas extensas do território gaúcho foram submetidas a projetos de ignorado impacto ambiental, por singela autorização".
Ecossistema delicado
Para o procurador-geral, é flagrante a inconstitucionalidade da expressão "autorização", contida na Lei Estadual 11.520. Ele solicitou a concessão de medida cautelar, alegando que "a instalação de imensos projetos de plantio de árvores, fundados em autorizações, representa elevado risco de graves danos ao meio ambiente, especialmente num ecossistema reconhecidamente delicado como o da região do bioma pampa, na metade sul do Rio Grande do Sul".
A ação cita como exemplo de interpretação errônea da Constituição um termo de ajustamento de conduta (TAC) assinado pelo Ministério Público Estadual (MPE) e a Fepam. O termo autoriza a fundação a emitir uma autorização para empreendimentos de cultivo de árvores em substituição ao licenciamento ambiental usual. A Adin será analisada pelo relator Eros Grau. Ainda que o STF entenda que a expressão "autorização" não é inconstitucional, o procurador-geral pede que não seja permitida a "exclusão ou postergação de prévio estudo de impacto ambiental".
Compras
A ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal no Rio Grande do Sul registra que, em 2004, a Votorantim deu início à implantação de sua base florestal mediante a aquisição de propriedades rurais e início do efetivo cultivo de eucaliptos, sem prévio licenciamento ambiental, em seis municípios, num total de 12,2 mil hectares. Posteriormente, a Fepam passou a licenciar isoladamente cada imóvel.
"Da mesma forma, no que tange à empresa Aracruz e ao grupo Stora Enso, todo o plantio de eucaliptos vem sendo 'regularizado' pela ré Fepam, segundo uma perspectiva igualmente fragmentária, na medida em que apenas os imóveis rurais isoladamente tomados vêm recebendo licenças ou autorizações para o plantio de eucaliptos", diz a ação civil pública. O Ministério Público defende a concessão de licença ambiental para o conjunto das florestas de eucaliptos.

Defesa de secretário

O secretário do Meio Ambiente do Rio Grande do Sul, Otaviano Moraes, justificou ao Correio a concessão de autorizações às papeleiras, em entrevista concedida em 29 de abril.
Antes da apresentação da Adin pelo procurador-geral da República, ele afirmou que uma ação civil pública movida contra as empresas e a Fundação de Proteção Ambiental (Fepan) feria a "soberania" do estado.
Inicialmente, questionado sobre a diferença entre licença ambiental e autorização, respondeu: "A autorização é algo assim, excepcional. O que a legislação prevê como ordinário é o licenciamento, que passa por todo o estudo de viabilidade ambiental". A reportagem lembrou, então, que o Ministério Público Federal havia apresentado ação contestando as autorizações concedidas pela Fepan. "Nós contestamos essa intervenção federal na gestão ambiental que afeta apenas o território do Rio Grande do Sul. Isso envolve a própria soberania, porque o meio ambiente diz respeito ao território. A Justiça gaúcha deve solucionar qualquer conflito", reagiu Moraes.
Informado de que os procuradores defendiam a aprovação de licenças de forma conjunta, porque o impacto das plantações ocorrerá em bacias hidrográficas, respondeu: "Não concordamos com isso.
Não vemos essa ligação necessariamente entre o plantio em Bagé e em Guaíba, mesmo que pertencente a uma mesma empresa.
O objetivo é evitar os maciços, sem os corredores ecológicos. Não importa a titularidade da propriedade".

CB, 10/05/2008, Política, p. 8

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