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Presídios lançam esgoto in natura em rios de SP

OESP, Metrópole, p. C6
04 de Set de 2007

Presídios lançam esgoto in natura em rios de SP
Dejetos caem em córregos e chegam até a jorrar pelas bocas-de-lobo; MP exige providências do Estado

Eduardo Reina, , Valéria França

O esgoto produzido pelos presos de parte das 144 unidades prisionais de São Paulo está poluindo rios e córregos vizinhos. Os dejetos se transformam em esgoto clandestino e vão direto, muitas vezes sem tratamento, para mananciais. A situação levou promotores a exigir providências do governo do Estado.

Um dos casos mais gritantes é o da Penitenciária 2 de Itirapina, região central do Estado. O esgoto é lançado numa rede coletora do município, mas, para chegar até lá, passa sob alguns bairros da cidade. Como a população carcerária aumenta a cada ano, nos horários de pico o sistema não dá mais conta do volume jogado na rede, que extravasa pelos bueiros. 'Num dos trechos, ele jorra na frente de uma creche', diz Feliques Henrique de Oliveira, secretário de Saneamento Básico de Itirapina.

'Encaminhamos um ofício ao prefeito. Ele entrou em contato com o Ministério Público, que abriu uma ação com base nos documentos', disse Oliveira. A liberação de verba para a construção da estação de tratamento do esgoto do presídio foi aprovada em fins de julho pelo governo paulista.

CAMPINAS-HORTOLÂNDIA

Outra situação problemática é do Complexo Penitenciário Campinas-Hortolândia, maior núcleo de detenção de São Paulo, com mais de 7.500 presos - ao todo, o sistema carcerário do Estado tem cerca de 144 mil detentos. O esgoto escorre a céu aberto dos presídios e passa por núcleos habitacionais vizinhos, onde moram cerca de 50 mil pessoas, antes de cair na nascente do Ribeirão Jucuba.

O presídio tem uma estação própria, desativada em 1999, que exige obras para operar. Diante desse quadro, os Ministérios Públicos Federal (MPF) e Estadual (MPE) moveram ações civis contra a Secretaria da Administração Penitenciária (SAP). Segundo o promotor do Meio Ambiente de Americana, Oriel da Rocha Queiroz, que cuida da ação em Hortolândia, 'é praxe do Estado se esquecer do tratamento de efluentes, e é comum o vazamento de esgoto nas unidades já existentes'. 'O CDP (Centro de Detenção Provisória) de Americana, assim como outros, tem vazamento de esgoto. Mas as novas unidades estão sendo feitas com estação de tratamento', disse Queiroz.

De acordo com a Sabesp, a rede coletora de esgoto ainda está sendo construída no município de Hortolândia. A situação reflete a deficiência do saneamento básico no Estado: 53,4% dos municípios paulistas não tratam seu esgoto, segundo dados de 2003 da companhia.

A Assessoria de Imprensa da SAP informou que a solução do problema do esgoto no complexo 'está em tramitação' e ele será resolvido 'em breve'. Segundo a secretaria, 'há apenas um problema de competência dos municípios, uma vez que o complexo atinge Campinas e Hortolândia'.

A Justiça Federal determinou, em dezembro, que fosse proibida a construção de duas penitenciárias com capacidade para 1.600 pessoas em Presidente Alves, cidade do oeste paulista. Elas não tinham estudo prévio de impacto ambiental.

O esgoto das duas unidades seria despejado na área de conservação ambiental da bacia do Rio Batalha. O juiz Roberto Santos Filho, da 1ª Vara da Justiça Federal de Bauru, proibiu qualquer repasse financeiro da União para o Estado até que o estudo seja concluído. Cabe recurso à decisão. Segundo a SAP, a obra está embargada.

No ano passado, a Justiça também interditou o prédio da Penitenciária de Iperó, na região de Sorocaba, e determinou a transferência dos 600 presos - parte deles continua fora do presídio. A causa foi um processo de 1998, movido pela Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), que exigia a construção de um sistema de tratamento de esgoto. A SAP informou que a ordem de serviço para o trabalho de 'adequação do sistema existente no local' foi dada ontem.

LITORAL NORTE

A situação também é precária em Caraguatatuba, no litoral norte. O CDP da cidade, com inauguração prevista para o início de 2008, não tem estação própria de tratamento de efluentes. Os dejetos deverão ser despejados no Rio Claro, que abastece a cidade e metade de São Sebastião, segundo o MPE. A SAP diz que, apesar de a estação não estar no projeto, ela será construída.

Na Grande São Paulo, a Promotoria de Habitação, Urbanismo e Meio Ambiente propôs ação civil pública contra a SAP este ano por causa do lançamento de esgoto do CDP de Osasco, sem tratamento, no Córrego Carapicuíba.

Estudo cobrado por Serra fica pronto este mês
O esgoto clandestino do sistema prisional paulista levou o governador José Serra (PSDB) a pedir levantamento detalhado da situação. 'Ainda não temos um diagnóstico geral. O relatório que está sendo feito em parceria com a Secretaria da Administração Penitenciária deve ficar pronto ainda este mês', disse a secretária estadual de Saneamento e Energia, Dilma Seli Pena.

Dilma admitiu que há problemas em vários presídios, principalmente sobre a operação e manutenção das estações de tratamento de efluentes. 'Quando se construíram as penitenciárias, foi aprovado projeto de esgoto próprio. Outras são mais antigas. E sempre há problemas de manutenção. Estamos procurando soluções em caráter de urgência', afirmou.

Granja Viana reage a poluição
Morador vê risco de contaminação de poços caseiros
A batalha é longa. Há quatro anos, moradores da Granja Viana, na divisa de São Paulo, Osasco e Cotia, tentam impedir que dois córregos da região sejam condenados pelo esgoto dos Centros de Detenção Provisória 1 e 2, localizados em Osasco. Dejetos de 4.600 presos - num volume de 63 metros cúbicos por hora, de acordo com laudo da Sabesp - são desviados sem tratamento, para o Rio Ipê.

'Estes presídios foram construídos sem sistema de tratamento de esgoto', afirmou o ambientalista Marcelo Torres, que mora na Granja Viana.'O esgoto já contaminou o lençol freático. E a maioria das casas da região é abastecida por poços caseiros.'

Os vizinhos já tentaram de tudo, reclamaram, brigaram e, por fim, fizeram um abaixo-assinado, que contou com a adesão de grandes empresas, como o Pão de Açúcar. A causa também ganhou apoio do senador Eduardo Suplicy (PT).

Em março, o Ministério Público Estadual abriu representação para apurar as denúncias. 'A Secretaria de Administração Penitenciária, a Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb) e a Sabesp confirmaram a história', disse o promotor Fábio Luís Machado Garcez, responsável pelo caso. Garcez tinha dado aos três órgãos prazo até 20 de agosto para informarem o que está sendo feito para resolver o problema. Depois, deu mais dez dias. Até agora não teve resposta e ameaça abrir uma ação civil pública.

'USUÁRIOS'

Segundo a SAP, as obras de tratamento de esgoto em unidades prisionais têm prioridade e serão realizadas em caráter emergencial. 'Quando as construções foram entregues, os números de usuários (presos) eram outros, e agora elas precisam de ajustes para a nova demanda', informou, em nota.

De fato, os CDPs de Osasco foram construídos para abrigar uma população bem menor que a atual. Cada unidade tinha capacidade para 768 detentos e 200 funcionários. Hoje, os dois CDPs abrigam 4 mil presos. No final de semana, recebem mais mais 700 visitantes.

De acordo com a Cetesb, o problema está no sistema de bombeamento do esgoto, que não tinha manutenção inadequada. A direção dos CDPs providenciou a compra de duas bombas, que não deram conta da tarefa. Técnicos da Cetesb constataram problemas de extravasamento dos dejetos nos horários de pico.

Até o início do ano, além do Ipê, o córrego vizinho, o Carapicuíba, também tinha virado um esgoto a céu aberto. 'Aqui costumava ter peixinhos e pedalinhos nos áureos tempos. Mas ficou imundo', disse João Del Gaiso. Ele é um dos donos de uma propriedade de 10 mil metros quadrados, onde funcionou o restaurante Recreio Country, que tem um lago abastecido pelo Carapicuíba. Depois das bombas instaladas, o esgoto deixou de ir para o lago. Mas continua a poluir o Ipê.

OESP, 04/09/2007, Metrópole, p. C6

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