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Presidente contraria discurso e corta gasto com saneamento

FSP, Brasil, p.A6
11 de Abr de 2004

SEM ESPETÁCULOCorte é de 60,7%, e do que sobrou, menos de 1% saiu do papel; investimento é menor do que o de FHC em 2002Presidente contraria discurso e corta gasto com saneamento
MARTA SALOMONDA SUCURSAL DE BRASÍLIA Destacados como uma das prioridades do governo Luiz Inácio Lula da Silva em discursos e até nas negociações com o Fundo Monetário Internacional, os investimentos em saneamento enfrentam em 2004 corte de 60,7% do dinheiro que a lei orçamentária destinou ao setor por meio de quatro ministérios diferentes.O dado, fornecido pelo próprio Ministério das Cidades, mostra uma realidade bastante diferente do discurso que Lula fez na terça-feira em Rio Branco (AC), quando acusou a morte de 300 mil crianças por falta de saneamento básico entre 1998 e 2001, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.Pelas contas da assessoria do ministro Olívio Dutra, haverá R$ 688 milhões -39,3% do que previa a lei orçamentária- disponíveis para investir em saneamento básico neste ano. É menos do que o valor investido com recursos federais no último ano de mandato de FHC -R$ 908,4 milhões, já corrigidos pela inflação-, aponta estudo da Aesbe (Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais).Menos até do que os R$ 925 milhões que Lula teria investido em saneamento no primeiro ano de mandato. Desse valor, mais da metade só será paga neste ano. São contas pendentes. Não fosse o corte -fixado por decreto do presidente em fevereiro-, os gastos com saneamento poderiam alcançar R$ 1,750 bilhão.Até o final de março, quase nada do Orçamento de 2004 havia saído do papel. Menos de 0,5%, segundo dados do Siafi (sistema informatizado de acompanhamento de gastos federais)."Estamos começando a trabalhar o Orçamento agora e corremos atrás do prejuízo", alega José Luiz Reis, coordenador-geral de cooperação técnica em saneamento da Funasa (Fundação Nacional de Saúde), que concentra a maior parte dos gastos na área.O prejuízo a que ele se refere é o período curto entre o prazo final para a apresentação de projetos de saneamento pelas prefeituras (15 de maio) e o limite de tempo para a assinatura de convênios fixados pela lei eleitoral. Como haverá eleição nos municípios, as liberações ficarão bloqueadas a partir de 3 de julho.Segundo Reis, do dinheiro previsto para pequenas cidades (até 30 mil habitantes) em 2004, pouco mais de 1% havia sido gasto até a última terça-feira.ContabilidadeO maior feito do governo Lula na área de saneamento foram, até aqui, contratos assinados no valor de R$ 1,647 bilhão. É dinheiro do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e representa o maior volume de contratos assinados pela Caixa Econômica Federal em dez anos para obras de esgotamento sanitário, abastecimento de água e tratamento de lixo. Durante os oito anos de mandato de FHC, foram contratados R$ 2,730 bilhões.A marca foi comemorada em solenidade com a presença de Lula. Mas o dinheiro não foi liberado ainda, diferentemente do que o presidente afirmou durante a inauguração do Hospital do Idoso em Rio Branco."Nós liberamos em dezembro do ano passado R$ 1,7 bilhão para saneamento básico", disse Lula.A assessoria de imprensa da Caixa informa que a liberação do dinheiro dependerá do ritmo das obras e pode demorar, em alguns casos, mais de dois anos. As empresas estaduais de São Paulo e do Paraná levaram a maior fatia dos recursos."Existe um "timing" para o início das obras", destaca o Ministério das Cidades. "Como a quase totalidade dessas operações foi contratada no último trimestre do ano, ainda não houve tempo hábil para a realização de desembolsos financeiros significativos."No discurso em Rio Branco, Lula afirmou que haveria R$ 3 bilhões para "novos" investimentos em 2004. "Não falta dinheiro para fazer este país se desenvolver e crescer", disse o presidente.Ele se referia aos R$ 2,9 bilhões para empréstimos cuja contratação foi liberada na negociação do governo com o FMI (Fundo Monetário Internacional), no qual já estariam incluídos R$ 940 milhões contratados pela Caixa em dezembro passado.O ministro Olívio Dutra negocia a exclusão da parcela dos contratos já fechados do limite acertado com o FMI, mas o desfecho da negociação ainda é incerto. A decisão cabe ao Conselho Monetário Nacional.RitmoCom o ritmo dos investimentos registrados até aqui no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, ficará difícil cumprir a meta de universalizar os serviços de água e esgoto no país até 2024.Os dados oficiais mais recentes, que foram divulgados pelo IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), mostram que 60% da população brasileira não dispõe de coleta de esgoto, enquanto 23,9% não possui acesso à rede de água.Outro obstáculo aos investimentos em saneamento seria a falta de regras para a concessão de serviços à iniciativa privada.O governo ainda não chegou a um acordo sobre o projeto de Política Nacional de Saneamento Ambiental.

OUTRO LADOMinistério diz ser "normal" o ritmo de investimentos
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA O Ministério das Cidades considera "normal" o ritmo dos investimentos em saneamento em 2004 e alega que os pagamentos podem demorar porque dependem do término das obras ou da prestação de serviços."É importante enfatizar que os ministérios, que atuam de forma coordenada e integrada, já receberam as propostas técnicas para a aplicação dos recursos descontingenciados e estão procedendo a necessária análise de viabilidade das propostas", disse o ministro Olívio Dutra pela sua assessoria.Como 2004 é ano de eleição municipal, convênios com prefeituras terão de ser assinados até 3 de julho.Sobre os empréstimos para o setor com dinheiro do FGTS, a pasta disse que negocia a prorrogação do prazo para contratação até 31 de maio e que os projetos estão em fase de seleção.

FSP, 11/04/2004, p. A6

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