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Prejuízo só em uma cidade é de R$ 10,6 mi

FSP, Cotidiano, p. C10
13 de Jan de 2007

Prejuízo só em uma cidade é de R$ 10,6 mi
Gastos previstos na reconstrução de casas, ruas e estradas em Miraí superam toda a arrecadação do município em um ano
Laudo da qualidade da água descarta toxinas, mas indica que concentração de areia e argila é letal, especialmente para animais e para peixes

Cíntia Acayaba
Renata Baptista
Da agência Folha

O rompimento da barragem de rejeitos de bauxita da Mineração Rio Pomba Cataguases causou prejuízo de pelo menos R$ 10,6 milhões à cidade de Miraí (335 km de Belo Horizonte). Segundo a prefeitura, a arrecadação anual da cidade não ultrapassa R$ 6 milhões. Levantamento preliminar da Prefeitura de Miraí e do DER (Departamento de Estradas de Rodagem) mostra que os maiores prejuízos causados pelo vazamento de pelo menos 2 bilhões de litros de lama foram a destruição de ruas e casas.
De acordo com o governo mineiro, os impactos ambientais identificados até agora são destruição de fauna aquática por falta de oxigênio, eliminação de ecossistemas ribeirinhos e alteração da qualidade das águas nos rios Fubá e Muriaé. Para a recuperação de 785 casas serão necessários R$ 5,3 milhões, informou a prefeitura. A pavimentação de ruas atingidas consumirá R$ 2,74 milhões. O DER informou que a recuperação de estradas locais custará R$ 1,2 milhão.
A cidade também precisa reconstruir pontes, instalar bueiros e construir trechos de meio-fio, apontou o levantamento. "Isso porque ainda não contamos o ressarcimento de terceiros, como uma indústria têxtil que vai precisar de até R$ 600 mil", disse o prefeito de Miraí, Sérgio Resende (PMDB).

Análise das águas
O governo de Minas divulgou ontem o primeiro relatório de análise das águas dos rios Muriaé e Fubá, atingidos pelo vazamento. O Igam (Instituto Mineiro de Gestão das Águas) confirmou que a lama não é tóxica. Os resultados indicaram, porém, alto nível de turbidez da água (presença de resíduos sólidos como areia e argila). No trecho logo após a foz do rio Fubá, em Miraí, o índice de turbidez indicava 71 mil UNT (unidade que mede partículas sólidas na água) na quinta-feira. Ontem, o índice caiu para 65 mil UNT. O padrão máximo do Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente) para rios como o Muriaé é de cem UNT.
"O grande vilão nesse acidente é a turbidez da água, pois a barragem não era de rejeitos tóxicos. Com 71 mil unidades, nada consegue ficar vivo", disse o presidente do Igam, Paulo Teodoro de Carvalho. De acordo com ele, não há como prever quando as águas do rio Muriaé voltarão ao normal, pois as chuvas que atingem a região podem revolver os sedimentos do fundo do rio e provocar novas manchas de lama. O secretário de Meio Ambiente de Minas Gerais, José Carlos Carvalho, declarou ontem que a previsão é que os R$ 75 milhões de multa aplicados à mineradora sejam investidos em ações ambientais nos municípios atingidos.

Reunião
A Mineração Rio Pomba Cataguases firmou ontem seu primeiro compromisso público de reparação de danos. Em reunião com Ministério Público de Minas Gerais, Defesa Civil de Minas e do Rio, Feam (agência ambiental mineira), Corpo de Bombeiros, prefeitos da região e representantes das comunidades, a mineradora assinou termo de compromisso em que se compromete a dar apoio aos municípios mineiros (Miraí, Muriaé e Patrocínio do Muriaé) e fluminenses (Laje do Muriaé e Itaperuna) atingidos. As demandas ainda serão apontadas pela Defesa Civil.
Colaborou Thiago Guimarães, da Agência Folha

Após inundação, cidades do RJ ficam sem água

Ítalo Nogueira
Enviado especial a Laje do Muriaé e Itaperuna (RJ)

Duas cidades do Rio de Janeiro tiveram, anteontem à noite, o abastecimento de água suspenso. A maior preocupação de técnicos da Cedae (empresa de água do Rio) é com a duração do problema na região, principalmente em Itaperuna, que tem 110 mil habitantes.
O município de Laje do Muriaé foi atingido anteontem às 22h30 pela lama que vazou da barragem da Mineração Rio Pomba Cataguases, em Miraí (MG), a 70 km. O tratamento da água do rio Muriaé foi interrompido quando a turbidez atingiu mil UNT (Unidade Nefelométrica de Turbidez). No início da tarde, já era 3.710.
Retiro e Comendador Venâncio, distritos de Itaperuna, também tiveram o abastecimento interrompido. No centro, o fornecimento poderia ser fechado à noite, quando a lama era esperada na cidade.
O fim do abastecimento destas cidades já era previsto pelos técnicos da Cedae. O que eles não sabem dizer é por quanto tempo a falta d'água vai durar.
"Eu não sei até quando isso vai durar. Eu tenho tudo: estrutura, equipamento. Mas não tenho como saber isso", disse o diretor de Interior da Cedae, Heleno Silva, na reunião do grupo de técnicos que estudam o problema. "Eu não sei o que pode vir depois dessas chuvas na região", disse sobre Miraí.
"Isso [a falta de água] pode durar cinco, dez ou doze dias. Em uma cidade de pouco mais de 9.000 habitantes podemos tentar resolver, mas em Itaperuna eu não sei o que será". No acidente em março do ano passado, Laje do Muriaé ficou cinco dias sem água tratada.
A presidente da Serla (órgão gestor de recursos hídricos do RJ), Marilene Ramos, afirmou que vai acionar a ANA (Agência Nacional de Águas) para analisar a possibilidade de retirada da argila do rio Muriaé.
Os 38 caminhões-pipa e os que levavam copos de água mineral a Laje do Muriaé ainda não haviam chegado no fim da tarde de ontem. Apenas dois haviam abastecido duas cisternas no alto da cidade. Parte deles foi enviada ao centro de Itaperuna, caso o fornecimento fosse interrompido no centro.
Quando a lama chegou a Laje do Muriaé, a enchente que abateu a cidade por dois dias já havia diminuído. No entanto, casas que ainda estavam alagadas ficaram mais sujas com a argila que se espalhou pela cidade.
Em Itaperuna, a preocupação era que o mesmo ocorresse. Há dois dias a cidade está alagada devido às chuvas em Minas, por onde passa o rio Muriaé. Ontem uma das pistas da avenida principal da cidade estava alagada e foi interditada. A previsão é de que a chuva continue.

Indústria detém 98% do capital da mineradora

Da agência Folha

A Mineração Rio Pomba Cataguases Ltda., terceira maior produtora de bauxita do país e dona da barragem que rompeu na quarta-feira em Miraí (MG), tem como principal sócio, com 97,9% do capital social, a Sijosi Indústria e Comércio Ltda., sediada em Cataguases (MG).
A administradora da Sijosi e responsável pela Rio Pomba é a industrial Ivone Barbosa Silva, moradora de Cataguases. Os outros sócios são a Fiebig Participações Ltda., com 2% do capital, e a própria Ivone, com 0,1%.
Os dados constam da 29ª alteração contratual da empresa, de agosto de 2005. Trata-se do documento mais recente em posse do Ministério Público Federal em Itaperuna (RJ), que acompanhou o cumprimento do termo assinado pela empresa após o acidente anterior na barragem, em março.
A Rio Pomba integra o grupo Química Cataguases, formado por outras quatro empresas e uma fundação cultural. A Associação Comercial e Industrial de Cataguases informou que o grupo todo tem cerca de mil funcionários, e a mineração, 200.
A associação também informou que o atual superintendente da Rio Pomba é Túlio Barbosa, filho de Ivone.
Além da sede em Cataguases, a Rio Pomba mantém filiais em Miraí, Mercês (MG) e Palmeira (SC).
A Rio Pomba tem 46 processos no DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), sendo nove concessões para a exploração de lavras. E três autorizações para pesquisa no Piauí. (Thiago Guimarães e Cíntia Acayaba)

Moradores se mobilizam para pedir indenizações mais altas

Do enviado especial a Laje do Muriaé e Itaperuna (RJ)

Após cinco dias de falta de água os moradores de Laje do Muriaé acionaram a Justiça e estão sendo indenizados pela empresa. Com o novo acidente, pretendem repetir a dose, esperando um valor muito maior.
Em acordo na Justiça, a mineradora comprometeu-se a pagar entre R$ 600 e R$ 500 a cerca de mil famílias -o primeiro valor às que já haviam ganho em primeira instância e o segundo para os autores dos processos que seriam julgados.
Até janeiro, 250 famílias receberam o valor. O acordo, de agosto de 2006, previa que a cada mês 50 famílias seriam indenizadas, até maio de 2008.
"Processei não pelo dinheiro, mas sim pela irresponsabilidade da empresa", disse o vigilante Luciano da Quitanda, 41.
A advogada Beatriz Freitas Oliveira -que diz ser responsável por cerca de 90% dos processos- preferiu não estimar o valor das próximas ações.
"Dessa vez deve ser maior, já que além do dano moral da própria falta d'água, há a perda material por causa da lama".
Em 2006, foram pedidos 40 salários mínimos -limite para o processo tramitar em juizado especial, mais rápido. Em agosto, foram fechados os valores.
Para Oliveira, o valor não foi adequado. "Ele [o juiz] tem que levar em consideração a proporcionalidade do dano. Eu daria R$ 3.000". O prédio da advogada foi invadido pela lama.
"O medo é que a empresa, com a multa, entre em processo de falência, e os que não receberam não vejam esse dinheiro nunca", afirmou ela.
No acordo, somente quem provou ser cliente da Cedae ganhou a indenização.
(Ítalo Nogueira)

FSP, 13/01/2007, Cotidiano, p. C10

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