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A política do confronto não pode continuar

O Globo, Opinião, p. 2
29 de Ago de 2019

A política do confronto não pode continuar
Crise expõe à retaliação o agronegócio, que responde por 26% do Produto Interno Bruto

Editorial

Há nuvens no horizonte. É preocupante, por exemplo, o anúncio feito pelo ministro das Finanças da Suécia, Per Bolund, de que o avanço do desmatamento na Amazônia impõe imediata revisão de todos os investimentos feitos no Brasil por seus fundos de pensão públicos. Eles administram R$ 650 bilhões em ativos e financiam a aposentadoria de 10,2 milhões de pessoas, isto é, toda a população sueca.

Já a primeira-ministra da Noruega, Erna Solberg, lamentou o "péssimo momento" do acordo de livre comércio com o Mercosul, na terça-feira. Os noruegueses fazem parte de uma associação de países fora da União Europeia.

Os problemas com os europeus se multiplicam desde a assinatura do acordo Mercosul-União Europeia.

A incontinência verbal levou o presidente Jair Bolsonaro à ciclotimia. Da euforia inicial passou, rapidamente, aos choques com Angela Merkel, chanceler alemã, e, desde a semana passada, se mantém em conflito aberto com Emmanuel Macron, presidente francês. Não é demais lembrar que Alemanha e França são pilares da Comunidade Europeia. E os europeus são os principais investidores no Brasil e no Mercosul, além de maiores compradores dos produtos exportados pelo Brasil.

A crise provocada pelo crescente desflorestamento da Amazônia entrou para listas de alerta operacional em instituições financeiras como J.P. Morgan. Avança com protestos e sinais de boicote ao "Made in Brazil", disseminando apreensão em segmentos agroindustriais como o de couros, cujo faturamento (R$ 8 bilhões ao ano) depende em 80% do mercado externo.

O governo continua a lidar de forma errática com uma situação grave, emitindo sinais de dissociação da realidade com uso de desinformação e até desconsideração à posição dos estados amazônicos, como se viu em reunião no Palácio do Planalto.

Com o histórico recente de alternância de comportamento governamental, seria recomendável cuidados redobrados para que a situação não se torne mais crítica nos próximos dias, quando Bolsonaro vai falar na Assembleia da ONU.

É evidente a escassez de competência na condução da diplomacia. Nas circunstâncias, Bolsonaro deveria se espelhar no exemplo do presidente argentino Mauricio Macri, que conduziu com habilidade e total pragmatismo a assinatura do acordo com a União Europeia, encerrando um impasse político de duas décadas. E, também, escutar o líder chileno Sebastián Piñera, que tenta construir uma saída política.

A política do confronto deixou exposto à retaliação o agronegócio, que é responsável por 26% do Produto Interno Bruto. É hora de empresas se mobilizarem para induzir o governo à mudança de curso. O país não pode se arriscar a enfrentar uma "tempestade perfeita" em meio à conjuntura marcada pela reestruturação da dívida argentina e a guerra comercial entre EUA e China.

O Globo, 29/08/2019, Opinião, p. 2

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