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Polícia Federal vai indiciar peruanos capturados por índios

Página 20-Rio Branco-AC
Autor: Altino Machado
26 de Out de 2002

Antônio Pereira pediu mais segurança para a fronteira do Alto Juruá, onde o Peru mantém um batalhão do Exército

O chefe da Fundação Nacional do Índio no Acre, Antônio Pereira Neto, quer que a Polícia Federal traga, para que sejam indiciados em Rio Branco, os três madeireiros peruanos capturados em território brasileiro por índios Ashaninka, na aldeia Apiwtxa, na fronteira com o Peru. "Esperamos que esses bandidos, depois de indiciados sejam mostrados ao povo acreano", afirmou Neto.

Os três peruanos foram capturados na terça-feira. Eram mais de dez que estavam explorando mogno ilegalmente na área indígena e parte deles fugiu. Os índios, que temiam represálias dos peruanos capturados, se recusaram a entregar os três peruanos ao chefe do posto da polícia civil no município de Marechal Thaumaturgo.

O administrador regional da Funai criticou o policial Renato Mota, que chefia o posto policial. "Os índios disseram que preferiam matar os peruanos a entregá-los ao policial. Não confiam nele", disse Neto. Mota é acusado de omissão por não ter apurado agressões contra índios na região.

O secretário de Segurança Pública, Cassiano Marques, contestou o administrador da Funai. "Nós designamos um delegado para atender as reivindicações da Funai e estamos dando apoio aos agentes da Polícia Federal que estão em deslocamento para buscar os peruanos capturados", afirmou.

Os peruanos foram presos na terça, mas só na tarde do dia seguinte os índios chegaram à aldeia, a 20 quilômetros do local, onde os estrangeiros montaram acampamento. "Holem Ridota, Silas Manuel e Vitória Dárea foram presos e amarrados", informou o administrador regional da Funai.

Os índios relataram à Funai que recolheram uma espingarda calibre 16 com os peruanos. Antes de executar a captura os índios tiveram a precaução para filmar a operação ilegal dos peruanos dentro da reserva. A área onde os peruanos recolheram mogno estaria bastante devastada. A aldeia Ashaninka do Rio Amônia tem 450 índios e fica a 700 quilômetros de Rio Branco.

A aldeia Apiwtxa onde os peruanos foram capturados é local de difícil aceso. Na região de fronteira do Brasil com o Peru não existe policiamento. A região é bastante utilizada pelos narcotraficantes. "É inadmissível que os peruanos invadam terras indígenas para destruir nosso patrimônio ambiental", afirmou o administrador da Funai.

O mogno extraído pelos peruanos em território brasileiro é transportado pelo Rio Ucayali até Loreto, a 300 quilômetros da fronteira com o Brasil. Brasil e Peru criaram um grupo de trabalho para discutir meio ambiente na fronteira. Uma operação na região estava planejada para ser deflagrada na região antes do incidente.

Mogno financia produção de cocaína

O administrador regional da Funai no Acre, Antonio Pereira Neto, critica duramente o fato de que a invasão do território brasileiro por madeireiros peruanos ocorra com tanta freqüência sem que haja uma reação firme das autoridades e da opinião pública.

Neto disse que a madeira que tem sido retirada pelos exploradores peruanos na região de fronteira é destinada a gerar dinheiro para financiar a produção de cocaína que posteriormente é distribuída aos brasileiros.

Desde o ano 2000 tem sido constata a invasão de território brasileiro por exploradores madeireiros peruanos. O que está acontecendo?
A coisa é anterior. Em 1985 o senhor já havia estourado todo o mogno do Alto Amônea e por conta disso existe um processo na Justiça Federal onde ele foi condenado a pagar e recorreu da decisão de pagar uma indenização de R$ 15 milhões aos índios. Essa é uma região muito rica em mogno, que é uma madeira cuja exploração está proibida no país. O Acre tem uma política ambiental respeitada, onde ninguém explora mais essa madeira. Quem tem explorado essa riqueza e avilta nossa soberania são bandidos peruanos.

Isso acontece porque aquela é uma região sem nenhuma proteção militar ou policial?
O exército peruano tem do lado deles um quartel. O quartel mais perto do Exército Brasileiro está muito distante, em Cruzeiro do Sul. Peruanos todos anos navegam por nossos rios com enorme quantidade de mogno. Ninguém combate. Apenas o Ashaninka todos os anos dão combate e até correm risco de vida em defesa da nossa riqueza.

Por que os índios se recusaram a entregar os peruanos ao chefe do posto policial em Marechal Thaumaturgo?
Os índios disseram que não confiam no policial Renato Mota, que chefia o posto. Preferiram manter os peruanos amarrados e entrega-los à Polícia Federal porque o policial que chefia o posto tem sido omisso. Lamento que numa região tão estratégica haja um policial despreparado para lidar com os índios e ajuda-los a combater madeireiros e narcotraficantes que tomam canto da região. Ali está o centro do banditismo envolvido com o tráfico de cocaína e exploração ilegal de mogno. Ali é a casa da mãe-joana.

Qual será o destino dos madeireiros peruanos capturados pelos índios?
Eu conversei com o superintendente da Polícia Federal e sugeri que sejam trazidos para Rio Branco. Gostaria muito que fossem indiciados aqui e que a opinião pública acreana pudesse conhecer a cara desses bandidos. A Funai até se dispõe a pagar o transporte deles para Rio Branco. A população branca na fronteira e as pessoas nas cidades não parecem preocupadas com um fato de tamanha gravidade. A população acreana assiste a tudo inerte. Parece que não tem consciência. Apenas os índios dão o combate à pilantragem de peruanos na fronteira. É o nosso país que está sendo invadido e nossas riquezas roubadas. Isso para mim é uma vergonha.

Os peruanos que invadem nosso território pertencem a alguma empresa?
O que eles fazem é retirar a madeira para produzir dinheiro para preparar a cocaína que depois é vendida em nosso país. A Polícia Federal sabe disso. A guerra com do Brasil com o Peru acabou em 1909, mas todos os dias os peruanos estão abusando da gente. Invadem nosso território e não fazemos nada.

Ashaninka

Povo piemontês de caçadores-agricultores, falantes de uma língua arawak, os Ashaninka tiveram seus primeiros contatos com os brancos há mais de quatro séculos. Ao longo de quatrocentos anos mantiveram a identidade cultural de forma notável. Atualmente é um dos maiores grupos da floresta tropical sul-americana.
Conhecidos também como Kampa, os Ashaninka integram junto com os Piro, Amuesha, Matsiguenga e Nomatsiguenga, o conjunto dos arawak pré-andinos, ramo ocidental da família linguística arawak.

O termo Kampa, de origem desconhecida, foi largamente utilizado nas fontes coloniais - as primeiras referências detalhadas sobre os Ashaninka são do ano de 1595 (Varese, 1968), porém, trata-se de um nome atribuído não aceito por eles. Eles se autodenominação Ashaninka, que significa gente, seres humanos.
Habitantes do piemonte andino, chegaram ao limite de sua expansão rumo ao oriente, nos confins do sudoeste da amazônia brasileira, região de fronteira entre Brasil e Peru, em terras acreanas.

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