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PMs matadores de índio continuam impunes no Acre

A Gazeta-Rio Branco-AC
Autor: Nonato de Sousa
10 de Out de 2002

Seis anos após um crime torpe que causou comoção social a pacata cidade de Feijó, município localizado a 360 km de Rio Branco (AC) pela BR-364, os autores da barbárie, o soldado-PM José Nivaldo Monteiro de Araújo e o cabo-PM Rosseni Muniz de Moura, continuam impunes. E o mais grave, trabalhando normalmente como agentes policiais e guardiões da lei e da ordem.

De acordo com denúncias do Ministério Público Estadual (MPE), o soldado Nivaldo e o cabo Rosseni foram os autores da morte do índio Raimundo Silvino Shanenawa e feriram gravemente seus parentes, José Nicolau Brandão Shanenawa e José Augustinho Calixto Shenenawa. O crime ocorreu dia 14 de junho de 1996.

Um relatório assinado pelo delegado Adolfo de Oliveira Reges, responsável pelo inquérito policial que apurou o crime, às 16h30 do dia 14 de julho de 1996 os dois PMs retornavam de um banho com as respectivas esposas. Com eles vinham os dois menores, Rafael e Cezar Augusto. Ao se aproximarem do sítio do senhor "Toinho" um dos PMs pediu que Rafael retornasse ao local onde se banhavam e comiam churrasco (boca do Igarapé Diabinho - no Rio Envira), para recuperar uma grelha de assar carnes que havia esquecido. Estavam a 150 metros da aldeia Morada Nova, dos índios Shanenawa.

No caminho o menor encontrou os índios, Raimundo Silvino, José Nicolau e José Brandão. Silvino conhecia o menor. A mãe deste era monitora na aldeia. Silvino abraçou Rafael. Alcoolizados os PMs entenderam que o menor estava sendo agredido. De nada adiantou os pedidos de calma dos índios e nem aceitaram suas explicações. Travaram luta corporal. Silvino foi dominado. O cabo sacou de um revólver calibre 38. Estava sentado sobre as costas da vítima. Puxou-lhe pelos cabelo e disparou contra sua cabeça sem lhe dar a mínima chance de defesa. O soldado teria feito os disparos que feriram José Brandão e José Nicolau, quando estes tentavam ajudar Raimundo Silvino.

Este morreu no local. Nicolau e Brandão foram trazidos para Rio Branco e conseguiram se salvar.
Consta que após o crime, os acusados e os demais que estavam em suas companhias, se refugiaram no quartel da Polícia Militar do município.

Providências jurídicas

O representante do Ministério Público, Felizberto Fernandes da Silva, denunciou o cabo Rossini por crime de homicídio qualificado e tipificado no art. 121, parágrafo 2o inciso IV e ainda por tentativa de homicídio contra Nicolau e Augustinho.

Requereu ainda o Ministério Público a Prisão Preventiva dos dois denunciados por estarem preenchidos os requisitos da custódia e como garantia da ordem pública pela grande repercussão do crime, já que havia a possibilidade de conflitos violentos entre os índios e os acusados.

A defesa dos acusados, recorreu da sentença alegando falta de competência da Justiça comum em Feijó, já que o crime envolvia índios e portanto teria que ser julgado pela Justiça Federal. O processo foi para o Superior Tribunal de Justiça, onde se encontra até hoje aguardando julgamento sobre de quem é a competência para julgar o caso.

Anistia Internacional exige justiça

A Anistia Internacional - a mais importante organização não governamental que defende os direitos humanos em todo o mundo - exigiu do procurador geral da República, Geraldo Brindeiro, medidas urgentes que garantam punição aos acusados pelo assassinato do índio Shanenawa Raimundo Silvino, ocorrido em 14 de julho de 1996 em Feijó. Esse crime despertou a atenção do órgão máximo de defesa dos direitos humanos porque após seis anos do ocorrido, os apontados como responsáveis pelo assassinato, os policiais militares José Rosseni Muniz de Moura e Nivaldo continuam impunes e trabalhando na ativa da PM.

O mais grave é que um dos policiais continua ameaçando o povo indígena Shanenawa - comunidade a qual pertencia a vítima - espalhando um clima de insegurança e medo na região. São essas as informações contidas na carta enviada esse mês pela Anistia, ao procurador geral da República, com cópias ao presidente da Funai, Conselho Indigenista Missionário, presidente do Superior Tribunal de Justiça e a 6ª Câmara do Ministério Público Federal.

A Anistia tomou conhecimento do caso através de denúncia feita pela União das Nações Indígenas do Acre e Sul do Amazonas (UNI), durante a visita de um dos membros da Ong internacional em Rio Branco. Na ocasião a UNI, através de sua assessoria jurídica, solicitou que a Anistia utilizasse seu prestígio para interceder junto ao Superior Tribunal de Justiça, onde o processo se encontra parado aguardando decisão sobre o foro competente para processar e julgar o caso. O impasse é se a competência é da Justiça Federal ou da Justiça Comum em Feijó.

Segundo o coordenador geral da UNI, Francisco Avelino Apurinã, os povos indígenas aguardam solução da Justiça não só para esse, mas para todos os crimes praticados contra os indígenas, onde tambem se verifica a morosidade só que de forma mais acentuada.

"No caso de Feijó, o mais grave é que os dois policiais militares apontados como responsáveis pelo assassinato, ainda tentaram contra a vida dos indígenas José Nicolau Brandão e Augustinho Calixto, que ficaram gravemente feridos", lembrou o coordenador da UNI.

A Assessoria Jurídica da UNI informou ainda que a Anistia Internacional enviou o caso para o relator especial de assuntos indígenas da ONU, para conhecimento dos fatos e a tomada de medidas necessárias. "Essa postura dos órgãos internacionais de direitos humanos nos trouxe ânimo e esperança de que finalmente o caso terá prosseguimento, pondo fim a essa situação de flagrante impunidade", concluiu a assessora jurídica da UNI, Jandira Keppi.

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