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Plano Diretor de Paraty provoca polêmica

O Globo, Rio, p. 19
24 de Out de 2006

Plano Diretor de Paraty provoca polêmica
Instituto do Patrimônio Histórico e associações de moradores criticam proposta aprovada em primeira votação

Daniel Engelbrecht

Uma série de polêmicas envolvendo a revisão do Plano Diretor Participativo de Paraty pode colocar em risco a preservação do meio ambiente e do patrimônio histórico do município, tombado desde 1958. Entidades como o Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e o Conselho Municipal das Associações de Moradores de Paraty (Comamp) acusam a prefeitura de ter enviado um plano com graves deficiências para votação na Câmara de Vereadores.

As entidades protestam também contra os vereadores, que no dia 11 passado aprovaram em primeira votação o plano.

Diante da polêmica, o presidente da Câmara, vereador Anderson Rangel de Vasconcellos, prometeu que vai retirar de pauta o projeto de lei.

Segundo o procurador da República em Angra dos Reis, André de Vasconcelos Dias, o principal problema do plano é que diversas disposições sobre uso e ocupação do solo estão em desacordo com critérios federais do Iphan e da legislação ambiental:

- O projeto considera como zonas de expansão urbana, portanto edificáveis, áreas que são de proteção ambiental permanente, como parte da APA do Cairuçu.

Limite para edificações ameaça conjunto arquitetônico
Para o presidente da Associação Casa Azul, uma organização da sociedade civil de interesse público (Oscip), Mauro Munhoz, o plano como está redigido atenta contra a legislação estadual e federal. Um dos problemas que chamam a atenção de Munhoz é a definição da cota de cem metros como limite para edificações na zona de expansão urbana, inclusive no entorno do Centro Histórico, o que comprometeria a ambiência do conjunto arquitetônico:

- Se aprovado, esse projeto poderá causar uma insegurança jurídica prejudicial ao desenvolvimento de Paraty - diz Munhoz. - A paisagem de todo o município foi tombada em conjunto com o Centro Histórico e é extremamente importante sua preservação para que Paraty atinja o conceito de patrimônio da humanidade, que está sendo pleiteado junto à Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e Cultura (Unesco).

Além desses problemas, o plano é criticado por não tratar dos núcleos urbanos existentes na zona rural e não prever a criação de zonas especiais de interesse social - áreas com legislação diferenciada e voltadas para a população de baixa renda.

- A verdade é que esse plano só favorece os grandes especuladores imobiliários e poderia transformar Paraty numa Angra dos Reis - critica o procurador.

Com a proximidade da data limite para entrega do projeto ao Legislativo, a comissão que estudava as propostas sugeriu ao prefeito José Carlos Porto Neto que prorrogasse o trabalho de revisão, para que não fosse aprovado um plano prejudicial ao município, e enviou ofícios respaldando essa necessidade.
O prefeito, no entanto, alegando que não poderia desrespeitar o prazo determinado pelo Estatuto da Cidade, encaminhou o projeto à Câmara do jeito que estava.

Prefeito diz que se limitou a cumprir estatuto
Numa mensagem lida para os vereadores no dia 10 passado, o prefeito deixou a critério deles a decisão de votar ou conceder mais prazo para a discussão. No dia 11, os vereadores votaram e aprovaram por sete votos a dois, em primeira votação, o projeto. A segunda votação foi marcada para o dia 31. A aprovação em primeira votação gerou manifestações contrárias de diversas associações de Paraty.

- É importante que os vereadores não aprovem em segunda votação esse projeto e que o prefeito continue com o processo de revisão do plano - defende Munhoz.

O prefeito sustenta, em sua defesa, que não poderia ter agido de forma diferente.

- O plano está sendo discutido desde o início de 2005 com a participação de representantes de toda a sociedade. Eu, como prefeito, não tenho poderes para ampliar um prazo que é estipulado pelo Ministério das Cidades, sob pena de estar cometendo crime de responsabilidade. Deixei então com a Câmara a decisão de aprovar ou conceder mais prazo para os estudos, pois ela é que tem poderes para isso. Se os vereadores acharam melhor votar, devo acatar a decisão - diz Porto, concordando, porém, que existem pontos que deveriam ser modificados no projeto de lei.

Na semana passada, uma solução para o problema começou a ser vislumbrada. O procurador da República e a promotora de Tutela Coletiva de Angra dos Reis do Ministério Público estadual, Patrícia Gabai Venâncio, enviaram recomendação ao presidente da Câmara e ao prefeito sugerindo a rejeição do projeto pelos vereadores ou, caso seja aprovado, que fosse vetado por Porto. A medida abriu caminho para o presidente da Câmara anunciar a retirada do projeto da pauta de votações.

- Com essa garantia por escrito dos dois ministérios públicos de que o prazo pode ser prorrogado, vou retirar de pauta por tempo indefinido o projeto de lei, até que todas as pendências sejam solucionadas. O que não dava para ser feito antes era deixar de votar o plano e desrespeitar o Estatuto da Cidade sem nenhuma garantia. Em Barra Mansa, o MP está processando a Câmara de Vereadores por esse motivo - disse o presidente da Câmara Municipal.

A revisão do Plano Diretor de Paraty começou a ser feita em 2005 e, de acordo com o Estatuto da Cidade, deveria ser votada pelo Poder Legislativo até o dia 10 de outubro e sancionada até o fim do mês. Após reclamações de entidades, no fim de 2005, de que o processo estava sendo conduzido sem ampla participação popular, foi criada em maio de 2006 uma comissão reunindo diversos representantes da sociedade civil, que realizou 17 reuniões para discutir as propostas até setembro. De acordo com um oficio de um dos órgãos envolvidos nos trabalhos, encaminhado ao Ministério Público Federal, a que O GLOBO teve acesso, foram identificadas diversas falhas no plano.

O Globo, 24/10/2006, Rio, p. 19

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