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Pesca farta e fiscalizacao escassa em Tucurui

O Globo, O País, p.10
10 de Mai de 2004

Pesca farta e fiscalização escassa em Tucuruí

Lisandra Paraguassú
Enviada especial

Pouco depois do sol nascer, na beira do lago de Tucuruí centenas de pescadores já estão a postos. Nos seus barcos e nas suas redes, cerca de 20 toneladas de peixes estão prontos para serem pesados e vendidos. São, principalmente, tucunarés, maparás e pescadas que chegam tão longe quanto Brasília e Recife, passando por Belém e até Manaus. As 1,5 mil toneladas de pescado que saíam do rio por ano chegam a quase 6 mil hoje, depois que a hidrelétrica construída na região transformou 2.875 quilômetros quadrados de mata em um imenso lago, cinco vezes o tamanho da baía da Guanabara, que fica a cerca de 390 quilômetros da capital do Pará.

Dizia-se que toda a vida aquática iria morrer

Há 20 anos, quando o lago de Tucuruí inundou uma parte considerável de floresta amazônica para que o reservatório da hidrelétrica fosse formado, dezenas de cenários catastróficos foram previstos. Em um deles dizia-se que a mata encoberta pela água iria apodrecer e contaminar a água de tal maneira que toda a vida aquática iria morrer.

- De fato, nos primeiros tempos o apodrecimento da folhagem fez com que a qualidade da água piorasse, mas isso nunca afetou a vida aquática. E, depois de cinco anos, a água voltou ao normal - explica Rubens Ghilardi Jr., da superintendência de Meio Ambiente da Eletronorte, a estatal responsável pela hidrelétrica de Tucuruí.

A vida aquática prosperou a tal ponto que, hoje, cerca de 10 mil pescadores de sete municípios tiram seu sustento do lago. O que antes era uma atividade de subsistência agora é meio de vida e uma das principais atividades econômicas da região.

Raimundo Pompeu, 44 anos, cinco filhos, subiu há 12 anos de Cametá - município que fica depois da hidrelétrica - para Tucuruí. Desde então, vende cerca de 30 quilos de peixe por dia, mais ou menos R$ 30.

- Aqui se ganha mais, o custo de vida é mais baixo. Trabalhando todo dia tem dinheiro, e pescador não tem sábado, domingo ou feriado - conta.

Pompeu é da leva de pescadores que deixou suas cidades porque na parte de baixo da hidrelétrica, hoje, a pesca está muito mais difícil. Como a construção interrompe o rio, os peixes não podem passar e concentram-se no lago. Muita gente teve que se mudar, mas ninguém reclama. Do lado de cima a pesca é, ainda, muito mais farta. Tanto que atraiu gente de muito mais longe.

José Raimundo Oliveira, 27 anos, veio de Macapá (AP) com a mulher e dois filhos, atraído pela história de um lago cheio de peixes. Amanhece no lago para no final da manhã levar o que tirou para a colônia de pescadores, onde os atravessadores compram o pescado para distribuir nos municípios da região.

Pescador de Tucunaré - peixe que se pesca só com anzol, sem rede -, reclama que as coisas pioraram desde que chegou, mas ainda tira cerca de 20 quilos por dia, vendidos a R$ 2,50 cada na colônia de pescadores de Tucuruí.

Pescadores querem fiscalização

O aumento do número de peixes no lago tem várias razões. Um dos motivos é, justamente, as árvores que, dizia-se, poderiam matar a vida aquática.

Hoje, depois que a vegetação mais frágil se decompôs, sobraram troncos e um emaranhado submerso de madeira mais forte, o chamado "paliteiro". É nele que os peixes se escondem e se reproduzem, protegidos porque ali é impossível para os pescadores colocarem suas redes.

É essa proteção que garante, por enquanto, a manutenção da quantidade de peixes no lago. Sem fiscalização ou controle, os próprios pescadores estão preocupados com quanto tempo a pesca vai durar.

Já há gente demais pescando no lago. O cálculo feito pela própria Eletronorte é de que deveriam ser 2,5 mil. Mas hoje são quatro vezes mais, mesmo que nem todos vivam da pesca. Muitos não respeitam nem mesmo o período de defeso.

O Ibama seria o responsável por verificar o tamanho dos peixes vendidos, mas raramente um fiscal aparece na colônia. Até porque são poucos funcionários para uma área tão grande.

Um dos projetos em estudo é a criação de um entreposto de pesca onde hoje há um posto improvisado e atravessadores se acumulam para comprar por R$ 1 o quilo do peixe. Se o acordo entre a Eletronorte, que deve financiar a construção, e a prefeitura de Tucuruí prosperar, o entreposto vai facilitar a vida dos pescadores.

A repórter Lisandra Paraguassú viajou a Tucuruí a convite da Eletronorte.

O Globo, 10/05/2004, O País, p. 10

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