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Pesca encolhe na capital do petroleo

JB, Economia e Negocios, p.A20
07 de Jun de 2004

Pesca encolhe na capital do petróleo
Quantidade de peixes retirados das águas de Macaé caiu 18,7 % nos últimos dois anos. Ibama culpa pescadores
Claudio de Souza
Enquanto a indústria do petróleo se expande rapidamente no litoral fluminense, gerando milhões de reais em royalties para as prefeituras, a pesca, atividade econômica tradicional da região, enfrenta cada vez mais dificuldades. Segundo dados da Colônia de Pesca de Macaé, capital brasileira do petróleo, entre 2001 e 2003, a produção pesqueira da cidade ficou 18,7% menor.
Os números do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) sobre a pesca no Estado ano passado ainda não estão disponíveis, mas o instituto registra queda de 9,5% para produção de pescados de 2001 para 2002.
Apesar de especialistas e do próprio Ibama apontarem a sobrepesca (pesca em quantidade acima do que o meio ambiente pode suportar), como principal causa da queda na produção, a exploração de petróleo está no centro da discussão dos pescadores.
- Antes do petróleo, a gente pescava uma tonelada em um dia de pesca. Agora, a gente fica uma semana pra pegar 800 quilos de peixe - afirma Benedito da Silva, que vive da pesca em Macaé há mais de 30 anos.
Benedito ganha cerca de R$ 800 por mês com a pesca e conta que cada vez os barcos precisam ir mais longe da encontrar os cardumes.
O coordenador da União das Entidades de Pesca e Aqüicultura do Estado do Rio, Francisco Guimarães Neto, reconhece o impacto da pesca predatória, mas afirma que a exploração de petróleo é um dos fatores que contribuem para o declínio da atividade pesqueira.
Chico Pescador, como é chamado, cobra medidas compensatórias das companhias petrolíferas, sob duas alegações principais. A primeira é a pesquisa sísmica, feita pelas petroleiras na fase de exploração (procura pelos reservatórios de petróleo). Nas sísmicas, os navios instalam medidores no fundo do mar e emitem sons muito fortes na água para verificar a vibração na estrutura geológica do fundo e isso, diz, afugenta os peixes.
A segunda compensação é por causa da proibição da pesca em um raio de 500 metros em torno da plataforma.
- As plataformas atraem os peixes para perto delas, mas não podemos chegar lá por questões de segurança. Então, os pescadores têm de receber por isso também - afirma.
Ele acrescenta que no litoral fluminense, de Arraial do Cabo a São Francisco de Itabapoana, principal área produtora de petróleo do país, vivem 25 mil pescadores.
O declínio da produção pesqueira é confirmado pelo coordenador de Gestão dos Recursos Pesqueiros do Ibama, José Dias. Entretanto, ele afirma que o fato está muito mais ligado à sobrepesca do que à indústria do petróleo.
- Se as comunidades pesqueiras não estiverem comprometidas em impedir a sobrepesca, a situação não será revertida - afirma Dias.
O coordenador do Ibama reconhece as dificuldades de se fiscalizar toda a extensão da costa brasileira e diz que o órgão têm se empenhado para convencer as comunidades da importância de se respeitar os períodos do defeso (suspensão da pesca por causa do período de reprodução dos peixes) e dos limites de tamanho mínimo para a pesca de cada espécie.
O pescador César Viana de Lima, de 52 anos, também reclama da pesca indiscriminada. Na profissão há 33 anos, César passou a utilizar seu barco para passeios turísticos como forma de complementar a renda.
- Se eu fosse viver só de pesca, iria morrer de fome - afirma César, para quem o declínio da pesca se arrasta há mais de 10 anos.
Para César Lima, a pesca mais prejudicada foi a de camarão.
- Nem tenho mais rede de camarão. Antes eu trazia de 500 a 600 quilos de camarão em um dia. Hoje, é difícil trazer 50 quilos - lamenta.
Roberto Tomassi, da Colônia de Pesca de Macaé, conta que a produção pesqueira vem caindo desde 2001. Segundo ele, naquele ano foram desembarcados no cais de Macaé, 8 mil toneladas de pescado. Já em 2002, foram 7,1 mil toneladas e, no ano passado, a pesca produziu 6,5 mil toneladas.
Os dados do Ibama mostram que a produção total do Estado caiu de 70,3 mil toneladas, em 2001, para 63,6 mil toneladas em 2002.

Efeito das pesquisas sísmicas é desconhecido
O professor do Departamento de Oceanografia da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), Sílvio Jablonski, afirma que a falta de dados confiáveis e regulares sobre a produção pesqueira de cada localidade inviabiliza uma gestão sustentável da atividade. Para ele, a ausência de controle sobre a pesca é o principal motivo do declínio da produção na região.
- O problema é que não se têm dados confiáveis de produção pesqueira de cada comunidade. Essas informações são fundamentais para fazer a gestão da pesca - afirma Jabronski.
O pesquisador reconhece que as pesquisas sísmicas prejudicam um pouco a pesca, mas considera o efeito muito localizado e temporário. Ele argumenta que são necessários mais estudos para quantificar o prejuízo que a indústria causa à pesca, para que então as companhias petrolíferas possam indenizar as comunidades pelas perdas.
O coordenador de Gestão dos Recursos Pesqueiros do Ibama, José Dias, diz que a pesquisa sísmica é uma atividade muito nova e que realmente os impactos precisam ser melhor avaliados. Por este motivo, ele diz que o Ibama não autoriza a atividade em locais que são criadouros de espécies. Dias acrescenta que fora dessas áreas o impacto é momentâneo e localizado, mas acrescenta que o Ibama está aprofundando estudos para que, se houver prejuízos, os pescadores sejam compensados pelas empresas.
Segundo a Petrobras, não há nenhuma evidência de que as pesquisas sísmicas causem prejuízo às comunidades pesqueiras, mas a empresa garantiu que se isso for comprovado tomará medidas compensatórias.
A estatal informou ainda que mantém diálogo constante com as entidades de pesca e que desenvolve programas sociais e ambientais nas suas áreas de atuação. Um dos programas, o Mozaico, que tem o objetivo de criar fontes alternativas de renda para as comunidades de pescadores, está sendo instalado inicialmente em três municípios da Bacia de Campos.
Indenização milionária
O total dos pedidos de indenizações encaminhados à Justiça contra a Petrobras pelo derramamento de óleo na Baía de Guanabara chega a R$ 750 milhões. Os números foram levantados pelo professor Silvio Jablonski, da Uerj, que considera o valor exagerado em relação aos prejuízos reais causados aos pescadores.
Segundo ele, a cifra pedida é equivalente ao faturamento de 50 anos de todas as comunidades pesqueiras da região, que têm receita anual estimada pelo professor de R$ 15 milhões.
- O valor total dos pedidos de indenização é absurdo. A pesca na região foi interrompida por alguns meses - afirma Jablonski.
O coordenador da União das Entidades de Pesca do Rio, Francisco Guimarães Neto, rebate.
- A avaliação do professor não tem credibilidade para mim, porque ele sempre presta consultoria para a Petrobras. Está envolvido com uma das partes e não pode ter isenção para avaliar isso - diz o representante dos pescadores.
A Petrobras não confirmou o valor total das indenizações pedidas por causa do acidente da Baía de Guanabara. Na ocasião, quase um milhão de litros de óleo vazaram do terminal da Ilha D'Água, da Petrobras.

JB, 07/06/2004, p. A20

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