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Peruanos tomam lugar de brasileiros no Alto Solimões

Amazonas em Tempo-Manaus-AM
Autor: Eduardo Gomes
03 de Nov de 2002

A situação na região no Alto Solimões está à beira de uma explosão social, podendo resultar em conflitos semelhantes ao que ocorreu no final da década de 80, quando índios ticunas foram assassinados por madeireiros por conta da questão de terras. Atraídos pelos benefícios sociais, levas de peruanos e até mesmo colombianos estão se fixando em território brasileiro, se autodenominando índios cocama, reivindicando demarcação de terras indígenas, principalmente na margem direita do rio Solimões.

Atualmente o foco mais tenso dessa situação está na pequena comunidade de Nova União, a 13,5 quilômetros da área urbana de Benjamin Constant, a 1.116 quilômetros de Manaus.

Com 22 famílias, a comunidade está literalmente dividida. De um lado peruanos que se auto-identificam como índios cocama e de outro, os não índios, ribeirinhos que se fixaram nas terras compradas pela administração do prefeito de Benjamin, Amauri Maia (PFL).

Ameaças

Um bilhete assinado pelo vice-presidente da Organização Geral dos Caciques das Comunidades Indígenas do Povo Cocama, Francisco Guerra Saurias para a antropóloga da Universidade de Brasília, dá bem a dimensão das proporções que o conflito poderá alcançar, caso as autoridades brasileiras não tomem uma providência a curto prazo. Ele diz que se as autoridades não tomarem providências, "em qualquer momento pode haver conflito sangrento com os não índios", assinala Francisco em tom ameaçador.

Apesar das cartas, comunicados e relatórios enviados a Brasília, as autoridades pelo que parece não estão dando ouvidos.

A omissão do governo federal está obrigando as autoridades locais a buscar uma solução doméstica na falta de uma ação mais intensa por parte do Itamaraty (responsável pela política exterior) e o Ministério da Justiça, o qual estão subordinados a Funai e a Polícia Federal.

No último dia 20, o prefeito de Benjamin, Amauri Maia e o alcaide (prefeito) de Islândia, Demostenes Alarcon Zamora, vizinha a Benjamin, foram à comunidade apaziguar os dois grupos, 11 famílias de brasileiros e outras 11 de peruanos.

Não conseguiram o objetivo já que os peruanos, segundo um dos líderes do grupo brasileiro Afonso Pereira dos Santos, se ausentaram da comunidade.

Sem acordo

A presença de Demostenes Zamora tinha por objetivo servir de 'mediador' entre seus compatriotas peruanos.

Em pouco mais de uma hora de conversação com o grupo brasileiro, eles perceberam o 'clima de pé-de-guerra' entre os dois grupos. Os brasileiros alegam que os peruanos querem expulsá-los das terras, tomando-lhes as roças de subsistência.

Um dos moradores da comunidade, AfonsoPereira dos Santos, afirma que os peruanos chegaram há pouco mais de um ano na comunidade.

Das 11 famílias, apenas cinco têm documentos obtidos em cartórios da região, atestando nacionalidade brasileira.

O presidente da comunidade, Nuzenildo Tosta de Souza, 24, assegura que os peruanos vieram das comunidades peruanas existentes ao longo do rio Javari, que divide os dois países.

Em 1999, o então escrivão do cartório da comarca de Benjamin Constant, Etadeus Cordeiro, foi afastado de suas funções. Motivo: ele expedia certidões de nascimento a peruanos, dando-lhes acesso aos benefícios do INSS. Depois de dois anos, o serventuário da Justiça sofreu apenas uma punição de 60 dias de afastamento das funções.

Território peruano

Os conflitos entre os brasileiros, supostos índios cocama e peruanos, acabam batendo na porta mais próxima, ou seja a delegacia de Polícia, Prefeitura Municipal e escritório da Funai em Tabatinga.

Segundo o prefeito José Amauri Maia, o movimento pela reivindicação do reconhecimento e demarcação de terras indígenas na região, tem como um dos epicentros, a comunidade de Sapotal.

"Andam espalhando que toda a margem direita do rio Solimões desde Tefé até Benjamin, pertence ao Peru", afirma.

De fato uma carta datada de 23 de outubro deste ano, assinada pelo Francisco Guerra, assinala ao justificar a pretensão de querer o reconhecimento dos cocama, alega que o território peruano se estendeu até o município de Tefé. Ele se refere ao período da colonização e expansão do território brasileiro pelos portugueses, ainda à época do Tratado de Tordesilhas.

Segundo o prefeito, os peruanos chegam em território brasileiro e se instalam nas comunidades ribeirinhas. Em princípio desenvolvem um clima de harmonia com os brasileiros e depois já com o domínio no local e apoiados pelos parentes que chegam depois, começam a fomentar o clima de animosidade, a exemplo do que ocorre em Nova União.

Mais combustível

Por outro lado um ingrediente leva mais ainda ao acirramento dos ânimos nas comunidades. Por falta de um entendimento, os supostos 'cocama', insistem em fazer valer sua etnia, atribuindo a antropóloga Luciana Ramos, o reconhecimento pela etnia, usando isso como principal argumento para requererem documentação da Funai reconhecendo-os como índios.

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