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Peixes consumidos pela população em 6 estados da Amazônia têm contaminação por mercúrio, indica estudo

g1 RR - https://g1.globo.com/rr/roraima/noticia/2023/05/30/
30 de Mai de 2023

Peixes consumidos pela população em 6 estados da Amazônia têm contaminação por mercúrio, indica estudo
Pesquisa inédita sobre níveis do metal tóxico em peixes consumidos pela população da região mostra que Roraima tem pior índice: 40% de contaminação acima dos nível tolerado. Pesquisadores veem problema de saúde pública e atribuem a garimpos ilegais que usam o metal para separar ouro de outros sedimentos.

Por Valéria Oliveira, g1 RR - Boa Vista
30/05/2023

Ao todo, foi identificado que peixes vendidos a consumidores que vivem no Acre, Amapá, Amazonas, Pará Rondônia e Roraima chegam às mesas das famílias com altos níveis de mercúrio - para os pesquisadores, essa alta tem relação com o avanço de garimpos de ouro. Foram coletadas amostras de 80 espécies de peixes em todas as capitais destes estados e de outros 11 municípios do interior.

A Organização para Alimentação e Agricultura das Nações Unidas (FAO/WHO) e a Agência de Vigilância Sanitária brasileira estabelecem teor de 0,5 micrograma por grama. Essa foi a base de cálculo usada no estudo para chegar ao nível de contaminação. Roraima ultrapassou de 5,9 a 27,2 microgramas esse potencial ingestão de mercúrio pela população por meio de peixes.

No estado, a pesquisa se concentrou em peixes que seriam vendidos para a população na capital Boa Vista. Pesquisadores coletaram 75 peixes de 27 espécies direto de pescadores em quatro rios: Uraricoera, Mucajaí, Branco e Baixo Rio Branco. Entre as espécies analisadas com maior contaminação estão o coroataí, barba chata, piracatinga, filhote e peixe cachorro.

O estudo denominado "Análise regional dos níveis de mercúrio em peixes consumidos pela população da Amazônia Brasileira" foi desenvolvido de março de 2021 a setembro de 2022, com amostras de 1.010 peixes coletados nos 17 municípios, incluindo as capitais. O trabalho reuniu pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz), da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA), Greenpeace, Iepé, Instituto Socioambiental e WWF-Brasil.

Para identificar o nível de contaminação dos peixes, os pesquisadores fizeram as coletas dos animais em mercados públicos, feiras-livres ou direto com pescadores - como foi o caso de Roraima. Depois, analisaram o impacto dessa contaminação na saúde humana, usando como parâmetro o consumo de peixe entre quatro grupos: homens adultos, mulheres em idade fértil, crianças de 2 a 4 anos, e de 5 a 12 anos.

"Fizemos o cálculo médio do peso corporal de cada um desses grupos, avaliamos o consumo estimado padrão em grama por dia de pescado. Baseado nos níveis de mercúrio detectados, chegamos ao número que é uma estimativa da ingestão média diária de mercúrio. Com base nessa ingestão, comparamos esse número calculado com uma outra referência de ingestão", explica o pesquisador da Fiocruz, Paulo Basta.

O levantamento tinha como ideia avaliar qual o risco para a saúde humana em caso do consumo de peixe contaminado por mercúrio. O resultado em todas as regiões analisadas coloca em alerta a saúde pública, avaliação os pesquisadores.

Os pesquisadores afirmam que é necessário que o governo brasileiro desenvolva políticas públicas e programas que visem a garantia da segurança alimentar das populações mais afetadas, respeitando a soberania alimentar e o modo de vida de casa região.

"Este é o primeiro estudo que avalia os principais centros urbanos amazônicos espalhados em seis estados. Ele reforça um alerta para um assunto já conhecido, mas não resolvido, que é o risco à segurança alimentar na região amazônica gerado pelo uso de mercúrio na atividade garimpeira. É preocupante que a principal fonte de proteína do território, se ingerida sem controle, provoque danos à saúde por estar contaminada", ressalta Decio Yokota, coordenador do Programa de Gestão da Informação do Iepé.

Do total geral de peixes estudados, 110 eram herbívoros, 130 detritívoros, 286 onívoros e 484 carnívoros. Os carnívoros, mais apreciados pelos consumidores finais, apresentaram níveis de contaminação maiores do que as espécies não-carnívoras.

A análise comparativa entre espécies indicou que a contaminação é 14 vezes maior nos peixes carnívoros, quando comparados aos não-carnívoros

Riscos à saúde
Altamente tóxico, o mercúrio é usado por garimpeiros que atuam ilegalmente na Amazônia durante a exploração de ouro, principalmente em territórios indígenas, como a Terra Yanomami. O metal é utilizado para separar o ouro de outros sedimentos e, assim, deixá-lo "limpo".

Depois desse processo, o mercúrio é despejado no ambiente e, sem qualquer cuidado, e se acumula nos rios e entra na cadeia alimentar por meio da ingestão de água e peixes.

Como consequência, o mercúrio no organismo pode causar graves problemas de saúde que afetam o sistema nervoso (potencial neurotóxico), fica retido no organismo devido à capacidade de bioacumulação, além disso, a concentração aumenta em cada nível da cadeia alimentar.

Considerando a população de Roraima, o estudo indicou que estão mais vulneráveis à contaminação mulheres em idade fértil, que estariam ingerindo até oito vezes mais mercúrio do que a dose indicada, e crianças de 2 a 4 anos, com até 27 vezes mais do que o recomendado.

"Estamos diante de um problema de saúde pública. Sabemos que a contaminação é mais grave para as mulheres grávidas, já que o feto pode sofrer distúrbios neurológicos, danos aos rins e ao sistema cardiovascular. Já as crianças podem apresentar dificuldades motoras e cognitivas, incluindo problemas na fala e no processo de aprendizagem."

"De forma geral, os efeitos são perigosos, muitas vezes irreversíveis, os sintomas podem aparecer após meses ou anos seguidos de exposição. É urgente a criação de políticas públicas para atender as pessoas já afetadas pela contaminação por mercúrio e medidas preventivas, de controle de uso", reforça Basta.

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