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Parque sitiado

FSP, Revista da Folha, p. 20-21
18 de Jan de 2009

Parque sitiado
Pico do Jaraguá assiste à cidade chegar aos seus limites e à invasão de um público que troca o famoso mirante pelas churrasqueiras
por Gustavo Fioratti

A famosa vista panorâmica do pico do Jaraguá, que em dias limpos contempla toda a cidade e a serra do Mar, está tendo que dividir atenção com outros atrativos. O parque tem batido recordes de público, só que boa parte dos visitantes vai fazer uso de suas churrasqueiras. Não raro, a área dos quiosques fica mais cheia do que o próprio mirante. Até festinhas de aniversário se tornaram comuns aos fins de semana.
Sanado o problema de favelas que invadiam a área de preservação ambiental -hoje as delimitações de seus 500 hectares estão protegidas por alambrados-, a administração do Jaraguá tem à frente um novo desafio. O parque foi criado em 1961 para ser reserva florestal, mas seus usuários estão à procura de um clube urbano. "Por causa da falta de opções de lazer no bairro, tem gente pedindo criação de quadras esportivas e pistas de skate, por exemplo", diz o diretor do parque, Vladimir Arraes de Almeida.
A visitação aumentou em 50% de um ano para cá. Em 2007, era de no máximo 10 mil visitantes por fim de semana. Esse número, hoje, chega a 15 mil. Os frequentadores são, em geral, moradores do bairro do Jaraguá, cuja expansão cercou a área florestal por completo. "Não dá para barrar gente na porta. Estamos pensando em investir em uma visitação de outra qualidade, focada em educação ambiental", explica Vladimir.
A quantidade de comida levada ao parque e o lixo acumulado -no domingo, especialmente- são alguns dos principais problemas apontados pela gestão. A equipe responsável pela limpeza costuma encher, de domingo para segunda, 150 sacos de cem litros com lixo orgânico e reciclável. "É muita coisa para um parque que se propõe a ser um ponto de contemplação da cidade e da natureza", contesta Vladimir.
Para o taxista José Carlos Ferreira Felipe, que frequenta o parque há 35 anos, o fim de semana, ali, já não é mais tão atraente. "Ficou difícil encontrar um cantinho para o churrasco. E, mesmo com tantas lixeiras, tem gente que joga lixo no chão", reclama.
Macacos me mordam
As reuniões atraem também uma espécie de convidado inusitado: os macacos-pregos, que lá são apelidados de "macacos-pragas". Não são nativos daquela mata e se multiplicaram sem controle. São originários do Norte e do Nordeste e foram apreendidos em operações antitráfico de animais silvestres. "Causam desequilíbrio ecológico, mas ainda não fizemos um estudo para saber o impacto", diz Vladimir.
Os bandos divertem os visitantes, ao menos quando não roubam a comida do banquete alheio. "Já vi macaco estudando a lata de lixo para entender como é que elas abrem", diz Bárbara Gambaré dos Santos, 27, uma das monitoras do parque. "Também existem casos de animais que mordem os visitantes", afirma. A orientação é para que não se ofereça comida aos bichos.
Apesar de a visitação estar acima do esperado, as trilhas do parque e os seus mobiliários encontram-se bem conservados. A mata secundária continua fechada e exuberante. Há 30 anos, a área era um descampado. A degradação causada por mineração e queimadas pode ser vista em fotos daquela época. Três décadas depois, o verde conseguiu se regenerar. Hoje, mais de 300 espécies de aves habitam aquele pedaço.
De segunda a quinta, a tranquilidade predomina. Ao som dos pássaros e das folhagens, junta-se um longínquo ruído da cidade, de carros que sobem a estrada dos Bandeirantes e o Rodoanel. Nada que impeça o contato com a natureza.
A Trilha do Silêncio, adaptada para cadeirantes e cegos, só não faz jus a seu nome por conta de um único motivo: o burburinho de um riacho e o som dos pássaros. É um ponto utilizado por quem pratica meditação. Um recanto que, mesmo aos fins de semana, preserva um pouco da paz natural dessa preciosa vista para a cidade.

FSP, 18/01/2009, Revista da Folha, p. 20-21

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