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Parlamentares e ativistas apontam caminhos em 2004

Carta Maior
21 de Jan de 2004

Parlamentares e ativistas apontam caminhos em 2004

Mesmo que algumas contradições na condução da política ambiental do governo Lula, observadas no ano passado, persistam no início de 2004, o trabalho político desenvolvido pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ainda é objeto da esperança de uma parte significativa dos parlamentares e ativistas ligados à causa ambiental.

Maurício Thuswohl - 21/1/2004

Rio de Janeiro - Mesmo que algumas contradições na condução da política ambiental do governo Lula, observadas no ano passado, persistam no início de 2004, o trabalho político desenvolvido pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, ainda é objeto da esperança de uma parte significativa dos parlamentares e ativistas ligados à causa ambiental. Para aqueles ouvidos pela Agência Carta Maior, este ano será decisivo também na área ambiental, pois o governo deverá definir logo nos primeiros meses os rumos a serem tomados em questões revestidas de grande importância e valor simbólico, como a política de biossegurança, a criação de um programa nacional de saneamento básico, a preservação dos remanescentes de Mata Atlântica e o desenvolvimento da Amazônia.

Alguns desafios que a ministra colocou para si ao tomar posse há um ano ainda permanecem na agenda, como afirma o deputado federal João Alfredo (PT-CE), líder da bancada ambientalista do partido: "Os principais desafios da ministra permanecem este ano, pois ainda estão em aberto questões como, por exemplo, a aplicação da transversalidade da política ambiental em todas as esferas da administração", disse, lembrando que Marina Silva viveu "uma disputa em 2003" com outros setores do governo: "As posições defendidas pelo Ministério do Meio Ambiente são contraditórias às posições defendidas pelo ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues. Isso ficou explícito no embate sobre a liberação da soja transgênica", disse.

Para Rubens Born, que é coordenador do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais (FBOMS) e do Instituto Vitae Civilis, o governo poderia ter sido "mais efetivo" na implementação de algumas políticas ambientais em 2003. Ele afirma que as entidades de defesa do meio ambiente "aguardam com expectativa a performance do governo" em 2004: "Um grande desafio para o MMA é colocar em prática este ano algumas propostas da Agenda 21 brasileira, que não andou para a frente em 2003. Outro é implementar algumas das ótimas propostas levantadas durante a Conferência Nacional de Meio Ambiente", acredita.

Ambientalistas esperam ter mais participação
Uma maior participação daqui para a frente nas discussões e deliberações sobre a política ambiental do governo também é reivindicada pelos ambientalistas: "Os movimentos sociais têm que participar do processo de discussão de uma maneira mais tranqüila. Apesar da ótima relação com o MMA, em vários momentos do ano passado nos sentimos acuados no contato com o governo", afirma a assessora de políticas do Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos. Ela afirma que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva pôde conhecer melhor as entidades ambientalistas em seu primeiro ano de governo: "Dois mil e três mostrou que o movimento ambientalista não é irresponsável, nem ligado a setores conservadores que torcem pelo fracasso do governo petista. O presidente nos conheceu melhor e sabe que compartilhamos das mesmas preocupações e objetivos", disse.

Coordenador da Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA) e do movimento de ecologia social Os Verdes, Pedro Graça Aranha aposta numa maior participação da sociedade civil na elaboração da política ambiental do governo: "Temos espaço no governo, principalmente no MMA, para fazer valer nossas posições. Mesmo que haja recuo nas matérias que estão em discussão no Congresso, como os projetos de lei da Biossegurança e da Mata Atlântica, teremos perdido batalhas, mas não a guerra", acredita. Para Adriana Ramos, o governo já demonstrou sua boa vontade ao convidar representantes da sociedade civil para elaborar um relatório sugerindo políticas públicas para conter o desmatamento na Região Amazônica: "O relatório foi muito bem feito, apontando possíveis soluções para áreas críticas, como as margens da BR-163 (Cuiabá-Santarém), por exemplo. Resta saber se o governo vai adotá-lo de fato".

Saneamento básico entrará na pauta
Crítico tenaz da política ambiental de Lula - acabou saindo do PT - o deputado federal Fernando Gabeira (sem partido-RJ) aponta como "tarefa primordial" do governo em 2004 o esforço pela aprovação da Lei de Recursos Hídricos, cujo projeto é de sua autoria. O deputado teme que o anunciado megaprojeto de transposição das águas do rio São Francisco desvirtue a política de recursos hídricos do governo: "Com a aprovação da lei, vamos garantir a criação de comitês de bacia, com representantes da sociedade civil, em todo o país. No caso do São Francisco, é impossível pensar seriamente em transposição das águas sem um programa prévio de revitalização do rio, o que só pode ser garantido pelo comitê de bacia", afirma.

Gabeira cita também a necessidade de consolidação de uma "política eco-urbana" para todo o Brasil: "O governo vai dispor do dinheiro liberado pelo FMI para obras de saneamento básico, e este é o momento propício para avançarmos. O problema é que, em ano eleitoral e com a base do governo cada vez mais larga, não sabemos se esses recursos serão utilizados corretamente. Obras de infra-estrutura de saneamento não t\êm grande visibilidade e não atraem muitos votos", opina. Para Rubens Born, o MMA deve procurar estabelecer uma parceria com o Ministério das Cidades para implementar projetos de saneamento básico: "É preciso definir políticas públicas para limpeza urbana, controle de resíduos sólidos, transportes e conservação dos espaços ambientais urbanos", enumera.

Para Marina, CNMA pode ser marco de mudança
A ministra Marina Silva define 2003 como um ano de mudanças históricas, e cita a realização da 1ª Conferência Nacional de Meio Ambiente, realizada em Brasília no mês de novembro, como marco destas mudanças: "A ação do setor público em relação às políticas ambientais no Brasil sempre foi errática. A CNMA representa uma mudança de rumo histórica nessa trajetória, pois expressa uma visão sócio-ambientalista do processo. O sentido da primeira conferência foi ser um pacto entre governo e sociedade para construir a alternativa do desenvolvimento sustentável", afirma.

O valor político da CNMA também é reconhecido por parlamentares e ambientalistas. Para o deputado João Alfredo, a conferência representou o maior sucesso da área ambiental do governo no ano passado: "Além da grande participação de delegados de todo o país, a CNMA explicitou o apoio maciço dos movimentos sociais a Marina e ajudou a afirmar a posição da ministra junto ao presidente Lula", acredita. O ambientalista Pedro Graça Aranha acha que a CNMA "fechou o ano com chave de ouro", apesar das dificuldades enfrentadas pela ministra em 2003: "Graças à conferência, temos, com a tarefa de fortalecer o Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama), perspectivas melhores para 2004".

O fortalecimento do Sisnama é citado por Marina Silva como fundamental para a implementação das políticas do governo: "O Sisnama é o coração da malha integrada de ações nos três níveis de governo e, ao mesmo tempo, é o ponto de apoio basilar para a participação da sociedade na elaboração e implementação de políticas públicas sócio-ambientais. Sua ativação plena é condição para soluções duradouras, sólidas e tecnicamente bem estruturadas, fruto de negociação e consenso obtido em ambiente de grande diversidade, visibilidade e legitimidade de interesses e idéias", afirma a ministra.

Biossegurança é primeiro teste
A votação do PL da Biossegurança, incluída na pauta da convocação extraordinária da Câmara, deve ser o primeiro teste para definir os rumos da política ambiental do governo. É grande a expectativa em torno do relatório a ser apresentado pelo líder do governo, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), relator da comissão especial que estuda o assunto: "O relatório pode conter avanços importantes, como a criação de um fundo para financiar as pesquisas realizadas sobre os organismos geneticamente modificados. Flexibilizar a pesquisa é interessante, mas isso precisa ser mais bem discutido", avaliou João Alfredo, antes da divulgação do relatório nesta terça (leia em Relator tira poder de veto da área ambiental). Segundo Fernando Gabeira, os deputados devem chegar a um texto de consenso, apesar das diferenças de posição: "Poderemos ter um recuo ou outro, mas também teremos avanços no relatório, como a inclusão do item sobre clonagem terapêutica". Ele aposta que a polêmica não acabará após o envio do PL para aprovação no Senado: "A disputa não se encerrará, resta saber se o governo vai ceder às pressões dos ruralistas e do agronegócio", afirma. Para Adriana Ramos, o texto enviado pelo governo pode ser melhorado no que se refere ao incentivo e à regulamentação da pesquisa desde que "garanta os pressupostos do princípio da precaução". Ela também sofre com a possibilidade de mudanças na lei por parte do governo: "Esperamos que a questão da biossegurança não seja passível de mudanças de rumo por conta dos ajustes políticos que o governo vem fazendo".

Agência Carta Maior, 21/01/2004

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