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PARECER Nº , DE 2003

Diário Oficial da União-Brasília-DF
04 de Abr de 2003

Da COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO, JUSTIÇA E CIDADANIA, a título de subsídio ao Senhor Presidente do Senado Federal, para pronunciamento na condição de Membro do Conselho de Defesa Nacional, acerca do Ofício "S" no 6, de 2003 (no 92-GSIPR/SAEI, de 18 de fevereiro de 2003, na origem), do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e Secretário-Executivo do referido Conselho, o qual trata de projetos de decretos que objetivam homologar as demarcações administrativas das terras indígenas de Jacamim, Waiwái, Moskow, Muriru e Boqueirão (RR), Badjonkôre (PA) e Cuiú-Cuiú (AM).

RELATOR: Senador ROMERO JUCÁ
I - RELATÓRIO

Esta Comissão do Senado Federal é chamada a emitir Parecer, com objetivo de subsidiar o Senhor Presidente do Senado Federal, para pronunciamento, na condição de Membro do Conselho de Defesa Nacional, acerca do Ofício "S" no 6, de 2003 (no 92-GSIPR/SAEI, de 18 de fevereiro de 2003, na origem), do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e Secretário-Executivo do referido Conselho, o qual trata de projetos de decretos que objetivam homologar as demarcações administrativas das terras indígenas de Jacamim, Waiwái, Moskow, Muriru e Boqueirão (RR), Badjonkôre (PA) e Cuiú-Cuiú (AM).

Dada a relevância da matéria, e tendo em vista o disposto no art. 91, § 1o, inciso III, da Carta Magna de 1988, e no art. 3o, parágrafo único, da Lei no 8.183, de 11 de abril de 1991, o Excelentíssimo Senhor Presidente da República decidiu ouvir o Conselho de Defesa Nacional sobre a proposta em questão, mediante consulta individual aos seus membros. Incumbiu-se o Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República e Secretário-Executivo do referido Conselho de encaminhar as consultas individuais.

Na condição de membro do Conselho de Defesa Nacional (Constituição Federal, art. 91, III), o Senhor Presidente do Senado Federal foi chamado a pronunciar-se e, por considerar que sua participação no Conselho é de cunho institucional, solicitou à CCJ que se manifestasse sobre o tema (OF. SF. 149/2003).

A Consulta é instruída com uma série de documentos de caráter técnico, que delimitam as áreas a serem demarcadas, mencionando suas dimensões, características geográficas, históricas e estudos antropológicos e sociais, bem como fazem referência aos grupos indígenas beneficiados. A consulta registra, ainda, os custos referentes à demarcação e à remoção dos ocupantes não-índios, conforme estabelecido pelo art. 231, da Carta Maior.

As exposições de motivos que subsidiam os Decretos de demarcação fazem referência à necessidade de se resguardarem as citadas áreas, as quais estariam asseguradas para usufruto das sociedades indígenas. E tomam por base o art. 231 da Constituição Federal:
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1o São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2o As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
§ 3o O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.
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§ 6o São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa fé.
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II - ANÁLISE

Com o advento da Carta de 1988, foram reconhecidos a organização social, os costumes, as línguas, as crenças e as tradições de nossos povos indígenas, bem com os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam. Compete à União demarcar essas terras, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

Já o Decreto no 1.775, de 08 de janeiro de 1996, dispõe sobre o processo administrativo de demarcações das terras indígenas, com procedimentos que vão de estudos antropológicos a trabalhos técnicos geográficos e fundiários. É prevista, ainda, a indenização dos ocupantes não-índios para a demarcação.

O Poder Executivo Federal, portanto, cumpre suas obrigações constitucionais ao proceder com a demarcação dessas áreas e a devolução das mesmas aos descendentes de seus primeiros habitantes. E o Senado Federal cumpre também suas missões constitucionais em responder à referida consulta, na pessoa de seu nobre Presidente.
A demarcação de terras indígenas é assunto importante e de interesse de todos os Estados da Federação. A proposta encaminhada prevê a homologação das demarcações administrativas de cinco áreas localizadas no Estado de Roraima, uma no Estado do Pará e outra no Estado do Amazonas.

Quanto à demarcação de Badjonkôre (PA) e Cuiú-Cuiú (AM), devem ser homologadas, imediatamente, pois se tratam de áreas que estão definidas e não há, ali, problemas mais graves, no tocante à questão indígena.

Contudo, a homologação das cinco áreas de Roraima deve ser tratada à parte, para que se possa avaliar os vários pleitos das comunidades indígenas e discutir uma solução única para a questão, uma vez que, ao homologar as cinco áreas objeto deste processo, o Governo estaria, involuntariamente, contribuindo para a exacerbação dos conflitos acirrados com a possibilidade da homologação das áreas Raposa e Serra do Sol e São Marcos. Para que se tenha uma idéia das conseqüências negativas surgidas durante este debate, basta citar o pedido, por parte dos índios, da retirada, do seu espaço físico, da cidade de Pacaraima, município na fronteira do Brasil com a Venezuela.
Então, entendo que, se for concretizada, agora, a homologação dessas cinco áreas, estaremos contribuindo para aumentar o clima de conflito e, conseqüentemente, atuando contra as próprias comunidades indígenas, porque, se houver conflito, os índios sempre ficam em desvantagem.
Assim, recomendo que o Conselho de Defesa Nacional solicite ao Ministério da Justiça e à FUNAI que, em reunião com o Governo de Roraima e com os vários segmentos da sociedade, se debrucem sobre todas as pendências atinentes às comunidades indígenas do Estado de Roraima e, num processo de entendimento e de negociação, sejam resolvidas global e definitivamente.

Um aspecto que merece destaque no processado, refere-se às Notas da Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República, que corroboram com a posição acima expendida, ao enfocar, especificamente, a terra indígena de Waiwái.
Diz a nota:
No presente caso, entendemos ser aconselhável a consulta dos órgãos acima mencionados, pois, além da terra demarcada ser de extensão considerável e da presença de quarenta e oito ocupantes não-índios, há notícias, no relatório realizado por grupo técnico indicado para a demarcação (...) de que: (i) a parte sul da área demarcada situa-se muito próxima à BR-210, de onde partem estradas vicinais que, face ao incremento de políticas de incentivo à migração e ocupação de terras pelo governo local, implicam de algum modo na invasão da área demarcada; (ii) há pendências judiciais relativas às terras; e (iii) ocorre garimpagem nas cabeceiras de rios da terra demarcada. Tudo isso a ensejar a possível ocorrência de conflitos entre índios e não-índios e a demandar uma ação cautelosa a ser coordenado com o Estado de Roraima.
III - VOTO

Do exposto, opino que esta Comissão se manifeste favoravelmente à edição de decretos homologando as demarcações administrativas das terras indígenas Badjonkôre e Cuiú-Cuiú, localizadas nos Estados do Pará e do Amazonas, respectivamente, constantes do Ofício "S" no 6, de 2003, do Ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, e pelo sobrestamento da homologação das terras Jacamim, Waiwái, Moskow, Muriru e Boqueirão, no Estado de Roraima, pois devem merecer estudos mais acurados, por parte do Governo Federal, visando à solução definitiva dos casos conflituosos acima enfocados.

Sala da Comissão,
, Presidente, ,Relator

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