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Palmitos: preservação e lucro

OESP, Agrícola, p. G6
10 de Jan de 2007

Palmitos: preservação e lucro
Produtor do Vale do Ribeira ensina como cultivar espécies nobres para evitar extração na mata

Niza Souza

O juçara é conhecido como o mais nobre e saboroso dos palmitos. Falar sobre o consumo desta espécie ameaçada de extinção, entretanto, é sempre um assunto delicado. Mas não quando a conversa é com o agricultor Jorge Tuzino, de 82 anos. Andar pelos 25 hectares de seu campo experimental de palmeiras, a maioria da espécie Euterpe edulis (que produz o palmito juçara), em Miracatu, no Vale do Ribeira (SP), é como estar em plena mata atlântica.

Tuzino é defensor da preservação do palmito e disseminador de técnicas de manejo sustentável da espécie juçara. Tanto que, mesmo sem ajuda oficial, nos últimos anos ele se dedica a pesquisas para melhorar o híbrido do palmito juçara, obtido com o cruzamento do juçara com o açaí. 'É uma forma de tornar viável comercialmente a produção de palmito e também de tentar reduzir a extração ilegal.'

VANTAGENS

O produtor explica que o híbrido tem algumas vantagens, como precocidade, qualidade e quantidade. Precocidade porque a extração pode ser feita a partir do quarto ano (ante oito do juçara puro); qualidade porque o palmito híbrido herdou o sabor nobre do juçara e quantidade porque produz até quatro vezes mais.

Ao contrário do juçara nativo, que produz apenas uma haste, o híbrido dá até dois palmitos por muda. A única desvantagem é que a planta do híbrido não dá os frutos, os açaís, que também podem ser vendidos.

O produtor Tuzino ensina que, para instalar uma plantação de palmito sustentável, a melhor forma é o plantio consorciado entre a espécie açaí e a do híbrido juçara/açaí. Neste sistema a cultura principal, para daqui a sete anos, seria a fruta do açaí. Faz-se, inicialmente, o plantio das palmeiras de açaí no espaçamento de 2 por 3 metros (ruas). Entre as ruas, plantam-se as mudas do híbrido. Para cada 2,4 hectares, ele sugere o plantio de 10 mil mudas do híbrido de juçara e 4 mil de açaí.

BOA RENDA

Com essa quantidade, garante, dá para colher 20 mil hastes de palmito da espécie híbrida, já que, entre o quarto e o sétimo anos de plantio, dá duas hastes por muda. 'A indústria paga R$ 4 por palmito, o que dá uma renda de R$ 80 mil. Isso já paga todo o investimento da plantação.'

O investimento é a compra de sementes ou mudas, o preparo do terreno para o plantio e a mão-de-obra envolvida na atividade. 'O palmito não precisa de adubação, nem de pulverizações, ou seja, não tem custo de produção e nem de mão-de-obra.'

O produtor vende cada muda por R$ 1. As sementes saem mais em conta, cerca de R$ 15 o quilo (1 quilo tem entre 800 e mil sementes). Para cada 2,4 hectares, são necessários 20 quilos de semente. Mas neste caso o produtor precisa fazer a muda, o que requer construir estufas.

Após colher os palmitos do híbrido, a planta pode ser retirada, ficando apenas as palmeiras de açaí. A partir daí, no sétimo ano, o açaizeiro entra em produção. Deixando três touceiras por árvore, é possível colher em torno de 5 quilos de polpa de açaí por ano, a partir do sétimo ano de plantio. A indústria paga, em média, R$ 8 o quilo da fruta. 'E ainda há os brotos de palmito, que dão novos palmitos a cada dois anos, e as sementes.'

Tuzino conta que a idéia de desenvolver o híbrido surgiu na década de 60, quando esteve na Amazônia, onde conheceu a palmeira de açaí. 'Vi que as flores eram idênticas às da palmeira juçara', diz. O produtor trouxe algumas mudas para São Paulo. 'As abelhas fizeram a polinização e assim consegui sementes de uma nova espécie, um híbrido de juçara com açaí.'

BANANICULTOR

Antes de se dedicar às experiências com palmito, Tuzino era produtor de banana. 'O Vale do Ribeira sempre foi muito pobre e queria ajudar os produtores daqui.' Foi então que começou a prestar atenção ao palmito, nativo da mata. 'Mas queria disseminar a produção de forma sustentável e não extrativa, como ocorre até hoje', lamenta.

Além da floresta experimental, onde ensina aos produtores interessados as técnicas de manejo sustentável e produz as mudas híbridas (vende cerca de 200 mil por ano), Tuzino tem outras áreas de plantio comercial de palmito. São três propriedades com 135 hectares no total. 'Antes eram bananais', diz. 'Ainda não cortei nada, porém. Temos muitos problemas com ladrões. No ano passado derrubaram 5 mil palmeiras de minhas propriedades', lamenta.

O produtor Haruhiko Kishino, de Miracatu, foi um dos primeiros a experimentarem o plantio consorciado. 'A vantagem do sistema é a resistência ao clima', diz. 'O híbrido e o açaí agüentam lugares mais úmidos do que o palmito pupunha, que não agüenta as áreas úmidas e alagadas do Vale do Ribeira.' Por isso, ele acredita que se o produtor puder esperar no mínimo quatro anos pelo desenvolvimento da cultura estará fazendo um ótimo negócio. 'Mesmo porque o juçara, até o híbrido, tem maior valor no mercado.'

Sudoeste de SP testa alternativas
Cultivo das palmeiras juçara, real, açaí e pupunha será pesquisado
Além do Vale do Ribeira, o sudoeste do Estado de São Paulo abriga muitas áreas de mata atlântica e também sofre com a exploração ilegal da palmeira juçara. Tanto que o Pólo Regional do Sudoeste Paulista, da Agência Paulista de Tecnologia dos Agronegócios (Apta) Regional, da Secretaria de Agricultura, vem desenvolvendo pesquisas na região com objetivo de instalar um plano de manejo sustentável da espécie.

Apesar da preocupação com a extinção do juçara, a pesquisadora da Apta Cristina Fachini diz que a extração ilegal da palmeira, hoje em dia, se dá principalmente por causa do fruto da palmeira (semelhante ao açaí), e não só pelo palmito, menos valorizado do que a fruta. No Nordeste, diz ela, o quilo de açaí é vendido por R$ 5 e o palmito, por menos de R$ 1 a haste.

Para identificar as demandas dos produtores, a Apta promoveu em novembro um encontro para discutir a produção de palmito no sudoeste. 'Já tentamos desenvolver o plantio de pupunha, mas o clima aqui não é adequado, pois o pupunha não agüenta geadas', explica Cristina.

Por isso a Apta está iniciando um projeto para estudar a viabilidade da produção de outras espécies de palmito na região. 'O custo de produção de grãos está ficando muito alto, porque o solo é muito úmido na região. Por isso, os produtores buscam novas alternativas.'

Os cultivos de palmeira real também encontraram alguns obstáculos na região. Apesar da qualidade do palmito, explica o pesquisador Nelson Pires Feldberg, a variedade tem baixo rendimento industrial. Outra dificuldade apontada pelos palestrantes foi a rápida oxidação do palmito real, o que apresentaria dificuldades para o transporte até o Vale do Ribeira, onde se concentram as indústrias processadoras. 'Nossa intenção é estudar a viabilidade do cultivo das outras espécies, proporcionando ao produtor novas oportunidades de renda', ressalta.

As primeiras mudas que formarão uma vitrine tecnológica, na qual serão utilizadas as espécies juçara, açaí, pupunha e real, já estão sendo plantadas. 'Vamos avaliar o desenvolvimento de cada uma delas nas condições climáticas da região, que tradicionalmente possui clima mais frio em relação a outras regiões produtores do Estado. Já foram feitos testes de adubação, de variedades, de espaçamento e até custo de produção', destaca Cristina.

DENTRO DA LEI

O plantio e a extração do híbrido do juçara e da palmeira de açaí são permitidos sem restrições dos órgãos ambientais. Entretanto, o produtor que se interessar pela cultura do juçara nativo precisa ficar atento. O chefe da unidade de Iguape (SP) do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Eliel Pereira de Souza, explica que o palmito juçara é nativo da mata atlântica, por isso seu corte só é permitido com autorização.

Mesmo que a floresta seja plantada, o Ibama não permite o corte sem licença prévia. 'O produtor tem de elaborar um plano de manejo sustentável e apresentá-lo ao órgão licenciador do Estado (em São Paulo, o Departamento Estadual de Proteção dos Recursos Naturais - DEPRN)', diz. O DEPRN vai analisar o plantio e autorizar, ou não, a extração do palmito. 'É uma análise feita com base nas características da população da espécie na região', explica Souza.

Ultimamente, o impasse está no transporte deste tipo de espécie. Em setembro, explica Souza, o Ibama publicou uma Instrução Normativa que estabelece um novo sistema de controle sobre o transporte das essências nativas (produtos e subprodutos florestais, como o palmito juçara). No ano passado, o Estado deixou de emitir a autorização de transporte para produtos florestais, passando a responsabilidade, tanto de rodovias estaduais quanto federais, para o Ibama. 'Com a IN, o Ibama devolveu a responsabilidade ao Estado, que só quer se responsabilizar pelo transporte dentro do próprio Estado', diz Souza. 'Daí o impasse.'

FIQUE DE OLHO

A preservação do palmito juçara ajuda a manter a biodiversidade da Mata Atlântica, pois sua semente e seu fruto servem de alimento para mais de 200 espécies. A SOS Mata Atlântica, tel. (0--11) 3055-7881, indica como combater a venda clandestina

Perigo de extinção - A extração fora dos padrões de manejo adequados contribui para a extinção da espécie

Identificação - Nunca compre palmito em conserva sem rótulo

Conservação - Só compre se o rótulo indicar a presença de ácido cítrico, ingrediente indispensável para a conservação de alimentos

Certificado - Recuse palmito que não tenha registro do Ministério da Saúde e do Ibama. Verifique se o rótulo contém endereço do fabricante e telefone de atendimento ao consumidor

Medida - Palmito juçara com menos de 2,5 centímetros de diâmetro é de procedência ilegal, pois isso comprova que a árvore foi retirada precocemente

Aparência - Escolha palmito brilhante. Produtos de aparência fosca passaram por um período de cozimento inferior aos 45 minutos recomendados pelas normas de vigilância sanitária e têm grandes riscos de terem sido processados em fábricas clandestinas

Precaução - Evite palmito da espécie juçara in natura
(SERVIÇO)SAIBA MAIS:

Pólo Regional Sudoeste Paulista, tel. (0--15) 3542-1310; Ibama (Iguape), tel. (0--13) 3841-2388; DEPRN, tel. (0--13) 3841-1287

OESP, 10/01/2007, Agrícola, p. G6

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