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Países pobres longe das metas da ONU

OESP, Vida, p. A15
04 de Jul de 2006

Países pobres longe das metas da ONU
Metade da população de nações em desenvolvimento tem acesso a saneamento; objetivo até 2015 é chegar a 68%

Ricardo Westin

Apenas metade da população dos países pobres tem acesso ao saneamento básico. O problema está diminuindo - em 1990, o índice da população com acesso a rede de esgoto era de 35% -, mas o mundo ainda está longe da meta de 68% estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU) para 2015.

"É muito provável que os países do mundo em desenvolvimento não alcancem esse objetivo", lamenta a ONU em seu relatório Metas de Desenvolvimento do Milênio 2006, divulgado ontem em Genebra, Suíça.

As metas de desenvolvimento do milênio são um ambicioso compromisso firmado em 2000 por 189 países com o objetivo de reduzir ao máximo, até 2015, os principais problemas do planeta. As metas envolvem oito áreas: pobreza, educação, igualdade entre homens e mulheres, mortalidade infantil, saúde materna, combate a doenças como aids e malária, meio ambiente e desenvolvimento econômico.

O saneamento básico é um dos vários itens que compõem a meta do meio ambiente. Nenhuma das regiões pobres do mundo ainda alcançou seus respectivos objetivos (veja quadro ao lado). Os países onde a situação é mais crítica estão na África ao sul do Saara (que tem 37% da população com acesso a saneamento enquanto a meta é de 66%) e no sul da Ásia (38% da população atendida e meta de 60%).

A situação da América Latina não está entre as piores: 77% da população tem acesso a rede de esgoto (esse é o conceito da ONU para saneamento básico). A meta que precisa ser alcançada até 2015 é de 84%.

BRASIL TAMBÉM LONGE
O relatório divulgado ontem não traz dados específicos sobre o Brasil. A meta estabelecida pela ONU é de 85%. Em 2002, 75% dos brasileiros tinham acesso a saneamento básico. Em 1990, eram 70%. Se mantiver esse ritmo, o País não atingirá o objetivo.

O saneamento básico é importante porque tem relação direta com a saúde. Doenças como hepatite A, febre tifóide e a maioria das diarréias são provocadas pela falta de esgoto e água tratada.

Outro fator que faz parte da meta do meio ambiente é justamente o acesso a água potável. Nesse quesito, o Brasil é destacado de duas formas no relatório da ONU. O primeiro é o País urbano, no privilegiado grupo dos países que têm entre 91% e 100% da população com acesso a água limpa. O segundo é o Brasil rural, em situação precária, com 50% a 75% da população servida por água potável.

As metas da ONU são importantes incentivos para que os países melhorem sua situação, mas alcançá-las pode não significar o fim dos problemas. Para o engenheiro Marco Antonio Almeida de Souza, professor da Universidade de Brasília (UnB) e presidente da seccional Distrito Federal da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental, as porcentagens dão uma falsa impressão.

"Principalmente em países grandes, como o Brasil, é necessário levar em consideração os valores máximos e mínimos. As médias não dizem muita coisa", diz ele, citando como exemplos a capital federal, que tem um elevado índice de saneamento básico, e as cidades vizinhas, que têm um péssimo atendimento.

Segundo dados do Ministério das Cidades, 84% das casas de Brasília são servidas por rede de esgoto. Na vizinha Valparaíso, em Goiás, o índice é de apenas 22%.

Na opinião de Souza, é necessário considerar essas diferenças entre regiões vizinhas porque uma doença que surge num lugar que não é servido por rede de esgoto pode facilmente chegar a outro que é servido. "Mosquito da dengue e rato não respeitam limites geográficos."

Esgoto a céu aberto causa problemas de saúde em SP

EMILIO SANT'ANNA

Diarréias, febres e alergias são sintomas comuns entre as crianças que moram nos barracos ao lado do Córrego da Bicicleta, na Favela da Funerária, zona norte de São Paulo. Correndo atrás das pipas ou brincando nas margens do córrego, o contato com a água imunda é inevitável.

O mau cheiro e os ratos incomodam e, nos dias de calor, a situação fica ainda pior. Os moradores contam que nesses dias os ratos saem do córrego e andam livremente pelos montes de lixo acumulados pela rua.

O filho de Damiana Maria da Conceição, C.G.S., de 7 anos, sofre de uma alergia constante. Apesar de a mãe não deixar o garoto brincar com as outras crianças na beira da água, suas pernas e braços têm feridas que não saram. "Só pode ser por causa do rio, porque ele não melhora nunca", conta.

Damiana é dona de um pequeno bar ao lado do Córrego da Bicicleta. Moradora da favela há 25 anos, conta que há pouco tempo a situação era ainda pior. Até janeiro deste ano, existia sobre a água uma série de palafitas, destruídas por um incêndio. "Quando chovia, os barracos em cima do rio ficavam cheios de água", diz. "Era normal a criançada que mora aqui ter febre e diarréia."

Não só as crianças sofrem com a sujeira. Paralisado por um derrame, o aposentado José Miguel da Silva, de 62 anos, teve o cômodo em que mora invadido pela água em abril, quando o córrego transbordou. O contato com a água suja inflamou as feridas em sua perna. Hoje, ele conta com a ajuda das enfermeiras do posto de saúde do Parque Novo Mundo para fazer os curativos.

Desempregado há seis meses, Carlos Roberto Pereira paga R$ 150 de aluguel no quarto que divide com um colega. Como na maioria dos barracos, o esgoto de sua casa vai direto para o córrego. "Isso aqui faz mal para qualquer pessoa", diz. "Só moro aqui porque não tenho condições de ir para outro lugar."

OESP, 04/07/2006, Vida, p. A15

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