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Os homens vermelhos

Veja, Brasil, p. 72
04 de Jun de 2008

Os homens vermelhos
A Funai fotografa pela primeira vez grupo de índios que vive isolado no Acre

Marcelo Carneiro

A Funai divulgou um conjunto de fotos impressionantes que correram mundo. As imagens, feitas de um avião, mostram um grupo de índios seminus ao lado de suas malocas. Com o corpo pintado de vermelho e negro, eles apontam suas flechas na direção da aeronave. Segundo o órgão, trata-se de uma tribo de etnia desconhecida que vive isolada da civilização no Acre. A Funai sabia da existência do grupo, mas nunca havia conseguido fotografá-lo. Especialistas estimam que nos nove estados que compõem a Amazônia Legal existam ainda hoje quase setenta tribos de índios isolados - ou seja, que rejeitaram ou não tiveram nenhum contato com não-índios. A política da Funai em relação a esses grupos é de não-interferência.
Não foi sempre assim. No começo do século passado, o marechal Cândido Mariano da Silva Rondon, incumbido de mapear as então desconhecidas terras ao norte do país, travou os primeiros contatos - pacíficos - com índios isolados da região. A partir dos anos 40, os sertanistas Orlando e Cláudio Villas Boas deram fama à causa indigenista também por descobrir tribos que viviam nos confins da Amazônia - e estabelecer relação com elas. Eram, no entanto, iniciativas de caráter antropológico. Mais tarde, no auge do milagre econômico, na década de 70, a decisão do governo militar de abrir estradas para integrar a região amazônica ao restante do país arrastou tratores em massa para a selva. Como algumas das rodovias cruzavam terras habitadas por índios, surgiram conflitos. Diante disso, os sertanistas da Funai foram chamados para atuar na região em "frentes de pacificação". Ocorre que, quando as expedições chegavam ao canteiro de obras, já encontravam uma situação conflagrada - o que, mais de uma vez, resultou em tragédia.
Há quarenta anos, quase duas dezenas de integrantes de expedições que tentavam contato com os uaimiris-atroaris, em Roraima, foram assassinadas pela tribo. O contato entre brancos e índios isolados também se mostrou devastador para os últimos. Entre 1970 e 1974, em Mato Grosso, a população de 400 índios da etnia crenacore foi reduzida a 79 integrantes. A maior parte das mortes foi causada por doenças transmitidas por brancos. "A experiência traumática influenciou essa geração de sertanistas que hoje defende o isolamento", diz o antropólogo Beto Ricardo, coordenador do Instituto Sócio-Ambiental. Os índios do Acre jamais demonstraram interesse pela civilização - eles teriam, inclusive, saído de território peruano para evitar atrito com madeireiros ilegais. Não há motivos para incomodá-los.

Veja, 04/06/2008, Brasil, p. 72

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