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ONU: comunidades indigenas nao se beneficiam com o desenvolvimento

O Globo, Economia, p.20
16 de Jul de 2004

ONU: comunidades indígenas não se beneficiam com o desenvolvimento
Relatório alerta para risco de deixar populações autóctones à margem
Deborah Berlinck
Correspondente
PARIS. Lutar contra a diversidade cultural - excluindo grupos ou tentando unificar um país em torno de uma identidade étnica, lingüística ou religiosa - provoca efeito oposto: conflito. Essa é a principal mensagem do relatório da ONU para o Desenvolvimento Humano, divulgado ontem na Europa. No caso do Brasil e dos países da América Latina, a mensagem é clara. Segundo a ONU, as comunidades indígenas, que são 0,4% da população brasileira, mas na Bolívia representam 71 da população, não estão sendo tratadas como deveriam. E, sem eles, não há desenvolvimento pleno.
A ONU diz que um indício de exclusão dos indígenas é a desigualdade na alocação de recursos e cita o Brasil como um dos maus exemplos:
"O governo brasileiro gasta US$ 7 per capita com saúde para a população indígena, comparado com a média de US$ 33 para o resto do país", diz o relatório.
No Panamá, os índios vivem dez anos menos que o resto da população. No México, seis anos. Até nos países ricos, a expectativa de vida é diferente, sinal de tratamento diferenciado: 20 anos a menos para os índios australianos em relação ao resto da população do país; 17 anos a menos para os canadenses; e 11 anos a menos para os da Nova Zelãndia.
Indígenas não participam de exploração de recursos
Os 300 milhões de indígenas existentes em 70 países, em geral, têm menos acesso à educação e têm baixos índices sociais. Nem sempre eles são minoria: na Bolívia e Guatemala, são mais de 50% da população. O relatório diz claramente que a "distância não é desculpa para o fracasso em levar serviços (para as comunidades indígenas), já que infra-estrutura em exploração madeireira e mineração é levada aos cantos mais remotos da bacia amazônica".
Segundo a diretora do relatório, Sakiko Fukuda-Parr, um dos problemas é a exploração de recursos nas terras indígenas, sem que as comunidades participem ou se beneficiem.
"O que estamos dizendo é que não se pode reprimir ou negar (a existências das comunidades indígenas). Porque se reprimir, isso voltará à tona. A velha forma de fazer as coisas, em que multinacionais entravam e ignoravam (os indígenas), não dá mais certo. Um dia eles vão se rebelar ou se tornar violentos. Isso já aconteceu no Peru, no Alasca, no Canadá e na Austrália. E, por causa disso, já há um debate em vários países sobre como lidar com isso".
No Peru, governo e empresas envolvem os indígenas no processo de decisão para exploração de zinco e cobre desde 2001. Na Austrália, uma empresa exploradora de ferro fez uma joint venture com os aborígenes. Bangladesh hoje reconhece o direito das comunidades indígenas aos recursos biológicos. Fukuda-Parr não quis comentar se, no caso do Brasil, os índios deveriam ter algum controle sobre os recursos naturais, alegando que não conhece o caso em detalhes.

Globo, 16/07/2004, p. 20

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