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ONGs comemoram aprovação de estatuto

OESP, Nacional, p. A9
Autor: SANTOS, Edson; MIRANDA, José Carlos
11 de Set de 2009

ONGs comemoram aprovação de estatuto
Entidades de defesa dos direitos dos negros minimizam recuo em pontos relacionados a quilombolas e a cotas

Moacir Assunção

As entidades do movimento negro, de uma maneira geral, comemoram a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial na Câmara dos Deputados. A avaliação das organizações negras é de que, embora tenha havido um recuo nas questões polêmicas relacionadas aos quilombolas e às cotas, em termos estratégicos, foi muito importante aprovar a legislação, que tramita há dez anos. "É melhor um estatuto não tão perfeito, mas aprovado, do que um perfeito engavetado", resumiu o diretor-geral do Educafro, rede de cursinhos pré-vestibulares para jovens negros, frei David dos Santos. A presidente do Conselho Estadual da Comunidade Negra de São Paulo, Elisa Lucas Rodrigues, foi no mesmo tom.

"A aprovação do estatuto é um grande passo para a solução das questões raciais no Brasil. Há aspectos a serem corrigidos, mas a nossa análise sobre o momento é totalmente positiva", afirmou ela. Elisa, que esteve na Câmara acompanhando a votação, disse que a aprovação foi uma surpresa. "Sinceramente, não esperava que passasse, já que havia vários sociólogos defendendo a tese segundo a qual as cotas, por exemplo, representam a racialização da sociedade brasileira."

Na opinião de David, a exclusão de temas como a definição de áreas quilombolas e as cotas do estatuto pode, no fim das contas, até se converter em algo favorável para os movimentos. "Com isso, o pessoal vai ter de se articular para aprovar a legislação que trata desses temas específicos. A sinalização do movimento nesses casos é de que vamos concentrar nossas energias na aprovação da Lei 73/99, das cotas, e da que diz respeito aos quilombolas", afirmou David.

PRESSÃO

O presidente da comissão de combate ao racismo do PT paulista, Cláudio Aparecido da Silva, também elogiou a aprovação da lei. "Este foi um marco histórico para o movimento negro no Brasil." Segundo David, a aprovação do estatuto envolveu uma forte pressão sobre o DEM, o partido que mais lutou contra o projeto. Foram enviadas cartas aos partidos democratas do mundo questionando a posição da legenda e organizado um protesto em frente à sede do partido.

''Foi um momento de grande importância''

Entrevistas - Edson Santos: ministro da Igualdade Racial

Moacir Assunção

O ministro Edson Santos, titular da Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, considerou "uma vitória" a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial. Titular da secretaria desde a queda da ex-ministra Matilde Ribeiro, Santos, ex-deputado pelo PT do Rio e ex-vereador, afirmou que a supressão de dois artigos - dos 72 que compunham o projeto original - não desfigurou a proposta. O fato de a legislação ter sido aprovada em caráter terminativo, o que significa que será encaminhada diretamente ao Senado sem passar pelo plenário da Câmara, também é positiva, na visão do ministro.

Não representa um problema, para o senhor, a supressão do artigos que versavam sobre os quilombolas e as cotas?

Não. O projeto não regulamentava as terras de quilombolas, apenas definia o que é uma terra de quilombos. Com relação às cotas, há um projeto específico tratando do tema e elas foram asseguradas como princípio no estatuto, devendo ser regulamentadas em projeto específico. Não houve recuo algum no que diz respeito a esses assuntos.

Sua avaliação, então, é de que a aprovação do estatuto foi de fato uma vitória?

Sem dúvida, foi um momento de grande importância para a comunidade negra. Agora, uma vez indo ao Senado, a nossa expectativa é de que o projeto seja definitivamente aprovado até o fim deste ano. Acreditamos que não haverá problemas, até porque o projeto original, o PL 6264, começou no Senado.

O senhor considera que o movimento negro ficará satisfeito com o estatuto?

Acho que sim. Houve uma mudança de postura de setores que eram contra o estatuto e nem o discutiam. O próximo passo é criar a estrutura em Estados e municípios para desenvolver políticas públicas no sentido de promover a igualdade racial em seus respectivos âmbitos, não só contemplando os movimentos negros, como a sociedade em seu todo.

''Dividir em raças é ideia reacionária''

José Carlos Miranda: coordenador nacional do MNS

Moacir Assunção

Coordenador nacional do Movimento Negro Socialista (MNS), a única das entidades ligadas ao movimento negro que é contrária à implementação das cotas raciais, José Carlos Miranda, vai na contramão das demais organizações. Militante do PT e ex-integrante do Diretório Estadual de São Paulo, Miranda classificou de "um enorme equívoco" a aprovação do Estatuto da Igualdade Racial pelo Congresso. Eis a entrevista:

O que significa, em sua opinião, a aprovação do estatuto?

A lei consagra as políticas racialistas que conspiram contra a união nacional, ao dividir a população em raças. É uma ideia reacionária, ao contrário do alardeado, e totalmente anticientífica.

Qual é o principal problema do projeto, para o senhor?

Se nós reclamávamos das cotas nas universidades, o que foi aprovado, com cotas nos empregos, é ainda mais danoso. Daqui a pouco, teremos sindicatos só de brancos e sindicatos só de negros, o que contraria tudo o que foi feito no Brasil para unir a população até hoje. O que ficou demonstrado, também, é que os movimentos racialistas, boa parte ONGs subornadas por verbas públicas, mantiveram a cota nas universidades em outro projeto. Haverá uma audiência pública sobre o tema, para o qual só foram convidadas as entidades favoráveis à medida.

Há algo mais a ser questionado em torno desse tema?

Também discordamos da forma como se deu a aprovação, por acordo, sem a participação dos deputados em plenário, até para que soubéssemos qual a opinião deles sobre o assunto. Toda vez que esse tema é discutido, a aprovação ocorre assim, sem transparência ou participação popular.

O que o Movimento Negro Socialista pretende fazer agora?

Nós vamos à luta no Senado, para impedir a aprovação dessa proposta. Acho que nem o próprio presidente Lula entendeu o alcance do projeto. Somos contra a ideia de raça, que trará muitos problemas ao Brasil.

OESP, 11/09/2009, Nacional, p. A9

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