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ONG paralisou obras de Jirau em parceria com a Odebrecht

OESP, Economia, p. B12
06 de Dez de 2008

ONG paralisou obras de Jirau em parceria com a Odebrecht
Empresa disputou e perdeu o leilão da obra em maio, e vem tentando reverter comercialmente a derrota

Vannildo Mendes

A Construtora Norberto Odebrecht e o Fórum Brasileiro de Ongs e Movimentos Sociais (FBMOS) se associaram na ação judicial que paralisou as obras da hidrelétrica de Jirau, no rio Madeira, uma das principais obras de infra-estrutura do governo Lula. Autora da ação popular, aparentemente de motivação ambientalista, a ONG transferiu ao escritório de advocacia que representa os interesses comerciais da Odebrecht em Rondônia procuração para que seus advogados também a defendessem na mesma causa: paralisar as obras de Jirau.

Sediado em Brasília, o FBMOS congrega organizações nacionais e estrangeiras ligadas ao meio ambiente. Mas seus dirigentes, Ivan Marcelo Neves e Nadja Oliveira Pegado, entregaram a causa da hidrelétrica aos advogados Clayton Conrat Kussler e Luciana Sales Nascimento, que representam a Odebrecht em negócios energéticos em Rondônia, segundo documento de "substabelecimento" registrado por ambos na 3ª Vara da Justiça Federal.

A Odebrecht disputou e perdeu o leilão da obra em maio para o consórcio Enersus e, desde então, vem tentando reverter comercialmente a derrota. Sem êxito, dispôs-se a gerir o processo advocatício da ONG , de conteúdo estritamente ambientalista. Foi a forma que encontrou de desestabilizar o consórcio vencedor da obra , integrado pela multinacional franco-belga Suez e pela empreiteira brasileira Camargo Corrêa.

A titularidade da ação em favor de Clayton e Luciana foi confirmada em 25 de novembro passado, véspera do julgamento do recurso que o governo federal moveu contra a liminar do juiz Élcio Arruda, da 3ª Vara Federal de Rondônia, que paralisou a execução das obras iniciais da usina. O "substabelecimento" (sic) é assinado por Nadia Oliveira Pegado, que, além de dirigente, é advogada do FBMOS.

Após meses de bombardeio jurídico, só na noite da última quinta-feira o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, de Brasília, suspendeu a liminar. Na decisão, o presidente do tribunal, Jirair Aram Meguerian, diz que a paralisação da obra interfere no planejamento de captação e distribuição de energia elétrica do governo, "necessidade de primeira ordem para a infra-estrutura e progresso do País".

Mas o atraso nos trabalhos trouxe prejuízos com a perda da chamada "janela hidrográfica", ou seja, o tempo necessário para início das obras antes do auge da estação de chuvas. Pivô da confusão, o FBMOS nega que tenha aceito deliberadamente a ajuda da empreiteira ou que tenha se dobrado a seus interesses. "Nossa motivação é estritamente a defesa do meio ambiente e das populações amazônicas", disse Esther Nauhaus, diretora- executiva da entidade, sem explicar a parceria registrada em cartório.

Ivan Neves, o autor da causa, disse que o substabelecimento é um "procedimento comum" entre advogados no acompanhamento de uma ação. O dirigente explicou que, embora exista há 18 anos, a entidade, que tem sede em Brasília, não tem recursos nem estrutura material para acompanhar uma ação em Rondônia e custear os deslocamentos de advogados. Informou também desconhecer que Clayton e Luciana prestavam serviços à construtora. "Não há muitas bancas de advogados disponíveis em Rondônia e a gente tem que aceitar ajuda de quem atua na área", acrescentou.

O recurso contra a liminar foi movido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), por orientação do ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc. Para o ministro, a disputa jurídica esconde um jogo político de interesses privados.

Documento obtido pelo Estado revela que, em 19 de setembro, Clayton e Luciana moveram, na 1ª Vara Cível de Porto Velho, medida judicial em nome da Odebrecht. Trata-se de ação de reintegração de posse de uma faixa ocupada por invasores dentro da área da usina de Santo Antônio, que está sendo construída pela empresa.

A direção da Odebrecht confirmou que Clayton e Luciana prestaram serviços à construtora, como contratados do consórcio Madeira Energia - Mesa. Mas explicou que os advogados não pertencem aos seus quadros, nem têm vínculos gerenciais ou administrativos com a empresa. Informou também que, no momento, eles não prestam qualquer serviço remunerado à Odebrecht.

"A Odebrecht afirma categoricamente que são infundadas as afirmações que insinuam o seu envolvimento com organizações ambientais ou seus dirigentes nas questões judiciais sobre a hidrelétrica de Jirau", afirma nota divulgada pela empreiteira. "Ao contrário, a Odebrecht nega que esteja por trás de qualquer iniciativa de terceiros, sejam eles vinculados ou não a organizações ambientais. A Odebrecht é uma empresa transparente e atua na defesa de seus interesses diretamente e nunca através de subterfúgios."

Um porta-voz da empreiteira disse ainda ao Estado que a Odebrecht é minoritária no Mesa, que também tem entre seus sócios as empresas Furnas, Cemig, Andrade Gutierrez e um fundo formado pelos bancos Banif e Santander. "O escritório foi contratado para resolver uma questão administrativa do Mesa com populações ribeirinhas. Não podemos impedi-lo de atender a outros clientes."

A construtora admitiu apenas que acompanha com interesse o desenrolar da disputa pela construção da hidrelétrica. A Odebrecht ganhou a concorrência da primeira hidrelétrica do Rio Madeira, a Santo Antônio, mas perdeu a de Jirau para o consórcio Enersus, em maio. Desde então, o leilão vem sendo questionado judicialmente e a obra não conseguiu até agora sair do papel.

Por causa das disputas, só em 13 de novembro o Ibama emitiu a licença parcial, para permitir a instalação do canteiro de obras e de uma pedreira, além do trabalho de secagem de parte do leito do rio. Mas o juiz Arruda determinou que as obras só poderiam começar quando o Enersus obtivesse licença definitiva, pois a parcial, a seu ver, não teria amparo legal.

OESP, 06/12/2008, Economia, p. B12

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