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Oficina no Alto Tiquié (AM) reúne mulheres para fazer cerâmica e pinturas faciais e corporais

Instituto Socioambiental - www.socioambiental.org.br
17 de Nov de 2008

Mulheres representando cinco associações indígenas do Rio Tiquié, noroeste amazônico, tanto do lado brasileiro quanto colombiano, participaram de evento na comunidade Tuyuka Moõpoea, para realizar atividades e registrá-las para as futuras gerações Tuyuka.

A oficina, entre 9 e 16 de outubro, reuniu aproximadamente 40 moças e mulheres das etnias tuyuka, tukano, bará, yeba mahsã e desana, das associações AEITU (Associação Escola Indígena Utapinopona Tuyuka), AEITYPP (Associação Escola Indígena Tukano Yepapirõporã), AEITY (Associação Escola Indígena Tukano Yupuri), Acimet (Associação das Comunidades Indígenas do Médio Tiquié) e Aatizot (Asociación de Autoridades Tradicionales Indígenas de la Zona Tiquié), na comunidade Tuyuka Moõpoea, no Alto Rio Tiquié, noroeste amazônico.

Promovido pela AEITU, o encontro é parte das atividades do Projeto "Gestão dos Conhecimentos para as futuras gerações tuyuka" apoiado pelo Projetos Demonstrativos Povos Indígenas (PDPI). As atividades começaram uma semana antes da chegada dos participantes, quando as alunas do Ensino Médio Tuyuka, a antropóloga do ISA, Melissa Oliveira e o líder tuyuka e assessor pedagógico indígena da Secretaria Municipal de Educação de São Gabriel da Cachoeira, Higino Tenório, foram até a comunidade Pupunha, no Tiquié colombiano, para retirar a argila necessária à realização dos trabalhos.

Encontros para gestão de conhecimentos

Desde 2006 as alunas do Ensino Médio Tuyuka vêm organizando e coordenando encontros que são parte da linha de pesquisa Numia Payare - Conhecimentos femininos relativos à alimentação e promoção da saúde, do Ensino Médio Indígena Integrado Tuyuka.

Os três primeiros haviam tematizado os conhecimentos das mulheres acerca da culinária tradicional, promovendo o preparo de alimentos e bebidas, a reflexão sobre as mudanças ocorridas na alimentação desde o tempo dos antigos até agora e os cuidados relacionados com a alimentação em períodos importantes do ciclo de vida das mulheres.

Os dois primeiros encontros realizados em agosto de 2006 e abril de 2007 contaram apenas com a participação de moças e mulheres da AEITU. Já do terceiro, realizado em novembro de 2007, participaram mulheres de outras associações do Tiquié brasileiro e das associações colombianas Aatizo e Acaipi(Asociación de los Capitanes y Autoridades Tradicionales Indígenas del Pirá Paraná), iniciando um ciclo de intercâmbio entre elas. Ainda como parte deste processo, no início de 2008, 20 moças e mulheres de três associações do Tiquié participaram de reunião promovida pelas mulheres da Acaipi que ocorreu na comunidade San Miguel, Rio Pirá-Paraná, na Colômbia(veja quadro no final do texto)

Cerâmica e pinturas corporais

Para orientar as mulheres nesta oficina de cerâmica foram convidadas três especialistas: a desana Oscarina Caldas da comunidade Acará Poço, no Médio Tiquié e a tukana Amélia Marques, da comunidade Pupunha, no Tiquié colombiano. A bará Lucila Ramirez, também de Pupunha, orientou a confecção do pigmento vermelho carajuru, (em tuyuka warosoã, em tukano uroña) especialidade bará, e da tinta preta chamada popularmente de jenipapo (wee em tuyuka e tukano), utilizadas para pintura facial e corporal. E contou com a colaboração da também bará Juscelina Olguim, que reside no Médio Tiquié.

Foi uma semana de dedicação ao aprendizado das várias etapas de confecção de peças de cerâmica - desde o preparo da argila, a modelagem da peça, alisamento (feito com pedaços de cuia), polimento (que é realizado com as pedras amarelas chamadas em tuyuka wateri peri, e em tukano watese pheri, difíceis de encontrar e que são repassadas entre as mulheres de geração em geração), até a defumação, queima, pintura, nova defumação, nova queima e finalização. Muitas das participantes nunca haviam trabalhado com argila, mas a maioria já tinha observado mãe, avó ou sogra nestas atividades, e queriam aprender.

O preparo do carajuru, desde a exposição ao sol das folhas de mesmo nome, cozimento, processamento, até a retirada de seis pedaços de pó concentrado deste pigmento vermelho, levou 5 dias. O preparo da tinta preta do jenipapo, extraída a partir do cozimento das folhas da planta, foi feito em um dia. Todas acompanharam os processos apoiando as especialistas em algumas das etapas.

As atividades de confecção de cerâmica e preparo de tintas foram intercaladas com a tematização de questões como: tipos de casca de árvore e argila utilizados na confecção de cerâmica, diferentes tipos de desenhos utilizados na pintura, as regras que envolvem a confecção da cerâmica e das tintas e as histórias de origem da cerâmica e do carajuru. O conhecedor Pedro Lima, tuyuka, marido de Amélia Marquez, contribuiu com o debate. Além disso, tanto as histórias contadas como as etapas de confecção de cerâmica e preparo de pigmentos foram registrados de forma escrita nas línguas tukano e tuyuka e por meio de desenhos.

Jornal e festa

O jornal bilíngüe, escrito em tuyuka Numiãye nirõ makañe wedemasiõripu e em tukano Numiãye nirõ kahse werekahsaripuri, que em português seria "jornal que fala sobre temas importantes para as mulheres", foi lançado durante o evento. Produzido no Tiquié e finalizado na Escola Utapinopona Tuyuka, o jornal é um espaço para que as alunas das escolas Utapinopona Tuyuka, Tukano Yupuri e Tukano Yepapirõporã escrevam sobre as experiências que estão vivenciando por meio dos encontros. O número 1 tematizou a ida das mulheres ao Pirá-Paraná.

O encerramento da oficina, no dia 15, se deu com um grande dabucuri (cerimônia de oferta) com kapiwaia (dança tradicional), em que os moradores das comunidades Tuyuka ofereceram carne de caça, farinha, artefatos de cozinha, e frutas aos professores da Escola Utapinopona-Tuyuka. Foi também um momento de aprendizagem no qual as mulheres mais velhas orientaram as mais jovens sobre como fazer pintura facial e corporal nos participantes da festa utilizando carajuru e jenipapo.

A oficina veio reforçar o movimento de articulação entre as moças e mulheres de associações do Tiquié, que se sentiram incentivadas a continuar participando dos encontros para aprimorar a prática de confecção de cerâmica e debater outros temas de seu interesse. A maior parte das cerâmicas produzidas na oficina e os pedaços de carajuru foram deixados para o acervo da Escola Tuyuka.

De mãe para filha

Em abril deste ano, um grupo de 19 mulheres, das etnias tuyuka, yeba mahsã, bará, e tukana, representantes de quatro associações indígenas do Rio Tiquié, acompanhadas por pelo coordenador do Ensino Médio da Escola Utapinopona-Tuyuka, José Ramos e pela antropóloga Melissa Oliveira, do ISA, realizou uma viagem para participar de um encontro de mulheres indígenas na Comunidade Barasana de San Miguel, localizada no Rio Pirá-Paraná (Waiya), Colômbia. O tema foi os cuidados que as mulheres devem tomar nas diferentes épocas de seu ciclo de vida, na primeira menstruação e menstruações posteriores; na gravidez, no parto e pós parto e durante a primeira infância de seu filho (período em que o bebê deixa de mamar).

Os conhecimentos relativos a esses cuidados são repassados de mãe para filha e se referem a uma série de restrições e prescrições que a moça ou mulher deve seguir: como o resguardo em relação a tarefas cotidianas como trabalho na roça e preparação de alimentos, dieta alimentar- o que ela pode ou não pode comer, atrelado a benzimentos que o kumu (benzedor) deve fazer para protegê-la nas diferentes épocas. O seu não cumprimento pode acarretar vários tipos de doenças como dores do corpo, desmaio, cólicas, palidez, dificuldades no parto e até mesmo aborto.

O evento marcou a continuidade do intercâmbio entre as mulheres do Pirá e do Tiquié, iniciado desde que as primeiras participaram de oficina de culinária promovida em Yoariwa, comunidade Tuyuka do Alto Tiquié, em novembro de 2007. A viagem durou 16 dias, período que o grupo levou para ir e voltar desde o Rio Tiquié até o curso Médio do Rio Pirá Paraná, onde fica a comunidade San Miguel.

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