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O recorde indesejável

O Globo, Opinião, p. 19
Autor: AMORIM, Alice
27 de Ago de 2016

O recorde indesejável
Se o mundo já sofre com a crise dos refugiados políticos, imaginemos quando surgirem os fugitivos climáticos?

Alice Amorim

Em tempos de Olimpíada, nos maravilhamos com a capacidade de superação dos atletas, sobretudo quando quebram recordes.
Na deslumbrante cerimônia de abertura, o cineasta Fernando Meirelles enfatizou que o aquecimento global é um dos maiores desafios da humanidade. Foi um recado oportuno para todo o mundo, porque, afinal, estamos quebrando recordes ano a ano no aumento da temperatura do planeta.
Em dezembro do ano passado, 196 países assinaram o Acordo do Clima de Paris, que estabeleceu o objetivo de limitar o aquecimento do planeta a uma medida bem abaixo de 2o C. Todos assumiram o compromisso de limitar o aumento de temperatura a 1,5oC.
Essa diferença de 0,5oC pode parecer pouco, mas, para muitos países, em particular os insulares e as ilhas do Pacífico, significa vida ou morte. Se o mundo já sofre com a crise dos refugiados políticos, imaginemos quando surgirem os fugitivos climáticos?
Para atingir o objetivo de evitar o recorde de aumento da temperatura da Terra em 1,5oC, o plantio de árvores, por exemplo, incentivado pelos atletas na cerimônia de abertura da Olimpíada, com inserção de sementes em vasos, é bem-vindo, mas não suficiente.
Tornou-se imperioso reduzir a emissão de gases de efeito estufa (GEE), o que significa acabar com o desmatamento em todos os biomas. Mais: parar de queimar combustíveis fósseis como petróleo e carvão, aumentar a participação de fontes de energia renováveis e mudar métodos de produção agrícola e na pecuária.
A partir da Olimpíada de 2016, cerca de 150 atletas de vários países vulneráveis à mudança do clima aderiram à campanha "1,5oC: o recorde que não devemos quebrar". Com extensa mobilização nas redes sociais, eles tentam estimular a humanidade nessa luta, pois são exemplos de como é possível superar toda sorte de desafios quando se tem uma combinação de planejamento, esforço e estratégia.
Sem o sonho de ganhar uma medalha, os anos e anos de treinamento árduo e renúncias dos atletas olímpicos não fariam sentido. Sem sonho e esforço coletivo para uso racional dos recursos naturais, não será possível garantir uma boa qualidade de vida a todos.
O Congresso Nacional, recentemente, deu ao governo sinal verde para a ratificação do Acordo de Paris, faltando agora só a sanção presidencial. Como país, já somos líderes na esfera internacional para combate à mudança do clima. Falta, agora, garantir a coerência entre os compromissos que assumimos lá fora, através de acordos, com as escolhas feitas dia a dia aqui dentro.
Não quebrar o recorde do aumento da temperatura do planeta em 1,5oC será difícil, sem dúvida. Mas o Brasil pode dar um passo importante, sendo o primeiro dos grandes países poluidores a ratificar o acordo histórico de Paris, antes dos Estados Unidos e da China.

Alice Amorim é sócia da ONG Gestão de Interesse Público

O Globo, 27/08/2016, Opinião, p. 19

http://oglobo.globo.com/opiniao/o-recorde-indesejavel-20002516

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