VOLTAR

O impacto da Estrada do Pacífico

Página 20-Rio Branco-AC
Autor: Juracy Xangai
08 de Mar de 2004

Acre, Pando e Maldonado discutem conseqüências da abertura de rodovia para comunidades da região

O asfaltamento da BR-317, entre Brasiléia e Assis Brasil, inaugurada há pouco mais de um ano, foi um passo marcante para conseguir realizar o sonho de levar a produção acreana até os portos do Pacífico, o que pode ser a redenção da economia promovendo o desenvolvimento regional. Esse é apenas um lado da moeda - o outro é o fato de que com a estrada também virão produtos e serviços de outros Estados com maior poder econômico e tecnológico que poderão dominar rapidamente a economia e os meios de produção existentes na faixa da estrada relegando a população da região a uma exclusão social em sua própria terra.

Essa realidade está sendo encarada de frente pelos integrantes da Região MAP (Estados de Madre de Dios, Acre e Pando) no Peru, Brasil e Bolívia respectivamente, aos quais sofrerão maior impacto da abertura dessa estrada.

Por isso, a Conferência de Imprensa do MAP-V realizada em Puerto Maldonado, na última quinta e sexta-feira que definiu a educação como prioridade no processo de integração da região MAP marca um avanço no sentido de garantir não apenas o desenvolvimento econômico para os acreanos e demais moradores da região MAP, mas e, sobretudo garantir a sustentabilidade desse sistema de maneira a que essas pessoas venham a ser beneficiadas nesse processo participando ativamente deles e não para tornar-se vítimas dele.

"Na prática, o que pesquisadores, representantes de governos e ONGs têm como compreensão geral é de que se não houver uma união de toda essa região para garantir num curtíssimo espaço de tempo os treinamentos e qualificações necessárias para que as pessoas e empresas regionais se preparem para essas mudanças que estão por ocorrer mais rapidamente do que muita gente espera, as conseqüências para a comunidade serão trágicas. Por isso educar e preparar as pessoas é a chave essencial de todo esse processo e, para isso precisamos da participação ativa não apenas dos governos estaduais e municipais desses três estados, mas e sobretudo, da própria comunidade organizada", esclareceu Elza Mendoza, que é a coordenadora da mesa de Desenvolvimento Econômico do MAP.

Cultura é fundamental

Augusto Eduardo Zavala, o alcalde (prefeito) de Tambopata, foi enfático: "Nesse momento em que discutimos a abertura desta estrada e os muitos pontos positivos e negativos do impacto que irá causar, fica claro que o mais importante é nos organizarmos, nos unirmos e trabalharmos juntos para construir uma cultura de integração baseada no desenvolvimento sustentável e na justiça social. As pessoas precisam estar conscientes para fazer bom uso dos recursos dessa natureza maravilhosa que Deus nos deu. E para conseguir tudo isso precisamos da educação como instrumento de construção dessa cultura, que é fundamental para o desenvolvimento regional que tanto desejamos".

Novos caminhos

Para o prefeito de Xapuri, Júlio Barbosa, a região MAP vive uma fase crucial. "Com certeza este é o momento de encontrarmos caminhos para a política regional a fim de aproveitar os benefícios que virão com a abertura da estrada para o Pacífico, como também para minimizar seus efeitos negativos. Ela abrirá mercado para nosso produtos florestais e nos ajudará a desenvolver o que é hoje uma das indústrias que mais cresce no mundo, o Ecoturismo. Este é o momento propício para nos prepararmos para tudo isso".

Carlos Camacho, o prefeito (governador) de Pando foi enfático em seu pronunciamento. "O governo da Bolívia considera de importância estratégica para nossa sobrevivência a união destes três estados da região MAP por entender que temos todos uma mesma luta. Como não poderíamos falar de integração de três estados que estão unidos pelo rio Acre. Juntos nós formamos uma das regiões mais isoladas, mas também, uma das mais ricas de toda a América Latina e precisamos que administrar isto com sabedoria".

Sonhar com os pés no chão

Entusiasta do asfaltamento da estrada para o Oceano Pacífico, o prefeito de Assis Brasil, Manoel Araújo, é realista e não esconde que por trás da realização desse sonho acalentado pelos acreanos há mais de 40 anos, pode vir um pesadelo caso a comunidade não seja preparada para ele. "Para nós que estamos trabalhando o desenvolvimento do Acre há uma grande preocupação de como preparar as pessoas que vivem nesta região para sobreviver ao impacto da abertura desta estrada. Porque o que queremos é que ela traga benefícios a todos, o que deve ser entendido como melhoria da produção, do comércio, da economia, enfim, das condições de vida de toda nossa gente que até hoje tem vivido isolada e excluída de tudo isso."

Ele fez questão de apresentar alguns exemplos flagrantes da situação atual dos moradores da região MAP. "Quando vinha de Assis Brasil para Maldonado, parei para abastecer numa pequena localidade e uma mulher veio nos atender trazendo na mão um balde de combustível. Gastei mais de duas horas para conseguir encontrar um compressor para completar o ar dos pneus do carro. Vi as pessoas secando castanha no terreiro das casas para tirar as amêndoas em condições de higiene precária. Prova disso é que no ano passado enviaram sua castanha para a Europa onde não pôde entrar e acabou jogada fora por causa da contaminação por aflatoxina. Agora eu pergunto, quando a estrada for aberta e as coisas se modernizarem em que vão trabalhar essas pessoas? A condição deles é como se um de nós fosse enfrentar o Popó numa luta, íamos apanhar sem defesa"

Preocupado com isso, Manuel Araújo explica que essa realidade precisa ser enfrentada de frente sem alarmismos, pois a estrada virá cedo ou tarde.

"A única solução possível para obtermos sucesso nesta missão é unir nossos três estados trocando experiências e nos ajudando uns aos outros. Temos uma região rica e um povo maravilhoso, neste momento estamos construindo no Acre o que para muitos era uma utopia mas que na prática já provou que é o melhor caminho para o desenvolvimento de nosso Estado e de toda esta região", afirmou Manoel. "O MAP é esta região em que moramos e na qual desejamos continuar vivendo cada vez melhor, mas para isso é preciso usar a educação a fim de preparar as pessoas para garantir produtividade com qualidade e competitividade para sobreviver num mundo globalizado que vai nos atingir em cheio."

Fronteiras estratégicas

O ministro do Desenvolvimento de Fronteiras e Regional, do Peru, José Berane Aranibac que participou do encontro de Maldonado quando iniciou uma viagem percorrendo toda a região MAP enfatizou; "O trabalho que se realiza aqui é muito importante para que o desenvolvimento desta região beneficie a pessoa humana. Ficamos satisfeitos ao ver, lado a lado, representantes do governo, empresários e da população organizada o que permitirá que se consiga resultados efetivos a curto prazo. Até porque, nossa população está cobrando e necessita disto com urgência".

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.