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'O governo vai enfrentar explosões cada vez maiores'

O Globo-Rio de Janeiro-RJ
25 de Jan de 2004

O professor de antropologia João Pacheco, do Museu Nacional, está decepcionado com a política indigenista do governo Lula. Ele afirma que a Funai age de maneira retrógrada e faz um alerta: se o governo não der rapidamente atenção ao problema, confrontos como os de Mato Grosso do Sul e de Roraima serão cada vez mais freqüentes:

- O governo vai enfrentar explosões cada vez maiores. Com esse indigenismo dos anos 70, não vai chegar a lugar algum.
Leticia Helena

O movimento indígena já poderia ser considerado um movimento social como o MST?

JOÃO PACHECO: No sentido positivo sim. O movimento indígena está conseguindo reunir os interesses de mais de 200 grupos. Eles já têm líderes destacados, formas de atuação eficientes, formas de pressão e formas de interlocução com os poderes públicos. Enfim, estão extremamente amadurecidos e muito presentes na cena política.

Como os índios chegaram a esse amadurecimento?

PACHECO: O movimento passou por um longo processo de mobilização e luta pela conquista de suas terras. É o caso da reserva Raposa Serra do Sol, em Roraima. Dizem que o estado não progride por causa dos índios, mas o que atrapalha é a incúria administrativa e a corrupção. É importante observar que, neste momento, os índios estão desviando a atenção do escândalo dos gafanhotos.

A política do governo para o setor indigenista é eficaz?

PACHECO: A política do governo Lula é totalmente à moda antiga e ainda acredita que o governo deve tutelar os índios. A Constituição reconheceu a capacidade civil dos índios, mas essa realidade não chegou à Funai. Hoje, a política indigenista está muito mais no espírito do Estatuto do Índio da ditadura do que no vento das mudanças pretendidas pelo presidente. O governo pode estar jogando fora uma oportunidade única de fazer mudanças que permitiriam a efetiva modernização do setor.

Além de Roraima e Mato Grosso do Sul, em algum outro estado a situação é tensa?

PACHECO: Há problemas na área dos cinta-larga, em Mato Grosso; dos ianomâmi, em Roraima; dos xucurus, em Pernambuco; e dos trucá, na Bahia.

Os avanços da Constituição de 1988 saíram do papel?

PACHECO: Abriu-se um espaço político para que os índios se organizassem e eles souberam preenchê-lo. Alguns setores enxergaram essa atividade e se associaram a ela, produzindo parcerias bem sucedidas, principalmente nas áreas de saúde, educação e meio ambiente. Mas, infelizmente, de forma geral, o governo ainda adota uma política retrógrada e estatizante.

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