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O clima, de mal a pior

O Globo, Ciência, p. 34
07 de Dez de 2010

O clima, de mal a pior
Brasil se destaca num mundo imóvel contra o CO2

Catarina Alencastro* e
Renato Grandelle

O Brasil foi o país mais bem avaliado no índice de performance sobre o combate às mudanças climáticas, divulgado ontem em Cancún pelas redes Climate Action Network e Germanwatch. O bom desempenho, porém, não foi considerado suficiente - as três primeiras posições ficaram vagas, já que nenhuma nação avaliada tem feito o suficiente para reduzir suas emissões de gases do efeito estufa. O país deve o bom resultado, em parte, ao vácuo deixado por outros grandes emissores, sem políticas efetivas para cortar CO2.
China e EUA, os dois maiores poluidores do mundo, amargaram, respectivamente, a 52ª e 53ª posições. As emissões da China foram as que mais cresceram. Os EUA de Obama não aprovam a lei de mudanças climáticas. E a Europa, antes na vanguarda da luta contra alterações no clima, recuou de suas propostas mais ousadas e congelou as discussões climáticas.
O levantamento, realizado por 190 especialistas, avalia o setor de energia de 60 nações. Juntas, elas respondem por 90% das emissões de CO2. Embora a questão do desmatamento não tenha sido analisada em detalhe, o líder do estudo, Jan Burck, disse que o fato de o governo brasileiro implementar medidas para combater o problema pesou no resultado. O levantamento, porém, ressalta que não é possível saber o quanto essa redução foi motivada pela crise financeira mundial.
- O Brasil ocupou a melhor posição no ranking, o que não significa que está fazendo o suficiente. Significa que está fazendo melhor do que outros países - pondera. - A redução do desmatamento pode servir de exemplo, mas somente se essa tendência for mantida.
Metas maiores que as recomendadas
Professora de engenharia de transportes da Coppe/UFRJ e membro da diretoria do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), Suzana Kahn diz que o Brasil precisa assumir outros compromissos:
- O que me preocupa são as modificações mais estruturais, que nos levariam para um novo modelo de desenvolvimento. Precisamos colocar o Brasil na economia verde, de baixo carbono. Isso não está acontecendo. Por mais estranho que possa parecer, quem mais aposta nesta área é China e EUA, exatamente os maiores poluidores e os que não estão nem aí para a Convenção do Clima e seus acordos - afirma ela, ex-secretária de Mudanças Climáticas do Ministério do Meio Ambiente.
Para o diretor da Coppe/UFRJ Luiz Pinguelli Rosa, que acompanha a COP-16 em Cancún, o ranking mostra como o Brasil foi catapultado ao centro das discussões ambientais.
- A Conferência de Copenhague não deu certo, mas o desempenho brasileiro nas negociações nos alçou a outro patamar - opina. - Agora, a lista mostra como nossos esforços para reduzir o desmatamento são reconhecidos. Mas o vácuo nas três primeiras posições é lamentável.
O levantamento lembra que, este ano, o Brasil anunciou uma redução de 36,1% a 38,9% nas emissões de gases-estufa até 2020. Essa meta é considerada ambiciosa, por ser superior àquela recomendada pelo IPCC para os países em desenvolvimento (de 15% a 30%). Na semana passada, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) informou que entre agosto de 2009 e julho de 2010 foram desmatados 6.451 km2, a menor taxa registrada desde o início das medições, em 1988.
*A repórter viajou a convite da CNA

Enquanto Cancún esfria, o mundo esquenta

Temperatura: Os cientistas esperam que 2010 empate com 1998 e 2005 como os anos mais quentes da História, logo em seguida a uma década (2000-2009) que foi a mais quente.

Nível do mar: O nível dos oceanos está subindo num ritmo duas vezes maior do que o registrado no século XX, já que água se expande em razão do calor e do derretimento dos glaciares.

Groenlândia: Não há dúvida que a perda de gelo aumentou e acelerou, afirma a Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera dos EUA (NOAA, na sigla em inglês). A perda de glaciares foi excepcional em 2010 e inclui uma ilha de gelo de 284 km2.

Ártico: Os quatro maiores recuos do gelo durante o verão foram registrados nos últimos quatro anos, aponta a NOAA. Especialistas acreditam que no prazo de uma década o Ártico pode perder todo seu gelo durante o verão.

Oceanos ácidos: O excesso de dióxido de carbono absorvido pelos oceanos está deixando a água mais ácida, o que danifica corais, ostras e prejudica a vida marinha que precisa dos carbonatos para gerar conchas e carapaças.
Corais: O branqueamento dos corais é provocado pelo aquecimento da água e leva à morte dos arrecifes, com consequencias para toda a vida no mar.

Extinções: Os cientistas advertem há tempos que as mudanças climáticas acelerariam o ritmo de extinção de espécies incapazes de se adaptarem à nova situação.

Agricultura: Produtores e pesquisadores concordam que as altas temperaturas dos últimos anos reduziram a produção de grãos, pois as plantas amadurecem mais rápido.

Desastres naturais: Este ano ocorreram uma onda de calor e incêndios florestais históricos na Rússia, assim como inundações que devastaram Paquistão e China. Segundo a empresa de resseguros Munich Re, as mudanças climáticas são a "única explicação plausível" para tantos desastres.

O Globo, 07/12/2010, Ciência, p. 34

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