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Novos mapas derrubam mitos

JB, Pais, p.A3
10 de Jan de 2005

Novos mapas derrubam mitos
Diagnóstico do governo aponta para regiões brasileiras em franco desenvolvimento no Nordeste e estagnação econômica no Sul
Daniela Dariano
Nem o ''Sul maravilha'' nem um Nordeste infértil. Diagnóstico realizado pelo Ministério da Integração Nacional derruba mitos e aponta para uma nova geografia brasileira, onde as áreas de estagnação e de promessa de desenvolvimento não se encontram sempre nas regiões esperadas. As dinâmicas demográficas e de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) indicam que, além de estar ocorrendo uma lenta interiorização da população nas duas últimas décadas, identificam-se áreas economicamente promissoras em regiões tidas como infecundas e outras, em estado de inércia ou decadência, presentes em regiões tradicionalmente consideradas ricas e desenvolvidas.
Para o ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, o diagnóstico, concluído no fim de 2004, servirá para orientar as ações do Plano Nacional de Desenvolvimento Regional. Apenas a renda média da população em cada microrregião, argumenta o ministro, levaria a uma visão estática e a possíveis falhas na definição do espaço prioritário para ação.
O novo mapa da situação de desenvolvimento microrregional no país foi traçado com base em informações extraídas dos Censos Demográficos do IBGE de 1991 e 2000 e as estimativas do PIB dos municípios, realizadas pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) para 1990 e 1998. O resultado do cruzamento de dados foi a identificação de áreas pobres, sim, mas em franco desenvolvimento econômico. Outras, aparentemente abastadas, apresentaram baixíssimos índices de crescimento do PIB.
Estas últimas, classificadas como média renda e baixo crescimento produtivo, se dispersam por todo território brasileiro evidenciando um problema de estagnação, conclui documento elaborado pelo ministério para pôr em discussão uma proposta de Polícia Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR). As microrregiões correspondem ''àquelas que, de certa forma, já apresentaram alguma dinâmica de crescimento passado, refletida nos seus padrões médios de renda, mas que estão atualmente estagnadas ou com baixo dinamismo'', definiu o Ministério da Integração.
As áreas dinâmicas de menor renda são, ao contrário, microrregiões em expansão econômica, embora o rendimento médio da população ainda seja baixo. Enquanto a presença dessas áreas nas regiões Sul e Sudeste é rarefeito, elas são mais freqüentes no Centro-Oeste e também no Nordeste brasileiro, contrariando a percepção de que nesta última região não há desenvolvimento.
''A interpretação dos dados dessa tipologia leva a crer que se trata de um processo de transformação no período recente, sendo relativamente fácil para a PNDR apoiar as iniciativas existentes'', aponta o documento do Ministério da Integração.
Além dessas duas situações - de estagnação/média renda e expansão/baixa renda - foram localizadas áreas de alto rendimento e, além disso, em expansão econômica. Essas não são consideradas prioritárias em termos de investimento do governo federal. A última categoria de microrregiões é, no outro extremo, a mais carente de ações governamentais: são as de baixo crescimento e baixa renda e se concentram ainda nas regiões Norte e Nordeste do país. Essas áreas, admite o Ministério da Integração, apresentam um quadro em que convergem baixos indicadores de renda aliados ao pouco dinamismo de sua base produtiva, ''o que resulta em espaços problemáticos no que se refere aos desequilíbrios inter e intrarregionais''.
No documento de proposta da PNDR, o ministério considera que a atuação do governo requer, nesse conjunto territorial, ''melhoria da articulação entre pastas'', em especial com aqueles que lidam diretamente com a questão da pobreza. Nas subregiões de renda baixa e pouco dinamismo econômico, afirma, ''se faz necessária forte articulação da Política Nacional de Desenvolvimento Regional com as políticas sociais, uma vez ser insuficiente a ação unilateral da política regional, decorrente das precárias condições de vida nessas sub-regiões''.
O texto sustenta que no cenário do fim do século 20, com a valorização da dimensão regional e das respectivas políticas a ela dirigida, grandes corporações e pequenas e médias firmas passaram a se beneficiar dos ''meios socioculturais mais adequados aos seus anseios de expansão e lucro''. Esse seria o caso recente do Seridó Norte-Riograndense, aponta o ministério. A partir do estímulo à habilidade da mão-de-obra local para fabricar bonés, produtos alimentares e cerâmicos, foi possível alterar sensivelmente o quadro sócio-econômico negativo antes existente, gerando emprego e renda par a população de seu principal centro urbano. O complexo de confecções de Toritama/Santa Cruz do Capibaribe, no Agreste Pernambucano, seria outro exemplo no Brasil atual.

Transformação a reboque da soja
O Ministério da Integração Nacional atribui as dinâmicas observadas no plano regional principalmente à expansão da agroindústria e, em particular, ao complexo de produção associado à soja. Por isso mesmo, aponta documento com proposta de Política Nacional de Desenvolvimento Regional, ''são realçadas, entre as áreas promissoras (com alto crescimento do PIB) as microrregiões dos cerrados mato-grossenses e nordestinos. Mas também aparecem promissoramente áreas do Semi-Árido nordestino, do nordeste de Minas Gerais e do Pantanal''.
À semelhança da dinâmica populacional rumo ao interior, que se contrapõe à distribuição territorial da população - ainda concentrada instantaneamente nas regiões metropolitanas - a dinâmica econômica contrasta com o rendimento médio por habitante das sub-regiões. Isso quer dizer que, apesar de apresentarem rendimento médio mais baixo, as áreas rurais são as que apresentaram maior dinâmica de crescimento econômico ao longo da década de 90. Por outro lado, nota o documento, evidencia-se o ''baixo, ausente ou, em algumas situações, negativo incremento nas taxas de crescimento do PIB nos maiores centros urbanos do país'': São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Porto Alegre e Manaus. Segundo o Ministério da Integração, o fato revela a estagnação da atividade industrial urbana, decorrente de políticas macroeconômicas recessivas.
O diagnóstico feito pelo governo aponta espaços rurais em nítido crescimento devido à expansão da fronteira agrícola pelo cultivo de soja nas áreas compreendidas pelo corredor que se inicia no noroeste de Minas Gerais (Unaí) e se estende pelo nordeste de Goiás (Vale do Paranã), oeste da Bahia (Barreiras), sul do Piauí (Alto do Parnaíba Piauiense) e do Maranhão (Chapada das Mangabeiras). Outro corredor da soja corresponde ao noroeste do Mato Grosso (Colíder e Parecis), atingindo o estado de Rondônia.
Outras atividades agropecuárias podem estar relacionadas ao aumento da dinâmica econômica em certas microrregiões. O documento aponta a pecuária leiteira, na região de Ituiutaba (MG) e de Paranaíba (MS); a fruticultura irrigada e o café na região de Barreiras (BA); o extrativismo de madeira em Redenção (PA) e de produtos amazônicos na Serra da Madureira (AC); a agroindústria de frutas regionais em Óbidos (PA); as atividades de artesanato em Santa Quitéria (CE); o turismo em Cascavel (CE) e as mini-indústrias de confecções em Araripina (PE).

Brasil tende a se voltar para o interior
A realidade regional brasileira ainda aponta para um adensamento populacional nas áreas próximas ao litoral, no entorno das metrópoles e capitais estaduais e em alguns centros urbanos dispersos no interior do país, como Manaus, Brasília ou Goiânia. O padrão de ocupação do território nacional, no entanto, constata o Ministério da Integração Nacional, vem sendo lentamente alterado pelo processo de crescimento populacional das duas últimas décadas. A realidade por vir é de interiorização da população.
Segundo diagnóstico do MI, seja na Amazônia, seja em vastas áreas do cerrado, ''observa-se uma crescente pressão antrópica perceptível com o aumento da população que habita quelas regiões''. Também cresce o adensamento no entorno de pólos de desenvolvimento, como Brasília, Petrolina-Juazeiro ou no entorno de eixos de penetração, nos estados da Bahia e Mato Grosso e na região de Palmas (TO); áreas que são direta ou indiretamente produto de intervenção do poder público, seja na promoção de investimentos massivos, seja através da oferta concentrada de empregos e serviços públicos.
Ao contraste litoral/interior, apesar dos mitos derrubados, ainda se superpõe um contraste Norte/Sul bem marcado, admite o documento elaborado pelo governo federal. Se analisada de forma estática, a região Centro-Sul tem proporção menor da população com menos de 4 anos de estudo e proporções maiores com mais de 12 anos de estudo. No outro extremo, no Norte-Nordeste e parte do Centro-Oeste, mais de um terço da população conta com menos de 4 anos de estudo e menos de 4% estudaram 12 anos ou mais. Taxas de urbanização maiores são presentes nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, coincidindo com as regiões mais desenvolvidas do país até hoje.

JB, 10/01/2005, p. A3

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