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Novo rumo ao ambientalismo

JB, Internacional, p. A9
Autor: VIVEIROS, Mariana
16 de Fev de 2005

Novo rumo ao ambientalismo

Mariana Viveiros

O Protocolo de Kyoto entra em vigor num contexto que muitos vêem como de crise do ambientalismo, que se aproxima cada vez mais de uma encruzilhada. O caminho escolhido irá em grande parte determinar se a Humanidade vai enfim dar passos concretos rumo ao tão sonhado (e já tão esvaziado) desenvolvimento sustentável; se terá de construir um novo projeto que busque de alguma forma assegurar um futuro com qualidade de vida; ou se, na pior das hipóteses, vai haver um retrocesso em relação ao tema.
A expectativa é a de que o acordo para redução dos gases que aumentam o efeito estufa (aquecimento natural da Terra) possa servir como catalisador de mudanças nas formas de encarar e de agir em prol do ambiente

Desde os anos 90, as bandeiras ambientais vêm perdendo força em praticamente todo o mundo, cedendo espaço para problemas considerados mais urgentes, como a redução do desemprego e da pobreza, o crescimento econômico, o combate à fome e a epidemias, equalização das finanças públicas, entre outros.

E os que defendem as idéias pró-ambiente não têm conseguido manter as adesões fundamentais para levar adiante a profunda mudança que a noção de sustentabilidade prega: a incorporação da preocupação ambiental a todas as esferas, tornando-a uma variável constante nas tomadas de decisão, desde o produto que se vai (ou não) comprar no supermercado até como evitar a destruição de florestas. Isso porque não convencem quando respondem à pergunta primordial: por que é preciso cuidar do ambiente?

Muitos estudiosos defendem que uma das principais dificuldades para a civilização ocidental efetivamente incorporar as questões ambientais às demais esferas está no fator temporal. Como as conseqüências da degradação de ontem e de hoje só se farão sentir em décadas, séculos ou mesmo milênios (e há ainda muitas incertezas científicas a respeito delas), ações de proteção ou de recuperação do ambiente - que demandam investimentos financeiros e mudanças de comportamento - teriam de se basear numa espécie de solidariedade entre gerações. Uma preocupação com o próximo que transcende a noção de descendência familiar e que ninguém sabe como alcançar ou popularizar.

A ação e o discurso ambientalista têm tentado disseminar a consciência intergeracional. A realização e a divulgação de pesquisas sobre a devastação, campanhas de mobilização e atos de visibilidade na mídia, denúncias e lobby político são algumas estratégias. No meio delas, surgiu a educação ambiental, que se tornou obrigatória por lei no Brasil.

Mas ainda assim a visão geral do ambiente como algo secundário, menor e à parte das questões prioritárias ainda tem muita força fora dos meios especialistas. É aí que muitos críticos começam a enxergar o grande erro conceitual da atuação dos defensores ambientais ou o caminho que deve ser abandonado o quanto antes.

É preciso apagar as linhas que demarcam um território ambiental isolado dos territórios econômico, industrial, político, urbanístico, educacional, de saúde, de transporte, cultural, social etc. Principalmente no argumento que vai ser usado para convencer financiadores, setor produtivo, poder público e sociedade em geral de que cuidar do ambiente é fundamental, porque só assim vai se estar cuidando da economia de uma nação, da saúde financeira e social de uma região, da qualidade de vida nas grandes cidades, de culturas e práticas que podem enriquecer uma comunidade pobre e faminta.

É nessa mudança de rumo que muitos apostam vir com o Protocolo de Kyoto. Para conseguir cumprir a meta de reduzir em 5% as emissões de gases estufa por parte dos países desenvolvidos até 2012 - tendo como base o ano de 1990 -, o acordo deverá apelar ao pragmatismo econômico e aos mecanismos de incentivo à adoção de energias limpas e de novos padrões de produção e consumo.

O ideal é que o Protocolo de Kyoto possa ir além dos seus objetivos. Usar o argumento econômico e criar instituições que levem o setor produtivo e os consumidores a irem além do cumprimento dos limites ambientais impostos não é novidade na cartilha ambientalista e já encontra eco em muitos setores. Tem agora é de se tornar popular.

JB, 16/02/2005, Internacional, p. A9

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