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Navio do Greenpeace entra na área de conflito: contra madeireiros e grileiros no Pará

Viaecológica-Brasília-DF
04 de Nov de 2003

Ativistas do Greenpeace, usando um dos navios da organização que vai seguir de Belém para Porto do Móz, denunciam que o estado do Pará já se tornou responsável pelo desmatamento de um terço da Amazônia. Agora, eles querem que o governo Lula apóie a criação de duas reservas extrativistas em Porto de Móz e na Prainha, para abrigar a população ribeirinha que mais tem conflitos com madeireiros, pois vivia da floresta que está sendo derrubada. No ano passado outro navio da organização teve problemas com agressões e passeata de madeireiros organizada pela prefeitura de Porto de Móz. Ontem (3), ao lançar o relatório "Pará: Estado de Conflito" durante conferência de imprensa a bordo do navio MV Arctic Sunrise, em Belém, a organização demonstrou como terras públicas estão sendo vendidas no Pará, num rápido processo de grilagem, e como as toras de madeira de lei ameaçadas de extinção continuam descendo os rios. Nota do Greenpeace diz que "o relatório é resultado de um cruzamento de dados sobre o setor madeireiros, a máfia da grilagem, a violência no campo e o avanço da pecuária no estado do Pará, o maior produtor e exportador de madeira da Amazônia brasileira. O documento revela como estes dados, relacionados entre si, tornaram o Pará responsável por cerca de 1/3 do total desmatado em toda a Amazônia Legal e palco de escandalosas denúncias de abusos ambientais e desrespeito aos direitos humanos. O documento foi entregue para representantes dos governos federal e estadual. Estiveram presente para o lançamento do relatório "Pará: Estado de Conflito", representantes da: Casa Civil do Governo do Estado, Ibama (federal e estadual), Ministério Público Federal e Ministério Público Estadual do Pará. "Mais do que um apanhado de informações sobre a realidade socioambiental do segundo maior estado do Brasil, esta combinação de depoimentos de comunidades ribeirinhas, pesquisas científicas, declarações de autoridades, investigações independentes, notícias de jornais e revistas, e dados oficiais do governo traça um panorama real - e cruel - do que está acontecendo em áreas remotas do Pará. E mostra, claramente, que a destruição da Amazônia ameaça não apenas a floresta ou as comunidades tradicionais, que dela dependem para sobreviver, mas a integridade da própria Constituição brasileira e o futuro deste País. O relatório detalha como um modelo equivocado de desenvolvimento abriu as portas para a invasão e ocupação ilegal de terras públicas, uso de violência e degradação sistemática dos recursos naturais em nome de um progresso econômico que nunca aconteceu. Embora a destruição da floresta envolva muito dinheiro, ela beneficia apenas alguns poucos e o Pará continua a apresentar baixíssimos índices de qualidade de vida e desenvolvimento social. "Pará: Estado de Conflito" concentra-se em duas das mais agressivas fronteiras de extração madeireira do estado: a região de Porto de Moz, na margem direita do rio Xingu, e a Terra do Meio, uma grande área de floresta relativamente intacta, localizada entre os rios Xingu e Tapajós. As duas áreas são separadas pela rodovia Transamazônica e por terras indígenas. A indústria madeireira e a pecuária extensiva são, atualmente, as principais forças por trás da apropriação ilegal de terras nestas localidades. Na tentativa de salvar o que restou das florestas originais do Pará nestas regiões, comunidades locais, organizações não-governamentais (ONGs) e setores do governo brasileiro estão engajados na luta por um modelo alternativo de uso da terra, baseado na posse comunitária e no estabelecimento de uma rede de áreas protegidas. Durante as investigações do Greenpeace, ficou claro que não é possível compreender isoladamente o setor madeireiro do Pará; este deve ser enquadrado em um contexto mais amplo de destruição florestal na região - o processo de invasão e conquista de áreas remotas neste imenso território. Este acelerado processo de desenvolvimento é alimentado tanto por atividades de grupos econômicos que operam sem sofrer controle do governo federal, como por grandes projetos oficiais que almejam trazer "progresso" para a região amazônica. Outro fator determinante é a ausência do poder de Estado para deter a ilegalidade e a destruição. As operações isoladas dos órgãos de governo, ainda que necessárias, são limitadas e não resolvem a impressionante gama de problemas que assola o Pará. As raízes destes problemas estão muito aprofundadas em um modelo de desenvolvimento perverso baseado em ciclos de expansão e contração e nas deficiências históricas do setor público brasileiro. Tamanha falta de controle leva o Pará a apresentar o maior índice do País de assassinatos ligados à disputas de terras. Entre 1985 e 2001, quase 40% das 1.237 mortes de trabalhadores rurais no Brasil aconteceram no Pará, de acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). No município de São Félix do Xingu, principal fronteira da Terra do Meio, 30 pessoas morreram este ano em conflitos relacionados à terra e ao mogno, madeira mais valiosa da região. Além da violência, uma outra forma de profundo desrespeito aos direitos humanos é traço marcante da realidade amazônica. Entre 1995 e 2001, 49% dos casos de escravidão no Brasil ocorreram em criações de gado e 25% estavam relacionados ao desmatamento. A CPT estima que existam mais de 25 mil pessoas em regime de escravidão ou semi-escravidão em 167 fazendas no sul e sudoeste do Pará. Em 2001, a CPT identificou 45 casos envolvendo 2.416 trabalhadores escravos; este número aumentou para 147 casos envolvendo 5.559 trabalhadores em 2002. O município de São Félix do Xingu lidera o ranking destas vergonhosas estatísticas. "Fazer referência ao Pará em termos típicos de guerra não é exagero: como mostra o relatório, há uma guerra obscura em curso na floresta - uma disputa por terra, recursos florestais e por lucro rápido a qualquer custo", disse Paulo Adário, coordenador da campanha da Amazônia do Greenpeace. "Se este conflito não for detido, o Brasil continuará a perder centenas de milhares de quilômetros quadrados de floresta amazônica e, com ela, a chance de um futuro sustentável". O Greenpeace acredita que o futuro da região está em um novo modelo social e econômico do uso responsável da floresta aliada ao estabelecimento de uma rede de áreas protegidas. As empresas madeireiras verdadeiramente comprometidas com atividades legais, sustentáveis e certificadas têm um lugar neste futuro, mas o principal esforço deve se concentrar em trazer o poder do Estado e a justiça social e ambiental para a Amazônia. O único caminho para alcançar este objetivo é através do compromisso dos governos federal e estadual com a região, com o apoio da cooperação internacional e o trabalho conjunto com as comunidades tradicionais. "O primeiro passo concreto que o governo pode dar para mostrar seu comprometimento com a integridade da floresta e dos povos que dela dependem é acelerar o processo de criação das reservas extrativistas Verde para Sempre, em Porto de Moz, e Renascer, em Prainha", diz a ong. (Veja também www.greenpeace.org.br e www,redeglobo.com e www.amazonia.org.br e www.ibama.gov.br).

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